Chegou ao Benfica como campeão francês e bateu a concorrência de um campeão do mundo para assumir o lugar que era de Fábio Coentrão, vendido ao Real Madrid por trinta milhões de euros. Mereceu a confiança de Jorge Jesus, mas nunca ficou a sensação de ter conquistado a Luz. Somou 39 jogos de águia ao peito, mas após uma época (2011/12) saiu pela porta dos fundos. Oito anos depois, Emerson recorda a passagem pelo Benfica, em entrevista ao Maisfutebol.

Neste excerto o defesa recorda a adaptação ao Benfica, a luta pela titularidade e a relação com os adeptos.

Logo a seguir à conquista do título francês assina pelo Benfica. O que motivou essa mudança?

Eu já estava a fazer a pré-época com o Lille. Depois o meu empresário veio dizer-me que já estava tudo certo, que tinha de viajar para Portugal. Mas eu consegui gerir a situação. Saí para um clube de outra dimensão, que nem tem explicação. O Benfica é conhecido mundialmente, mas eu mantive os pés no chão.

No Benfica tinha a concorrência do Capdevila, que era campeão do mundo pela Espanha, mas agarrou o lugar que era do Fábio Coentrão, que tinha sido vendido ao Real Madrid. Como foi gerir isto também?

O Fábio era um jogador da seleção portuguesa, estava numa fase boa, tinha saído…não era fácil substituí-lo. Eu pensei que tinha de trabalhar o dobro para ser titular no Benfica, e fui à procura do meu futebol, nos treinos e nos jogos, e o Jesus dizia que não havia titulares. Não havia rivalidade com o Capdevila, só mesmo a disputa pelo lugar. Tínhamos uma boa relação, dentro e fora do campo. Era uma disputa saudável, sem mágoas. Brincávamos e tudo, um dava apoio ao outro se jogasse. Não havia maldade, pensávamos sempre no coletivo.

Mas apesar de ter feito muitos jogos, e de ter conquistado o lugar, ficou a sensação de que o Emerson não conseguiu conquistar verdadeiramente os adeptos do Benfica. Também sentiu isso?

Não é qualquer um que substitui o Coentrão, como eu disse. Mas apesar das críticas da torcida, de dizerem que eu não tinha encaixado, eu não via as coisas assim. Estamos lá dentro para obedecer às ordens do treinador. A torcida estava no seu direito de cobrar e de apoiar. E quando vinha a cobrança eu ficava tranquilo, não via o lado negativo. Pensava em melhorar cada vez mais para dar uma resposta aos adeptos. Tivemos até o jogo da Liga dos Campeões com o Chelsea...

Já lá ia chegar. Ia falar-lhe do episódio com o Ramires, que no final do jogo da primeira mão, na Luz, disse que a estratégia do Chelsea era atacar o seu lado. Isso marcou-o?

O Ramires é um grande jogador, rápido. Tínhamos condições de ganhar esse jogo ao Chelsea, mas no futebol acontecem muitas coisas que não esperas. Serviu de aprendizagem. Na segunda mão joguei adaptado a zagueiro [central], com o Javi García. Diziam que íamos ser goleados, mas eu e o Javi García entrámos tranquilos, preparados para fazer o nosso trabalho. Fizemos um excelente jogo lá, e não nos qualificámos por pouco.

Mas ficou magoado com as palavras de Ramires?

Não. O Ramires disse isso sem maldade. Não encarei isso pela negativa.

Falou com ele depois, ele pediu desculpa pessoalmente?

Depois do jogo. Falou depois do jogo comigo, mas eu disse-lhe para ficar tranquilo. Não foi nada de mais. E depois no segundo jogo também conversámos os dois, sem problema.

Mas a verdade é que acaba por ser dispensado no final da época…

Sim, quando estava para voltar de férias disseram-me que não ia fazer parte do plantel, que ia ser negociado, e até lá ia treinar com a equipa B. Mas também não fiquei chateado, a vida é mesmo assim. Tinha de ser forte e continuar a caminhar…

O Emerson tem falado várias vezes dessa perspetiva de não ver o lado negativo. Foi algo que guiou sempre a carreira, foi?

Sempre pensei em dar o melhor no dia seguinte e tentar consertar as coisas. Virar a página e tentar fazer melhor no jogo seguinte.

Mas tendo em conta que tinha feito muitos jogos, não ficou surpreendido com a dispensa?

Não esperava. Nenhum jogador esperava, mas tudo bem. Tinha de apresentar-me, pois tinha contrato, e depois conversei com a direção. Esperei, enquanto treinava pela equipa B, e depois fui negociado com o Trabzonspor. Tinha outras possibilidades, mas esta era a melhor para o Benfica. O próprio presidente disse que era uma proposta que não podia recusar, e por mim tudo bem, sem problema.

Sinto que deixei uma boa impressão. No futebol é normal ser criticado. Respeitei sempre a opinião dos adeptos do Benfica. Não tenho nada a apontar. Os adeptos do Benfica são muito apaixonados. Quando viemos de Londres fui aplaudido. Toda a gente esperava que fossemos criticados e fomos aplaudidos no aeroporto. Fiquei muito feliz com uma receção dessas num clube como o Benfica. Não é todos os dias.

Que outras memórias guarda desse tempo no Benfica?

Desde logo as duas taças que conquistámos. E depois alguns jogos da Liga dos Campeões, mas também na Liga. Especialmente os jogos com o FC Porto. O 2-2 no Dragão, em que marquei o Hulk. Tinha acabado de chegar, e é um jogo que faz o país parar. Também me marcou bastante.

(entrevista originalmente publicada às 23h48 de 11/05/2020)