Em 2008 a redação do Maisfutebol, em parceria com o cartoonista Ricardo Galvão, publicou na Prime Books o livro «Doze Euros no Bolso», que passava em revista, de forma bem-humorada, os momentos mais marcantes da história dos Campeonatos da Europa. São alguns desses textos, adaptados e atualizados, que recuperamos agora, para intervalar a atualidade do Euro 2016 com as memórias que ajudam a fazer a lenda da segunda maior competição internacional de seleções.

À terceira edição, o Europeu cresceu. Pela primeira vez a qualificação fez-se em sistema de grupos, em 90 jogos e já com todas as grandes seleções em prova. Estreou-se a Alemanha, que ficou pelo caminho depois de empatar na Albânia (!), e afirmou-se a Inglaterra.

A seleção de Sua Majestade tinha entrado em cena em 1964, depois de ter começado por torcer o nariz ao Europeu, tal como tinha feito ao Mundial. A primeira vez não correu bem, a campanha inglesa acabou com uma humilhação em França (2-5).

Quatro anos depois foi diferente. A Inglaterra, ostentando o título de campeã do mundo conquistado em 1966, superou um grupo totalmente britânico e ainda deixou pelo caminho os campeões espanhóis, para assegurar a presença em Itália.

1968 teve duas meias-finais memoráveis. Embora haja quem delas não guarde boas recordações. Em Florença, defrontaram-se Inglaterra e Jugoslávia. Sem golos, o jogo arrastou-se em faltas e entradas duras. A quatro minutos dos 90, Dragan «Magic» Dzajic marcou e colocou a Jugoslávia na final. Havia de piorar para a Inglaterra: mesmo antes do último apito, Alan Mullery respondeu a uma entrada com um pontapé de retaliação, ficando para a História como o primeiro jogador a ser expulso ao serviço da seleção inglesa.

Nápoles assistiu à outra meia-final. Frente a frente, a Itália e a URSS. Os visitados perderam Rivera por lesão, logo de início, no tempo em que não havia substituições. Seguiram-se 120 minutos e zero golos. Esse jogo deixa como legado o duvidoso estatuto de ter sido um dos mais defensivos de sempre em Europeus. E, claro, o único decidido por uma moeda: no desempate, o capitão Facchetti escolheu coroa e a sorte foi italiana.

1968 também foi a única edição a ter duas finais. Na primeira, a Jugoslávia foi melhor, mas não ganhou. Dzajic, outra vez ele, pôs a sua equipa em vantagem, mas a nove minutos dos 90 a Itália empatou, com polémica. Domenghini bateu um livre enquanto os jugoslavos ainda orientavam a barreira. Valeu, claro. E à luz dos regulamentos da época seria preciso jogar uma finalíssima. Dois dias mais tarde, a Itália fez entrar cinco jogadores frescos e a Jugoslávia já não teve forças para mais. Com golos de Riva e Anastasi, na primeira meia hora, a festa no Olímpico de Roma foi italiana.

Quatro décadas de Zoff

Passaram 14 anos entre esse título da Itália e a conquista seguinte. E entre o Europeu de 1968 e o Mundial de 1982 só não mudou Dino Zoff. O guarda-redes de Itália conquistou os dois títulos maiores de seleções com uma carreira de intervalo. Zoff, o eterno, foi durante quase duas décadas, sinónimo da baliza azzurra e símbolo da segurança e concentração defensiva que são imagens de marca do futebol italiano.

E o mais curioso é que a sua história nem sequer começou cedo. Primeiro a jogar na Udinese, depois no Mantova, Zoff tardou a ganhar notoriedade. Só se estreou pela seleção na última eliminatória para o Europeu de 1968, frente à Bulgária. Tinha 26 anos. Ganhou o lugar para a fase final, de que a Itália foi antfitriã, e jogou a primeira partida em casa.

Zoff tinha-se mudado para o Nápoles no início dessa época, e foi especialmente acarinhado pelos espectadores que encheram o estádio San Paolo, palco da meia-finai frente à URSS. O jogo não esteve à altura do ambiente: no seu primeiro grande teste internacional, Zoff assistiu da baliza a 120 minutos sem grandes oportunidades de golo. Seguiu-se a final, mais a finalíssima e a conquista do título.

Como jogador, só voltou à fase final de um Europeu em 1980. De novo em casa, mas agora num campeonato de má memória. Zangados com o futebol depois do escândalo <i>Totonero</i>, os italianos não quiseram saber do Europeu e foi num clima de indiferença e até alguma contestação que a Itália saiu na segunda posição da fase de grupos, para jogar pelo terceiro lugar com a Checoslováquia e perder nos penaltis, com Zoff na baliza.

Tinha 38 anos, mas a consagração suprema estava para chegar dois anos mais tarde, em 1982, quando capitaneou a Itália até ao título mundial. Aos 40 anos, quatro meses e 13 dias, foi o mais velho jogador de sempre a vencer um Mundial. Despediu-se da seleção no ano seguinte, no ponto final de uma história que se escreve com números arrasadores: 112 internacionalizações, presença em quatro Mundiais (em 1970 não jogou) e dois Europeus, um título mundial e um continental. O campeonato aina voltaria a reencontrar Zoff, agora no banco da Itália. Em 2000, o golo de ouro de Trezeguet negou-lhe um segundo título europeu, desta feita como selecionador.

Foi preciso esperar 36 anos para ver um italiano mais velho representar a <i>azzurra</i> em Europeus: Gianluigi Buffon, guarda-redes, como Zoffa, campeão do Mundo, como Zoff, começou o Euro 2016 com 38 anos, quatro meses e 20 dias. Fica por ver até onde irá – e se daqui por dois anos ainda vai liderar a <i>azzurra</i> em busca de um novo título mundial. Do alto dos seus veneráveis 76 anos, Zoff seria então o primeiro a aplaudir...