A ‘Euro 2016 Network' reúne órgãos de comunicação social de vários pontos da Europa para lhe apresentar a melhor informação sobre as 24 seleções que vão disputar o Europeu de França. O Maisfutebol representa Portugal nesta iniciativa do prestigiado jornal Guardian. Leia os perfis completos das seleções que participarão no torneio:

Autores dos textos: Paul Doyle (análise tática e figura) e Alan Smith (segredos dos jogadores)

Parceiro oficial na Irlanda: The Guardian

 

A grande diferença entre esta equipa da Irlabnda e a que perdeu os seus três jogos na fase de grupos do Euro 2012 é a atitude. Há quarto anos, Giovanni Trapattoni até tinha, provavelmente, um melhor conjunto de jogadores, mas seguramente limitou a equipa devido à sua convicção de que a Irlanda não era suficientemente boa para fazer mais do que ocasionais contra-ataques de surpresa.

Martin O'Neill tem um pouco mais de confiança na capacidade dos seus jogadores em assumir o jogo mesmo se, também ele, cai pontualmente na tentação do excesso de cautelas, como aconteceu na derrota por 1-0 com a Escócia na fase de grupos, com o futebol direto da Irlanda a ter, previsivelmente, escasso sucesso.

No geral, as equipas de O'Neill são ousadas, especialmente quando ele recorrer a Robbie Brady como lateral-esquerdo. O jogador do Norwich é vulnerável nos aspetos defensivos mas uma ameaça constante nas subidas – e nos preciosos lances de bola parada – tornando-o um elemento tão perigoso como Séamus Coleman no flanco direito. A largura fornecida pelos laterais, em particular, é o que permite à Irlanda acumular jogadores na zona central.

A decisão de Trapattoni de não levar Coleman ao Europeu da Ucrânia/Polónia, há quatro anos, foi contestada na altura, tal como o desprezo a que o italiano votou Wes Hoolahan, que desde então se tornou o principal criador da equipa. Com 34 anos, o médio do Norwich talvez não dure os 90 minutos – e inclui-lo a titular torna impossível o recurso ao 4-4-2, o que ajuda a explciar a preferência de O’Neill pelo 4-2-3-1 – mas quando está em campo, as suas corridas imprevisíveis e passes inventivos dão à Irlanda um elemento de surpresa que, sem ele, não existe.

A velocidade de Shane Long e a sua capacidade de luta nos ares é também um aspecto crucial, que torna a Irlanda uma ameaça no contra-ataque para equipas com mais posse de bola – o que no Euro 2016 pode ser qualquer equipa. A dinâmica e a potência de Jonathan Walters na direita fazem com que a Irlanda esteja condenada a sofrer, defensiva e ofensivamente, se o jogador do Stoke City não estiver completamente recuperado da lesão no joelho, sofrida em março.

James McCarthy será, quase de certeza, a âncora a meio-campo, mas ainda falta ver quem lhe fará companhia. Glenn Whelan é a hipótese mais provável, mas Harry Arter e Eunan O'Kane são alternativas interessantes, em especial porque oferecem a mobilidade que tantas vezes falta à equipa.

A maior preocupação de O'Neill's é o eixo defensive, onde é difícil prever quais os dois escolhidos e ainda mais difícil sentir alguma segurança, qualquer que seja o par escolhido. John O'Shea esteve em todos os jogos de qualificação até ser expulso no ultimo, diante da Polónia. Na sua ausência, Ciaran Clarke jogou bem, ao lado de Richard Keogh, nos play-offs com a Bósnia-Herzegovina. Mas nenhum deles, nem Marc Wilson, chegam ao torneio com sinais animadores de forma, e há alguns motivos para alarme face à perspetiva de enfrentarem avançados como Zlatan Ibrahimovic, Romelu Lukaku ou Michy Batshuayi.

Onze provável da Irlanda (4-2-3-1): Randolph; Coleman, O'Shea, Keogh, Brady; McCarthy, Arter; Walters, Hoolahan, Hendrick; Long

Que jogador irlandês pode surpreender tudo e todos no Euro 2016?

Jeff Hendrick foi a maior revelação na campanha de apuramento, a par do guarda-redes Darren Randolph. Hendrick nem sequer era um titular habitual do Derby County quando saiu do banco para permitir a John O’Shea um empate tardio à seleção, na visita à Alemanha. A partir daí ganhou um lugar no onze e as suas movimentações a meio-campo e o critério na distribuição de jogo tornaram-se um ingredient habitual na campanha, tanto pelo meio como na esquerda. O seu drible e assistência para o golo vitorioso de Jonathan Walters, diante da Geórgia, foi beleza pura, e é notável o seu entendimento com Robbie Brady, com quem joga desde os 10 anos, quando se cruzaram no St. Kevin's Boys.

Que jogador pode desapontar?

James McCarthy. Numa equipa com muitas limitações mas, no geral, um espírito admirável, o médio do Everton é o jogador que deixa os observadores com a sensação de que podia ter feito mais. É demasiadas vezes designado como o Jon Obi Mikel irlandês, satisfeito com uma posição expectante, em vez de exprimir as qualidades ofensivas que na verdade possui. Além disso, a capacidade finalizadora de Shane Long pode ser limitada, e os tackles de James McClean demasiado imprecisos.

