Efeméride é uma rubrica que pretende fazer uma viagem no tempo por episódios marcantes ou curiosos da história do desporto, tenham acontecido há muito ou pouco tempo. Para acompanhar com regularidade, no Maisfutebol.

7 de fevereiro de 1970, há 46 anos. Oitavos de final da Taça de Inglaterra 1969/70. O Manchester United deslocou-se a casa do modesto Northampton Town, da quarta divisão inglesa. O resultado foi um avultado 8-2, com os Red Devils a cilindrarem o adversário. A figura da tarde, com seis golos marcados foi o brilhante – e bastante polémico - George Best, num encontro que muitos nem queriam que ele jogasse, acabado de regressar de um pesado castigo.

A bola do jogo

A carta na manga

A vida e a carreira de Best estavam já em modo montanha russa. Após ter chutado a bola que o árbitro tinha nas mãos, em jogo da meia final da Taça da Liga, frente ao Manchester City, que teve lugar no início de dezembro do ano anterior, Best foi suspenso.

O jogo com o Northampton Town parecia um bom momento para voltar, mas muitos eram (entre os adeptos e mesmo dentro da equipa) os que, face os bons resultados da equipa na sua ausência, eram contra o regresso.

Best marcou dois golos de cabeça

Durante as quatro semanas de paragem, Best não se dedicou apenas às mulheres e ao álcool, os seus maiores vícios. Trabalhou e apresentou-se bem, física e mentalmente, para o encontro. Foi então chamado por Wilf McGuinness para jogar e o técnico nunca se arrependeu da decisão.

Quem não estava à espera da convocatória era Dave Bowen, treinador do Northampton, que nem falou de George Best nas palestras aos jogadores durante a semana. Enorme erro! Best não só jogou, como não passou despercebido.

Um dia perfeito

Best era um «brinca na areia». Com um enorme talento e técnica apurada, gostava do drible, do futebol bonito, e nem o lamaçal em que estava transformado o relvado de County Ground naquela tarde de inverno, o impediu de brilhar.

7 de fevereiro não foi apenas um dia perfeito para George Best. Também o foi para Brian Kidd, autor dos outros dois golos do Manchester United e de algumas das assistências para os tentos de Best. É dele que sai o cruzamento que abre as comportas da goleada. O relógio marcava os 20 minutos, quando Best, de cabeça, fez o primeiro dos oito dos Red Devils.

A defesa do Northampton não conseguia parar o rebelde irlandês

O segundo chegou logo depois, quando o rebelde jogador dos Red Devils passou por entre um defesa e o guarda-redes e, de baliza aberta, rematou para golo. E, logo no primeiro minuto da segunda parte, chegou o hat trick, na recarga de um remate que encontrou o corpo de um defesa, ao invés de beijar as redes.

Os golos sucederam-se e Best já nem festejava. Admitiu depois que aquele jogo serviu para «descarregar a raiva que sentiu pela pesada punição». Mas, com o avolumar de golos, o génio irlandês mostrou respeito para com os adeptos e jogadores adversários, ao não celebrar mais uma bala no massacre.

Podíamos continuar a descrever o golo, mas não há melhor forma de o fazer, do que deixar os pés e a cabeça de Best fazê-lo por nós.

«Quando Best jogava assim, não conseguíamos fartar-nos dele», recordou o técnico dos Red Devils, Wilf McGuinness.

Mais tarde, Best voltou a esse dia numa entrevista e explicou o que lhe ia na alma:

«Aquele jogo foi especial porque eu tinha estado suspenso. Na altura, penso que foi o maior castigo que tinha sido aplicado a um futebolista em toda a história. Existia muita pressão dos jornalistas para o treinador não me pôr a jogar, porque a equipa tinha obtido bons resultados sem mim. Era o meu primeiro jogo desde a suspensão, mas o treinador colocou-me a jogar. Neste momento, tinha de mostrar o que valia. A minha resposta... foi marcar um golo por cada semana que me deram de castigo!!! E ainda podiam ter sido mais...Soltei toda a minha raiva em campo»

Os adeptos do Northampton Town, resignados à derrota e maravilhados com o espetáculo, aplaudiam o craque, e o treinador Dave Bowen acabou por falar daquele massacre com admiração pelo supremo atirador: «Best destruiu-nos completamente, como um homem pode destruir outros sem lhes infingir danos psicológicos».

Os ecos do feito de Best na imprensa inglesa

Para a história fica o recorde. «Georgie» Best tornou-se no primeiro jogador a marcar seis golos numa eliminatória da FA Cup. Um dos pontos altos da vida e da carreira de um génio que tão depressa alcançava o nirvana, como descia ao fundo do poço.