Aleksander Laks era um adolescente quando a Alemanha invadiu a Polónia. Corria o ano de 1939 e começou nessa invasão um calvário de cinco anos de prisão em guetos e campos de concentração. Pelo meio passou pelo lado pior de Auschwitz: Birkenau, o campo de extermínio de judeus.

Laks fugiu à morte por um pequeno triz. Era jovem, constituía mais mão-de-obra e tinha experiência de trabalho numa metalúrgica. Por isso sobreviveu à câmara de gás de Auschwitz. Filho único de uma família judia, foi o único a consegui-lo. A mãe, o pai e a avó morreram todos às mãos dos nazis.

Antes disso, porém, tudo começou em Lodz. Na Polónia natal, Aleksander foi preso com a família e enviado para um gueto construído para separar os judeus do resto da população. Viviam 160 mil pessoas num espaço para 25 mil. Até ao dia em que foi amontoado com mais milhares de judeus num comboio.

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O destino: Auschwitz. «Disseram-nos que íamos ser levados para um campo de trabalho». Era mentira, claro. No temível campo de extermínio começou uma outra vida. Que ainda hoje o atormenta. «Passados estes anos todos, não consigo esquecer nada», diz ao Maisfutebol. «Absolutamente nada».

«Auschwitz era um planeta à parte. Os dias lá nunca eram iguais. Os nazis inventavam sempre algo novo, novos métodos de tortura, novas formas de tornar a vida dos que sobreviviam num inferno.» Aleksander recorda o dia em que esfomeado viu um nazi lançar-lhe um pedaço de pão para a frente.

Caiu em cima do pão e quando levantou a cabeça levou uma coronhada na cara. Partiu-lhe a cana do nariz, que ainda hoje está torta à causa disso. «Os traumas desses tempos perduram até hoje», conta. «Muitos sobreviventes não conseguiram recuperar e se adaptar à vida normal. Suicidaram-se.»

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Ele sobreviveu. Hoje tem 82 anos e vive no Brasil. Começou uma vida nova após a Guerra e longe da Polónia. Sobreviveram sete mil judeus de Auschwitz. Ele é um dos que ainda cá anda. «O que me fez sobreviver em Auschwitz? Simplesmente, a vontade de viver. Viver a qualquer custo.»

No campo ficou o resto da família. Viu a mãe e a avó pela última vez quando saiu do comboio à entrada do campo de extermínio. Nessa altura foram separados, ele e o pai para um lado, a mãe e a avó para outro. Elas foram mortas na câmara de gás. O pai morreu com uma pancada de um guarda nazi.

Estava demasiado frágil e não aguentou o impacto da agressão. Aleksander sobreviveu sozinho. Quando as forças alemãs perceberam a aproximação dos soviéticos, em 1945, fizeram os presos entrar na chamada marcha da morte. Aleksander Laks seguia numa coluna que foi interceptada.

«Quando os alemães perceberam a chegada dos soldados aliados, fugiram. Começaram a correr pelos campos. Nessa altura percebemos que estávamos livres.» Aleksander tinha 17 anos e pesava... 28 quilos. O que é sintomático de Auschwitz. Mas viveu, e essa foi a grande vitória.

Ele não esquece, aliás, a primeira resposta que recebeu quando chegou a Auschwitz. Perguntou onde estava. Responderam-lhe: Você só tem uma forma de sair daqui, pela chaminé. Cremado. «Depois disso consegui reerguer-me. Recomecei a vida do zero», adianta ao Maisfutebol.

No Brasil construiu uma família e uma vida para lá de Auschwitz. Viu pessoas morrerem na câmara de gás, outros serem mortos a sangue frio pelos guardas, outros ainda atirarem-se contra o arame electrificado para se suicidarem e terminarem com o sofrimento que era viver em condições extremas.

Continua sem perceber como um povo se deixou manipular por um maníaco. Mas não guarda rancor. «Só se reergueram os que não ficaram amargurados e os que deixaram de ter raiva. Mas não perdoamos o silêncio do mundo e principalmente das Igrejas. Sem dúvida a sobrevivência foi a nossa vitória.»