5 de junho de 2000. Na verdade, já era quase dia 6 quando o Maisfutebol finalmente nasceu. Começava uma grande aventura e no princípio estava Rui Costa. O então jogador da Fiorentina e da seleção nacional, de partida para jogar o Euro 2000, fazia manchete nesse primeiro dia, com uma entrevista que já então foi feita também em vídeo. 20 anos mais tarde, Rui Costa volta a associar-se a este momento especial, ele que foi protagonista e espectador privilegiado destas duas décadas, como jogador e como dirigente. Uma grande entrevista.

- Lembras-te de onde estavas há 20 anos, quando foste a primeira manchete do Maisfutebol, o primeiro jogador em Portugal a ser entrevistado em vídeo exclusivamente para a internet?

- (sorriso) Vocês lembraram-me desse facto e eu fico muito orgulhoso disso, também. Estávamos a ultimar a preparação para o Euro 2000, antes da viagem para a Holanda. E essa é uma recordação muito agradável, um Europeu que lembro com muita alegria. Trabalhar com aquele grupo de jogadores em particular foi um orgulho enorme.

- Nesse dia tinha acabado de ser divulgado que o João Pinto deixava o Benfica e tu tinhas umas frases fortes a esse respeito…

- Pois, foi uma péssima notícia. Não foi só a parte de amizade com o João, que é uma ligação de irmãos, mas a minha parte benfiquista saltou ao de cima. Acho que qualquer benfiquista na altura – tirando uma pessoa só – ficou extremamente desiludido. Era o nosso capitão, o melhor jogador do clube, e lembro-me do sentimento de ingratidão para com aquilo que o João tinha vindo a fazer. E também do sentimento de perda, porque sabíamos que, perdendo o João, se as coisas já não estavam bem, pior ficariam com a possibilidade de reforçarmos algum rival, como acabou por acontecer.

- Voltando ao Euro 2000, vocês chegaram à Holanda precisamente nesse dia 5 de junho de 2000, e uma semana depois assinam um dos melhores jogos da História da Seleção, no 3-2 à Inglaterra. Foi uma das grandes exibições da tua carreira?

- Considero que – sobretudo a primeira parte – foi o meu melhor momento em campo pela Seleção principal. Foi um jogo que me correu de feição, a mim e a toda a gente. E tem uma particularidade muito especial: a de estarmos a perder 2-0 com a Inglaterra, aos 20 minutos, o que numa outra situação seria um jogo praticamente perdido. Não me posso esquecer que aquilo que nos fez ganhar e dar a reviravolta histórica foi, precisamente, após termos sofrido o segundo golo sentirmos que, apesar do marcador, estávamos bem no campo, estávamos bem no jogo e estávamos a fazer coisas que nos poderiam levar ao êxito. Olhávamos uns para os outros e dizíamos: a gente vai ganhar, somos melhores que eles. Acreditámos piamente naquilo que estávamos a sentir e a resposta que nós demos, até chegarmos ao empate, ainda na primeira parte, é a prova provada da sensação que estávamos a ter em campo.

- Houve uma mudança de mentalidade coletiva…

- É talvez um momento de viragem para a própria Seleção Nacional. O acreditarmos, naquelas circunstâncias extremas, foi o que nos permitiu não só ganhar aquele jogo mas também fazer aquele Europeu. Infelizmente não o ganhámos, mas chegámos a umas meias-finais frente a uma super França, campeã da Europa e do Mundo, ombreando o jogo com eles até ao fim. Por isso, esse jogo em Eindhoven é um momento muito bom em termos individuais, mas também muito importante para tudo aquilo que veio a acontecer no futuro das Seleções Nacionais. À partida para esse Europeu tínhamos de ter, para além da qualidade individual, um coletivo muito forte e uma mentalidade muito vencedora para podermos afrontar esse grupo com Inglaterra, Roménia (do Hagi, do Popescu, uma equipa excelente) e Alemanha da forma que o fizemos. Se nos faltava alguma peça para nos transmitir a nossa real dimensão, esse jogo é o clic que acaba de transformar-nos numa super equipa, sem receio de afrontar qualquer outra. Um pouco à imagem do que já tínhamos conseguido no futebol de formação com os Mundiais de Riade e Lisboa.

- Para muitos essa ainda é a Seleção que deixou mais saudades. De entre as fases finais em que participaste, foi essa a melhor?

- Nesse Euro, as gerações de Riade-89 e de Lisboa-91 fazem uma só e são acrescentadas por jogadores que não fizeram esse percurso mas que acrescentaram uma mais-valia tremenda. Respeitosamente com as de 1996, 2002 e 2004, a minha última presença, considero que a de 2000 é a mais completa de todas aquelas em que participei. E acima de tudo é aquela que, para além de ser completa pelos jogadores de que dispunha, nós estávamos todos numa idade ótima para fazermos a campanha que fizemos. Não estávamos velhos, nem muito novos como estávamos em 1996, por exemplo. Podíamos ter dentro do campo qualidade, experiência, arcaboiço para as grandes competições e profundidade nas escolhas. É outro marco na história da Seleção lembrarmo-nos que no terceiro jogo do grupo, com a Alemanha, saem dez titulares, entram outros dez – porque chamar suplentes a Sérgio Conceição, Capucho, Pauleta e a todos que fizeram esse jogo é ridículo – e acabamos por ganhar 3-0 à Alemanha.