André Martins cumpre a segunda temporada no Légia de Varsóvia, depois de 14 anos de ligação ao Sporting e de dois anos no Olympiakos. Nesta parte da conversa, o internacional português diz que Fábio Paim foi o melhor futebolista que viu na formação do Sporting, recorda os dias com Paulo Fonseca no Pinhalnovense e a estreia na equipa principal dos leões em 2011. 

LEIA MAIS: 

- «O Jesus tem bom coração, vi-o alimentar muitas vezes animais de rua»
- «Os meus pais faziam 600kms na N1 para não terem de pagar portagem»
- «O futebolista tem vida abençoada, mas vive numa bolha»

No final da formação ainda joga nos seniores do Real com o Fábio Paim. Ele já demonstrava algum tipo de comportamento errático na altura?
Lembro-me do Fábio no Sporting e foi, sem dúvida, o jogador com mais qualidade que eu vi na formação do Sporting. Nunca vi ninguém a fazer o que ele fazia. Ele fintava uma equipa, voltava para trás e voltava a fintá-los. E isto não é um exagero, era assim. Nunca vi nada assim. Mas mais importante do que ter qualidade é ter uma boa base familiar. Se tens qualidade e te falta o resto, as coisas vão-te aparecer depressa e tu não vais saber lidar com elas. Pressão, dinheiro abundante, amigos, mulheres. Ele não soube lidar com tudo isso.

No Real, o Fábio ainda queria conquistar alguma coisa no futebol?
Houve uma altura em que queria, sim. Mas quando ele quis, lesionou-se. Andou um tempo em que ele não queria nada com aquilo. Nós falávamos com ele, dávamos moral, dizíamos que ele ainda estava muito a tempo. E o Fábio, nada. Quando meteu na cabeça que queria jogar, lesionou-se. Veio por ali abaixo e perdeu outra vez o foco.

No Pinhalnovense, o seu treinador foi um jovem Paulo Fonseca. Percebeu que era um treinador diferente?
Sinceramente, sim. Desde o início percebi que tinha qualidade a mais para aquela divisão. Pelas ideias de jogo, pela capacidade de comunicar com a equipa. Era fácil ver que o Paulo ia sair dali para um patamar muito superior. Fico feliz por ele porque me ajudou muito. Eu estava no Belenenses numa situação complicada e o Paulo telefonou-me. ‘Vem jogar para cá, acredito muito em ti, acho que podes fazer uma boa carreira. Vais ver que para o ano vais ter oportunidades melhores’. Dei um passo atrás e depois dois à frente. Desci da II Liga para o CNS e depois entrei no plantel do Sporting.

E depois chega o dia 20 de outubro de 2011.
É o dia da minha estreia nos seniores do Sporting?

Isso mesmo. Lançado pelo Domingos Paciência.
Os meus colegas chamavam-me ‘senhor Europa’. Até uma certa fase eu só jogava na Liga Europa (risos). Foi nesse ano que chegámos às meias-finais da competição. A estreia é inesquecível. Foi contra o Vaslui, da Roménia. Entrei no autocarro, sentei-me ao lado do João Pereira e eu estava cheio de dores de barriga, nervoso. O João, que é um dos meus melhores amigos, disse-me o seguinte: ‘Ó miúdo, hoje é que eu quero ver do que és capaz’. No final do jogo abraçou-me, disse-me que eu tinha marcado a minha posição e que a partir dali já não podia descer. Só subir. Foram palavras que me marcaram. O João tinha muita experiência, tinha sido campeão pelo Benfica e eu tinha e tenho grande estima por ele. Fiquei radiante, porque o jogo correu-me bem.

Nessa época ficaram muito perto do título. Como é que o André explica a seca tão longa de campeonatos do Sporting?
A palavra certa é instabilidade. Falta estabilidade. Mudam presidentes, treinadores… o que aconteceu na Academia afasta o Sporting seis ou sete anos da luta pelo título. Há jogadores a rescindir, treinadores a entrarem e a sair, presidentes a entrarem e a sair. O FC Porto e o Benfica são muito grandes, fortes e estáveis. Acredito que o Sporting tem um longo caminho pela frente, pois deu muitos passos atrás.    

Dois jogos pela Seleção Nacional não é pouco para si?
Tento não pensar muito nisso agora. Nas minhas boas épocas no Sporting, entre 2013 e 2015, pensava mais, confesso. Até no meu primeiro ano no Olympiakos. Fui campeão, fui aos quartos-de-final da Liga Europa… pensava nisso. Mas no fundo é perder energia e horas de sono. Não podemos controlar isso. Sou muito auto-crítico, acho que posso dar sempre mais, mas a seleção não depende de mim. Portugal é um país pequeno e tem um talento incrível, há muitas opções para o meio-campo. Vivo bem com isso, fui feliz com a camisola da seleção, mas agora não penso nisso.  

Hora atualizada: original, 23h49, 16-05-2020