Para Dani Figueira, a baliza foi uma paixão ao primeiro… atirar para o chão.

Começou por andar atrás do irmão mais velho, mas rapidamente se tornou «independente».

Do Santa Eulália, pequeno clube de Vizela, saltou para o V. Guimarães, clube no qual conheceu alguém com quem se identifica ao ponto de dizer: «um dia gostava que as pessoas me recordassem como recordam o Neno».

Nesta parte da entrevista, o guarda-redes do Estoril recorda o percurso desde o início até chegar a um dos clubes sensação da época passada.

Sempre com o mítico 99 nas costas. O número que ele deixa a mãe acreditar que lhe é dedicado, mas que tem um responsável maior: Vítor Baía, pois claro.

O ídolo de menino. E é pelas memórias de menino que a conversa com o nosso jornal principia.

Maisfutebol: Como começou o seu percurso no futebol?

Dani Figueira: Comecei a jogar no clube da minha terra, o CCD Santa Eulália. Um clube ao qual gosto sempre de voltar. Quando vou a casa faço sempre questão de passar lá porque foi onde tudo começou. É a fase em que se é verdadeiramente feliz: quando se é miúdo a fazer aquilo de que mais se gosta. Aí não se pensa no que vai acontecer, joga-se pelo simples prazer. A maior beleza do futebol é ver os miúdos. É onde está a pureza do jogo. Eu já fui um desses miúdos e estou agora a viver o meu sonho.

MF: Foi a jogar com os amigos em criança que nasceu o gosto pelo futebol?

Dani Figueira: Foi com os amigos e com o meu irmão mais velho. O que ele fazia era o que eu queria fazer. Era o meu exemplo e eu queria fazer igual a ele. Ele foi jogar para o Santa Eulália e eu fui atrás dele. Depois foi para o karaté e voltei a ir atrás. Depois, fui-me encontrando aos poucos.

MF: E também há um empurrão do seu pai, não é?

Dani Figueira: Sim, sim. Tenho uma relação muito especial com o meu pai. E com a minha mãe também, claro. Sem qualquer um dos dois, não iria conseguir tornar-me jogador profissional. Mas o meu pai é a pessoa que está mais ligada ao futebol.

MF: A figura mais presente nesse capítulo…

Dani Figueira: Sim, lembro-me de olhar para a bancada em miúdo e tê-lo lá sempre. Esse era um momento sempre muito especial para mim, porque sentia o apoio. Estivesse bem ou mal, ele estaria sempre lá para mim e era o mais importante no fim de contas.

MF: E era um daqueles pais que dava muito na cabeça?

Dani Figueira: Não. Ainda hoje ele não interfere muito. Claro que me dá alguns conselhos, mas sabe que sou muito emotivo e sincero comigo mesmo. Se erro, sei que erro e não preciso que me estejam a apontar o dedo. E num dia que corra menos bem, não vale a pena falar para mim, porque só vou estar a pensar naquilo. Temos vindo a caminhar lado a lado, eu a evoluir muito e ele a acompanhar o processo.

MF: A baliza foi amor à primeira vista?

Dani Figueira: Tentei à frente, mas percebi que não ia dar. E depois fiz um treino e ficou a minha paixão. Adorava atirar-me para o chão. Era miúdo, nem sabia se tinha jeito para aquilo, mas atirava-me para o chão, levantava-me, voltava a atirar-me, ficava com a roupa suja, mas divertia-me [risos]. Era a pureza do futebol. Ainda hoje sorrio a contar a história porque era muito feliz e continuo a ser. Continuo a mesma criança com os mesmos sonhos e objetivos. Agora de uma forma mais profissional, mas sigo o mesmo caminho.

MF: Do Santa Eulália mudou-se para o V. Guimarães, aos 12 anos. Esteve 10 anos no clube, como foi esse período?

Dani Figueira: Foram 10 anos que passaram muito rápido. Tenho muito orgulho no que fiz lá, porque é especial estar tanto tempo num clube. Com toda a mediatização, tão depressa se está aqui como depois se está ali. Por isso, é óbvio que terei sempre uma ligação especial ao Vitória. Foi lá também que dei os primeiros passos como profissional e criei as ligações fortes que tenho no futebol.