Qual é o objetivo realista para a estreia com a Suécia e o Euro 2016?

Fragilidades defensivas e alguma falta de magia tornam provável a eliminação na fase de grupos, mas a passage aos oitavos não é impossível, já que a equipa dispõe de energia inesgotável e, em Shane Long e Jonathan Walters, uma dupla avançada que pode criar probblemas a qualquer rival que não esteja disposto a travar uma luta intensa, especialmente se Wes Hoolahan estiver nos seus dias mais criativos. Se os defesas centrais tiverem um dia bom perante Zlatan Ibrahimovic, no jogo de estreia, o resto da equipa pode bater-se de igual para igual com a Suécua e uma vitória poderia ser uma injeção de ânimo determinante, antes dos jogos com Itália e Bélgica, equipas de qualidade superior, mas que terão de aplicar-se a fundo.

Segredos dos jogadores

Martin O'Neill

O selecionador Martin O'Neill estudou Direito durante um anon a Universidade de Belfast, antes de desistir e tornar-se futebolista professional. Era colega de turma de Mary McAleese, que viria a tornar-se president da Irlanda. Continua a ter grande interesse por criminologia e questões legais, e a curiosidade já o levou a estar presente em julgamentos de criminosos conhecidos, incluindo serial killers.

Richard Keogh

A primeira equipa professional de Richard Keogh em Inglaterra foi o Stoke City mas nunca chegou a representar o clube, passando a maior parte do contrato emprestado a uma equipa islandesa. Mudou depois para o Bristol City, onde a sua carreira verdadeiramente arrancou em Agosto de 2006, ao ser lançado como suplente, após a expulsão do lateral-direito Bradley Orr, expulso por dar uma cabeçada no seu colega, Louis Carey. Uns dias mais tarde, Orr foi um dos três jogadores presos na sequência de desacatos à porta de um bar. E foi assim que Keogh garantiu o seu lugar no onze.

Robbie Brady

Os irmãos de Dublin, Gareth and Liam, representaram a Irlanda nos escalões jovens. Brady foi levado para o Manchester United como teenager, depois de impressionar os observadores ao serviço do St. Kevin’s Boys. As coisas não correram tão bem como o esperado em Old Trafford e Robbie seguiu para o Hull, antes de se juntar ao Norwich no ano passado. Recentemente perdeu dois dentes da frente, após um choque de cabeças com o colega de equipa Gary O’Neill, na derrota (2-1) diante do Chelsea, em março.

Jonathan Walters

Em 2007 Walters jogava pelo Ipswich Town, então treinado pelo atual adjunto da Irlanda, Roy Keane. Um dia, Walters telefonou a avisar que estava demasiado doente para ir treinar, e Keane manifestou as suas dúvidas. Walters respondeu à sua maneira, bem direta: enviou ao treinador uma foto do seu vomitado. Os dois tiveram várias discussões acaloradas no gabinete de Keane, em Portman Road, mas atualmente têm boas relações.

Shane Long

Também esteve tentado a dedicar-se ao <i>hurling</i>, representando o Tipperary, quando recebeu uma chamada de Pat Dolan, que o levou para o Cork City, como teenager. «Foi lá que aprendi a jogar», conta. Dolan ainda é o conselheiro de Long e ajudou a tartar da mudança para o Reading, quando treinava o Cork, em 2005. O avançado do Southampton ´w bwm conhecido pelos seus dotes musicais, recorrendo com frequência à guitarra, nos estágios, e impressionando os colegas de equipa com bons desempenhos. Quando se mudou para o West Bromwich Albion, há cinco anos, surpreendeu os colegas de equipa com uma versão de My Girl num ritual de praxe para os recém-chegados à equipa. «Acho que a admiração é só por eu ser jogador de futebol e as pessoas não pensarem que somos capazes de tocar ou cantar bem», reconhece o homem que, depois do apuramento, conduziu todos os companheiros de seleção a uma maratona de cantorias num pub de Dublin.

David Meyler

O pai de David Meyer, John, é um antigo praticante de futebol gaélico e hurling e o filho seguiu-lhe as pisadas nesta modalidade, antes de ser chamado ao Sunderland por Roy Keane, depois de dar nas vistas pelo Cork City. Já recuperou de lesões graves nos dois joelhos. A sua companheira deu à luz a primeira filha, há poucos meses, levando o treinador de Meyler no Hull, Steve Bruce, a ficar seriamente preocupado, depois de o seu jogador perder 6,5 kg devido ao stress da paternidade.

A figura: Darren Randolph

«Estreia fantástica, espero que a carreira também o seja» - Darren Randolph foi agradavelmente surpreendido pelo comentário espontâneo de Steven Gerrard, depois da estreia do guarda-redes na Premier League, no último dia da temporada 2006/07. O Charlton Athletic já tinha descido de divisão e, como o habitual titular, Scott Carson, estava emprestado pelo Liverpool, o clube decidiu dar a Randolph um primeiro sabor a elite, no dia seguinte ao seu 20º aniversário. No empate (2-2) em Anfield o seu desempenho foi suficientemente bom para justificar o elogio de Gerrard. Mas a carreira não descolou logo a seguir: se Randolph chegou no Euro 2016 como titular pela Irlanda, isso só acontece após anos a fio a ver jogos a partir do banco, como suplente frustrado, tanto em vários clubes como na seleção.

