Rui Almeida é atualmente treinador do Red Star da Ligue 2 de França, mas antes disso já viveu no Egipto, onde foi adjunto de Jesualdo Ferreira no Zamalek, e na Síria, onde foi treinador da seleção olímpica. Isto tudo desde 2010 até 2016.

Por isso, o técnico português tem vivido algumas experiências extrafutebol e que muitos portugueses apenas acompanham pela comunicação social, por exemplo: a Guerra Civil na Síria, que se iniciou em 2011 e os atentados terroristas de novembro passado em Paris.

Rui Almeida chegou à Síria em setembro de 2010 e deixou o país em abril de 2012, numa altura em que até foi convidado para assumir o comando técnico da seleção principal, mas em que preferiu sair do país na sequência do agravamento da situação política e social.

Na altura dessa aventura pelo Médio Oriente falou com o Maisfutebol e agora, em terra mais firme, voltou ao tema admitindo que pelo menos um dos seus jogadores veio para a Europa como refugiado.

Entretanto também já viveu de perto o massacre no Bataclan e nas ruas de Paris em 2015.

Resumida a história, pode dizer-se que parece que Rui Almeida anda atrás do perigo. Depois da Guerra na Síria, como viveu os acontecimentos de Paris?

Como algo terrível, obviamente, mas que já passou e que em termos de medo tentámos todos que nos passasse ao lado. Infelizmente anos antes na Síria vivi uma situação idêntica e convivi com pessoas que também perderam os seus familiares. Aconteceu lá e aconteceu aqui. Aqui pelo menos, acalmou. Nos primeiros dias houve um outro dia com maior presença de exército, mas tudo voltou ao normal.

Na Síria foi muito mais grave e deu-se uma Guerra….

Sim, sem dúvida, mas, felizmente, no pico da guerra eu já não estava lá. Lembro-me de tudo acontecer de forma muito rápida. As pessoas não estavam preparadas nem previam que aquilo pudesse acontecer. Começou nas orações da sexta e pouco a pouco foi evoluindo e piorando no sul do país.

Vivia em Damasco, mas decidiu sair do país por segurança. Imagina como teria sido se continuasse?

Não. Em Damasco, enquanto lá estive, não aconteceu nada e sinceramente não sei como está agora. Não vi nenhuma imagem real do estado atual da capital do país. Na altura a vida ainda era normal, mas já havia muitos ataques. Não aconteceu nada de anormal, mas tinha jogadores que viviam realidades diferentes. Que, por exemplo, chegavam mais tarde porque havia exército nas estradas. Na altura era para ir para a seleção principal, mas não quis continuar no país. As coisas estavam a evoluir e tudo poderia acontecer.

Acompanhou depois o evoluir da situação?

 Sim, vi muitas imagens e não quis acreditar. Passei a maior parte do tempo em Damasco, mas conheci outras cidades. Lembro-me de Alepo e o que vi depois foi absolutamente incrível e devastador. Fiquei surpreso com o nível de destruição e com o número de mortos. Além disso, com estes acontecimentos, 90 por cento das pessoas que conhecia bem refugiaram-se um pouco por toda a Europa. Tiveram de fugir das suas casas e da vida que tinham, devido à guerra.

«90 por cento das pessoas»… então algumas delas eram jogadores?

Sim, muitos dos jogadores fugiram do país, tiveram de sair e ir para países vizinhos. A base da minha seleção saiu da Síria e foi para o Líbano, Iraque e Irão, entre outros países.

Por iniciativa ou como refugiados?

Uns para jogar outros como refugiados. O meu defesa esquerdo está na Alemanha e julgo que está a jogar, mas chegou à Europa como refugiado. A maior parte deles continuou a carreira, alguns a jogar dentro e outros fora do país. Não sei o percurso e a situação atual de todos, mas é natural que mais dois ou três tenham fugido do país, até porque a fação não apoiante de Bashar al-Assad teve de procurar outro país.

Tem pena que por isso alguns jogadores se tenham perdido para o futebol?

Claro. Lutavam pelo sonho deles e têm as suas qualidades. Por exemplo, o meu avançado, o Omar Al Soma, é o melhor marcador na Arábia Saudita no Al-Ahli Jeddah a ex-equipa do Vítor Pereira.