MF: São relações que ficam para a vida…

Dani Figueira: Sim, até com os fisioterapeutas. Porque tive algumas lesões, eles ajudaram-me muito mesmo na vertente psicológica. Até a minha educação eu sinto que devo também ao que aprendi no clube. Saíamos da escola íamos para o futebol e muito da minha educação vem do futebol. No futebol aprende-se, por exemplo, a respeitar os mais velhos. Aprendemos muito neste mundo, só tenho de agradecer. Muitos jovens deviam passar pelo futebol, porque é muito bom para a educação.

MF: Há algum colega que tenha tido e que seja um daqueles amigos que ficaram para a vida?

Dani Figueira: Sim, tenho vários. Tenho uma forte ligação com o André Almeida, que joga no Vitória e que toda a gente conhece; com o Miguel Reisinho [Boavista]; o Miguel Magalhães que assinou agora pela Oliveirense; o Nuninho Ribeiro, que está na U. Leiria. Eu não preciso de falar muito com eles, mas eles sabem o que significam para mim pelos anos que passámos juntos. E estamos todos felizes uns pelos outros, todos a crescer. Isso é o bonito do futebol.

MF: Nesse período, houve algum treinador que o tenha marcado mais?

Dani Figueira: Claro. Por exemplo, quando dei o primeiro passo para o profissional. Era júnior com o mister Alex Costa e o treinador de guarda-redes era o mister Lobo. Eles foram importantes para mim. E lembro-me de um episódio com o mister Vítor Campelos.

MF: Conte…

Dani Figueira: Eu era um miúdo dos juniores, estava a recuperar de uma lesão e o mister Campelos era o treinador da equipa B e disse-me que me ia chamar quando eu recuperasse. Aquilo ficou-me na cabeça, não achava que fosse acontecer. Só que quando recuperei ele perguntou-me: «Estás pronto?». Mesmo não estando, uma pessoa diz logo que sim [risos]. A verdade é que respondi presente e correu muito bem. Por isso, estou muito grato.

MF: Conviveu também com uma figura das balizas, do Vitória e do futebol português. O Neno tinha uma atenção especial para os guarda-redes mais novos?

Dani Figueira: O Neno era uma figura paternal. Tanto para os mais novos como para os mais velhos. Todos sabem que ele era uma pessoa especial. Onde ele estivesse, havia sempre alegria. Quando me lembro dele, lembro-me da alegria que ele transmitia. Nem sequer falava muito de futebol, tentava trazer a parte alegre do futebol, mesmo quando as coisas correm menos bem.

MF: Nota-se que foi uma figura muito marcante.

Dani Figueira: Todos têm saudades dele: quem conviveu e quem não conviveu. Ele deu muito ao futebol, não só nas balizas, como fora do campo. Foi uma pessoa que me marcou e gostava que um dia olhassem para mim como olham para o Neno. A mensagem era sempre a de tentar ser sempre feliz no que se faz. Sem alegria, não vale a pena.

MF: Além dessa referência, tem uma outra que tem um número especial associado…

Dani Figueira: [risos] Sim, o número 99. Acho que esse número é especial para todos os que querem ser guarda-redes em Portugal. Do nosso Vítor Baía. Se olharmos, há muitos guarda-redes em Portugal a jogar com o 99 e nem sei se temos esse direito [mais risos]. É um prazer para mim ter o 99 nas costas. Não só por ele, mas tem também a ver com a minha mãe. Hoje, esse número também está muito bem representado no FC Porto pelo Diogo Costa, com quem tive o prazer de partilhar a baliza na seleção.

MF: Qual é essa ligação da sua mãe ao 99?

Dani Figueira: É o número preferido dela. Não há uma grande história à volta disso. E ela diz que eu escolhi o 99 por causa dela. Na altura foi mais pelo Vítor Baía, mas eu deixo-a dizer que foi por causa dela que o escolhi [risos].