«Fizeram 750 quilómetros de carro para aqui chegar? Então, tem de valer a pena.»

Óliver Torres recebe-nos na cidade desportiva do Sevilha FC depois do treino da manhã. Pede para responder em português naquela que é a sua primeira entrevista para um órgão de comunicação nacional desde que saiu do FC Porto, em julho, a troco de 12 milhões de euros.

Sentado numa das cadeiras da bancada coberta do miniestádio Jesús Navas, o médio espanhol de 25 anos fala dos quatro épocas no FC Porto e na despedida emocionada, na transferência que durou mais de um mês a concretizar-se e que teve a influência de Julen Lopetegui.

Fala também da relação com Sérgio Conceição, dos conselhos do amigo Iker Casillas e até de João Félix, que atualmente assume um papel que bem conhece: o de jovem prodígio do Atlético de Madrid.

Bem-humorado, Óliver responde a tudo de cabeça levantada, tão esclarecido como se estivesse em campo com a bola nos pés.

Da carreira ao lado mais pessoal, recuando até às suas origens numa família humilde em Navalmoral de la Mata.

No final, deixa uma mensagem para os portugueses e em particular para os adeptos portistas, dos quais apenas se havia despedido numa publicação nas redes sociais. E deixa um agradecimento ao Maisfutebol: «Obrigado por se terem lembrado de mim.»

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*Repórter de imagem: Tiago Tavares

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PARTE I: «Na última noite no Porto fui sozinho para o cimo da Ponte D. Luís e chorei»

PARTE II: «Sérgio Conceição sempre gostou de mim»

PARTE IV: «A minha mãe limpava casas, sozinha sustentava a família»

PARTE V: «Félix pediu-me a camisola e agora foi vendido por 120 milhões»

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No FC Porto, o Óliver tinha uma proximidade grande com o Iker Casillas. Há algum conselho dele que guarde?

O Iker é uma referência não só como jogador, mas também como pessoa. Tudo o que ganhou, o que conquistou, os momentos que viveu… E é uma pessoa normal, que aos 38 anos ainda tem a ambição de jogar. Isso é de valorizar. Ele sempre me aconselhou. Dizia o que tinha de fazer, como tinha de fazer, como ele via a minha situação, o que ele faria, o que achava que era melhor para mim… Agradeço todos os conselhos que ele me deu. Mantemos muito boa relação e ainda me “chateia” muitas vezes e diz-me o que faço bem e o que faço mal. Fico agradecido por tudo o que ele me deu.

Foi um susto aquele dia 1 de maio [quando Casillas sofreu um enfarte de miocárdio no treino do FC Porto]?

Foi um susto grande! É daquelas coisas que nos fazem mudar a forma de pensar. As primeiras pessoas que o Iker viu quando acordou no hospital foi o Adrián [López] e eu. Lembro-me de termos ido ao hospital e, assim que ele nos viu, disse: “O que fazem aqui? Vão já embora para casa! Não preciso de nada.” Isso faz-nos ver o quão grande e forte ele é. Tudo o que conseguiu não é por acaso.

Também jogavam padel. O Casillas era um bom parceiro?

O Casillas era fraquinho. Mas, pronto, tínhamos de jogar com ele… [risos]

«O que o FC Porto uniu, ninguém poderá separar», escreveram vocês como legenda de uma foto [em baixo] que publicaram recentemente. É, de facto, assim?

Sim, era um contexto especial. Estávamos noutro país, conseguimos fazer um grupo muito bom, sempre nos ajudávamos. Cada um em determinado momento passou por uma situação menos boa e tentávamos dar uns aos outros o carinho de que precisávamos. A união e a ligação que ficou é muito forte. Por muitos quilómetros que nos separem e por equipas diferentes em que estejamos, tentaremos sempre procurar momentos para podermos falar do que estamos a viver: da família, dos filhos. No final de tudo, é isso que fica no futebol: amigos e bons momentos.

Gostaria de um dia voltar ao FC Porto?

Se calhar, daqui a quatro ou cinco anos estarei no Porto para fazer as minhas últimas épocas. Nunca se sabe. É imprevisível. Não rejeito voltar. É como a minha casa.