Campeão nacional em 2018, Ricardo Pereira trocou o FC Porto pelo Leicester e a Premier League. A transferência deixou 20 milhões de euros nos cofres azuis e brancos, mas por vontade de Sérgio Conceição o lateral direito ainda estava no Dragão. 

Em entrevista exclusiva ao Maisfutebol, o internacional português recorda os momentos que antecederam a sua saída e explica que o desejo do treinador não coincidia com o da SAD. Ricardo hesitou, confessa, mas acabou por aceitar abraçar o desafio de jogar na melhor liga do planeta. 

Nesta parte da conversa, Ricardo Pereira, 25 anos, recorda os dias longos dos festejos do título do FC Porto, escolhe o seu melhor jogo de dragão ao peito e explica como um menino lisboeta se apaixona desde cedo pela casa azul e branca. 

Ricardo Pereira foi eleito o melhor jogador do Leicester em 2018/19 pelos adeptos do clube e pelos próprios colegas de equipa. Um cavalheiro da palavra, simples, acessível e sempre disponível. 


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Maisfutebol – No FC Porto lutava por títulos, no Leicester não é assim. Isso não lhe faz confusão?
Ricardo Pereira –
Posso confessar que esse foi um dos motivos que me levou a hesitar antes de aceitar o convite do Leicester. Estive antes no Nice e no Vitória de Guimarães, por isso não é novo para mim. Pesei os prós e os contras e decidi mudar. De um lado tinha o FC Porto e a Champions, do outro o Leicester e a Premier League… foi a decisão mais difícil da minha carreira. Tínhamos sido campeões no FC Porto, festejámos três noites, foi lindo. Fez agora um ano e recordei tudo com o Gonçalo Paciência e o Sérgio Oliveira. Brutal. Estava no meu país, confortável no clube e na cidade, ter de sair da zona de conforto, tudo isso me fez hesitar. Acabei por aceitar e ir atrás de novos desafios no melhor campeonato do mundo. O Leicester demonstrou grande interesse em mim, gostei da abordagem deles.

MF – Quando informou o Sérgio Conceição e a SAD do FC Porto da sua saída, que reações encontrou?
RP –
Reações diferentes. O Sérgio estava a par da situação, falámos ao longo do ano, sabia que havia contactos e queria que eu renovasse. Em relação à direção… foi diferente. Eles tinham as suas ideias, já contavam com a minha saída e acho que eles queriam que isso acontecesse, a minha saída. O Sérgio preferia que eu continuasse, disse-me isso mais do que uma vez.

MF – Como recebeu aí em Leicester a notícia do sucedido com o Casillas?
RP –
Saí do treino, cheguei ao balneário, peguei no telemóvel e não queria acreditar. Fiquei completamente chocado. Num momento está tudo bem, a seguir o Iker está assim. Felizmente os responsáveis do FC Porto reagiram logo e o meu colega está bem, em casa, com a família. Espero que recupere a cem por cento. Esse tipo de coisas une muito uma equipa, não tenho dúvidas, até pelo que passámos aqui no Leicester com o falecimento do nosso presidente.

MF – Está surpreendido com a reviravolta feita pelo Benfica na liga?
RP –
Eu não pensava que isto fosse possível. Infelizmente o FC Porto não conseguiu manter a boa vantagem que teve na classificação e o Benfica melhorou muito com o novo treinador. Ficou tudo mais difícil para o bicampeonato. Faltam dois jogos, espero que o Benfica tropece e que o FC Porto ainda consiga lá chegar.

MF – O ano passado o FC Porto também perdeu dois jogos seguidos – Mata Real e Restelo – mas depois agarrou o título com a vitória na Luz.
RP –
Olhámos para esse jogo na Luz com muita ambição e sabíamos que só dependíamos de nós. Este ano não é assim, o FC Porto não depende só de si e o Benfica está bem posicionado.

MF – Esse jogo na Luz foi o melhor do Ricardo ao serviço do FC Porto?
RP –
Pela importância do jogo, do adversário, do golo perto de fim… sim, diria que foi o melhor jogo que tive no FC Porto. Passámos para a frente e percebemos que o título seria nosso, cinco anos depois. E depois… foi incrível aquela festa no hotel, no estádio, nos Aliados. Foi das maiores enchentes que vi na vida, foi lindo, não há palavras. Foram vários dias de festa (risos). O título foi bastante merecido depois de uma época difícil, em que quase todos davam o favoritismo ao Benfica.

MF – Como é trabalhar com o Sérgio Conceição? É um treinador difícil?
RP –
É um treinador que gosta de intensidade, de luta e que tenta ter sempre os jogadores em alerta. Não deixa a equipa adormecer. Exige altos níveis de concentração, sabe que qualquer erro pode ser fatal. Ele procura tirar o melhor de cada um e é um homem que dá muita confiança a quem joga.

MF – Foi ele a instituir a roda nos finais dos jogos?
RP –
Sim, começou logo na pré-época. Ele quis simbolizar a nossa união e passar esse sentimento para os adeptos. Tornou-se um hábito bonito.

MF – De quem tem mais saudades no FC Porto?
RP –
Tenho saudades do ambiente no balneário. O grupo era mesmo muito bom, apesar de haver várias nacionalidades. Sinto falta das brincadeiras, do companheirismo.

MF – O Ricardo é lisboeta e portista. Como nasceu essa paixão pelo FC Porto?
RP –
Pela influência do meu irmão mais velho. Sou portista desde sempre por culpa dele. Cresci a ver o FC Porto ganhar e a chegar à escola cheio de moral (risos).

MF – O Ricardo saiu de casa dos seus pais com 16 anos. Cumpriu todos os sonhos que levava na mala?
RP –
Não imaginava chegar onde cheguei. Tem sido muito melhor, tenho cumprido quase todos os objetivos. É gratificante por mim e pela minha família, pelos amigos de sempre. Nos momentos bons é fácil elogiar, mas o mais importante é ter apoio nos dias maus. E eu tenho essa felicidade.

(Artigo originalmente publicado às 23:55 de 09-05-2019)