De certa forma é adequado que Randolph tenha passado tanto tempo como reserva, como é agora no West Ham, porque durante os seus tempos de juventude o futebol também foi segunda escolha. A sua primeira ambição foi tornar-se basquetebolista profissional como o pai, Ed Randolph, um americano que deixou a Universidade Roger Williams em Rhode Island para se juntar ao Sporting Belfast, em 1982. O basquete irlandês estava a atravessar um relative boom e tinha aprovado uma regra que permitia a cada clube contratar dois estrangeiros. Ed, nascido na Florida, não se desanimou nem com o clima da Irlanda nem com o clima de violência política que se vivia no país nesses tempos e aceitou o desafio. Permaneceu na Irlanda desde então, jogando e treinando num número apreciável de clubes, e casamento com uma irlandesa, Anne. Os seus filhos são desportistas dotados, com natural destaque para Darren, que representou a Irlanda no basquetebol apenas com 15 anos, enquanto jogava futebol pelas seleções jovens e futebol gaélico pela equipa de Wicklow, o distrito onde nasceu.

Darren já reconheceu que só ao perceber que não viria a ter altura suficiente para jogar na NBA que decidiu investir as maiores esperanças na profissionalização como futebolista.

Aos 16 anos aceitou ir para Inglaterra, para jogar no Charlton. Depois de alguns anos nos escalões jovens do clube e de alguns empréstimos aconteceu a tal estreia em Anfield. Mas, apesar de i impressionar Gerrard, o jogo seguinte na Liga aconteceu quase um ano depois – e aí deixou uma impressão muito menos favorável, largando uma bola fácil perante um colega de equipa e compatriota,

Paddy McCarthy, para a ver ressaltar para a baliza, fixando um empate (1-1) com o Southampton.

O Charlton cedeu o seu passe ao Hereford na época seguinte e Randolph começou bem na equipa do terceiro escalão, com 18 defesas memoráveis numa derrota por 1-0 com o Leeds United. Mas uns meses mais tarde revoltou-se quando se apercebeu de planos para o tornar suplente também no Hartlepool: ao saber que o clube estava em conversações para contratar Matt Murray, Randolph recusou-se a jogar num encontro de Taça, contra o Dagenham & Redbridge e rapidamente regressou ao Charlton. Finalmente, deixou The Valley como jogador livre, assinando pelos escoceses do Motherwell. E, finalmente, a sua carreira como titular entrou em velocidade de cruzeiro.

Fixando um novo recorde de jogos sem sofrer golos pelo clube escocês, Randolph chamou a atenção do então selecionador da Irlanda, Giovanni Trapattoni. Estreou-se como titular num particular com Omã, em setembro de 2012 (vitória por 4-1). Jogou outro particular, dois meses mais tarde, numa derrota por 2-0 com a Espanha e, depois disso, mais nada. Até ser subitamente lançado num decisivo jogo de apuramento para o Euro 2016, nada mais nada menos do que diante dos campeões do mundo.

A sua carreira em clubes prosseguiu bem – trocou o Motherwell pelo Birmingham City em 2013 e deu nas vistas a ponto de ser transferido para o West Ham em 2015. Mas Martin O’Neill ainda não lhe tinha dado uma só chamada à seleção. E quando a Alemanha viajou até Dublin, em outubro, para tentar assegurar uma vaga em França, O’Neill optou pela experiência internacional de Shay Given. Mas quando o veterano Given se lesionou num joelho, ao minuto 44, O’Neill tomou uma decisão drástica: em vez de substituir Given por David Forde, que já tinha brilhado no anterior empate com a Almanha (1-1) o selecionador apostou em Randolph. É justo reconhecer que a longa espera do guarda-redes, de 28 anos, pelo seu primeiro jogo competitive na seleção value a pena: imune aos nervos, fez uma série de grandes defesas, especialmente a remates de Jérome Boateng e Thomas Müller, e ainda conseguiu uma assistência, com um passe longo para Shane Long rematar e dar à Irlanda uma vitória que se tornou famosa.

Randolph voltou a jogar contra a Polónia, uns dias mais tarde, e esteve de novo em bom plano na vitória sobre a Bósnia Herzegovina no play-off. Tal como o médio Jeff Hendrick, tornou-se uma das revelações da campanha. Mas o facto de jogar poucas vezes no West Ham levantou a possibilidade de o seu lugar ser cedido a Rob Elliot, que surgiu numa forma exuberante no Newcastle – até rasgar os ligamentos do joelho num particular com a Eslováquia, em março. Foi um momento cruel para Elliot, mas a sua ausência torna a decisão de O’Neill mais fácil: Randolph é o guarda-redes mais ágil e nterventivo ao serviço da Irlanda e o selecionador já não deve ter quaisquer reservas em fazer dele o número 1.