O ferrão da crítica nem sempre acerta no alvo. O caso de Michel Preud´Homme é lapidar. Em entrevista ao Maisfutebol, o antigo guarda-redes do Benfica puxa pela cabeça e recorda o dia em que chegou a Portugal. Tinha 35 anos e ostentava um estatuto raro: melhor guarda-redes do Mundial 1994.

«Nem essa eleição chegou. Os jornalistas e os adeptos olharam para a minha idade e não quiseram saber de mais nada», sublinha, num tom amistoso mesmo com as palavras mais doridas.

«Todos diziam: o gajo era bom mas está velho. Só vinha para o Benfica preparar a reforma. Acho que em cinco temporadas provei precisamente o oposto. Deixei de jogar aos 40 e por mim continuava mais uns anitos (risos)», brinca o famoso belga, agora já cinquentão e a trabalhar na bela cidade de Brugge.

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«Tive de dar a volta à cabeça e à mentalidade das pessoas. Um homem de 35 anos não consegue ser competente a jogar futebol? Claro que consegue», continua Michel Preud’Homme.
 

Nesse Mundial de boa memória para Michel, a Bélgica chega aos oitavos-de-final. Perde 3-2 contra a Alemanha, mas nessa altura já Preud’Homme encantara meio mundo com três exibições fabulosas na fase de grupos.

 

Curiosamente, o contrato rubricado com o Benfica nada teve a ver com essas amostras de monstruosa capacidade. «Não, nada. Eu fui para os EUA já como jogador do Benfica (risos). Saí do Malines e o Luciano D’Onófrio [empresário] falou-me da possibilidade de ir para Portugal. Falei uma vez com o senhor Manuel Damásio [ex-presidente do Benfica] e assinei logo».


«A minha melhor exibição foi numa derrota na Luz»

 

 

 

Michel Preud’Homme não precisa de pensar muito quando responde à questão obrigatória: qual foi o melhor jogo ao serviço do Benfica?


«Vão ficar surpreendidos, mas foi numa derrota. Perdemos contra a Fiorentina 0-2 em casa [6 de março de 1997, Taça das Taças] e o Batistuta fez um jogo extraordinário. Deixou-me as mãos a arder (risos)», dispara Preud’Homme.

 

 

 

 

O Benfica ainda foi vencer por 0-1 a Florença, um resultado insuficiente. «Na Fiorentina estava o Rui Costa. Ele nem conseguia olhar para nós, os jogadores do Benfica. Não foi a minha única grande noite, mas dessa nunca me esqueço».


Preud’Homme no Benfica-Fiorentina de 1997:

 

 

 

 

O ex-dono e senhor da baliza das águias também destaca uma célebre derrota por 1-0 contra o FC Porto, na Supertaça [18 de agosto de 1996]. «O Domingos marcou e eu evitei um resultado mais pesado. Lembro-me também de ter feito uma grande exibição no Estádio do Bessa, contra o Boavista».


«Só tive alguns problemas com o Ovchinnikov»

 

 

 

 

Cinco anos na Luz, oito colegas de posição na luta pela baliza do Benfica: Neno, Tomás, Veiga, Brassard, Nuno Sampaio, Pedro Roma, Paulo Lopes, Bossio e Ovchinnikov. Michel Preud’Homme guarda «gratas recordações» de todos. Ou de quase todos.


«Só o Ovchinnikov causou alguns problemas (risos). Nada de grave. Com ele tive uma relação diferente, porque não aceitava ser suplente. Não era fácil para ele estar no banco, mas teve de esperar que o belga se reformasse (risos)», conta Preud’Homme.

 

 

 

 

O melhor companheiro, acrescenta, foi Neno. «Era um grande campeão. Tinha conquistado o título, eu cheguei e ele perdeu o lugar. Nem assim reagiu mal. Aceitou-me, tornou-se meu colega de quarto nos estágios e um amigo verdadeiro. Grande pessoa, um tipo excecional».


«O Benfica não era só eu e o JVP»

 

 

 

 

Por esses dias na Luz, já se percebeu, os resultados não condiziam com a grandeza do clube. Não era raro, aliás, escutar aqui e ali uma ideia curiosa: «o Benfica é o Preud’Homme, o João Vieira Pinto e mais nove tipos».

 

 

 

Michel ri-se ao escutar a frase, mas diz logo não concordar. «É verdade que eramos os dois importantes, o João fazia a diferença. Mas é bom lembrar o outros grandes colegas de equipa: Abel Xavier, Hélder, Veloso, Vítor Paneira, Mozer, Valdo, Caniggia… com estes nomes, o Benfica não podia ser só o Preud’Homme e o JVP».

 

 

Sobre os colegas de equipa estamos falados. E os treinadores? Com quem mais se identificou Michel?


«O Artur Jorge não teve sucesso, mas escolheu-me e não me posso esquecer disso. Foi ele que teve a ideia de me contratar quando eu era um velhinho de 35 anos», recorda o belga. «Tive uma boa relação com todos. Graeme Souness, Manuel José, Paulo Autuori e o senhor Mário Wilson. Que grande personagem era o Mário Wilson!»

A despedida de Preud’Homme do Benfica