O Benfica perdeu as duas maiores figuras da sua história no ano em que conquistou o 33º campeonato. Dois homens, dois futebolistas, dois gigantes: um génio absoluto, mais novo, e o mais carismático dos líderes, que só partiu depois de o seu protegido ter completado a obra que tinha para fazer entre mortais. Coisa que nenhum deles é, aliás.

Abalado por duas mortes em rápida sucessão, o Benfica homenageou Eusébio, homenageou Coluna. Lembrou-os em todos os jogos desde que partiram. Honrou os ases, que lhe honraram o passado, como cantava o primeiro hino do clube, censurado por algo que também se foi há 40 anos. Os fiéis, se calhar, imaginam que o plano de Deus foi mesmo esse.

Primeiro, nasceu Coluna. Viajou de África para a metrópole. Conheceu Lisboa e o Benfica. Fez-se um homem de valores. Fez-se jogador maior do que todos. Depois veio Eusébio. No mesmo sítio, com as mesmas origens.



Coluna recebeu-o em Lisboa, ensinou-lhe benfiquismo e outras coisas da vida. Eusébio cresceu, foi Pantera Negra em campo e um Rei na história. É isso que cantam aqueles que agora o honram. «Tu és o nosso Rei, Eusébio, descansa eternamente…»

Eusébio morreu ao quinto dia de 2014.

Um Benfica de lágrimas nos olhos pela morte do King entrou em campo frente ao FC Porto no final dessa semana com três dias de luto nacional. Eusébio partiu, mas deixou a vontade de ganhar. A força do pontapé do Pantera Negra entrou pela alma dos jogadores que pisaram a Luz no domingo seguinte. Todos eles com um mesmo símbolo ao peito e um só nome nas costas: Eusébio.

Depois de um dos piores finais de temporada, em maio, o Benfica recuperava e saltava para a liderança isolada da Liga num jogo com os dragões sustentado por todas as emoções que a memória de Eusébio lhe transmitia. Um golo de Rodrigo, um golo de Garay: 2-0 e a primeira homenagem ao Rei.



A partir desse 2-0 ao FC Porto, ninguém mais apanhou o Benfica que seguiu isolado até ao título. Ali, naquele dia de janeiro, a memória de Eusébio foi demasiado grande até para um tricampeão nacional.Os encarnados partiram rumo ao 33º campeonato, com a imagem de Eusébio num fumo negro. O mesmo fumo que ficou colado ao corpo de André Gomes naquele 3-1 ao FC Porto, para a Taça de Portugal.

Eusébio esteve presente nesta temporada, como esteve Coluna. O «senhor» Coluna morreu sensivelmente dois meses depois do Pantera Negra, a 25 de fevereiro. Sobreviveu-lhe, porque era esse o seu desígnio. Fazia parte do grande plano, aparentemente.

O Benfica não o esqueceu, nem podia. Uma representação encarnada de primeiro plano viajou para Moçambique, onde se despediu do Monstro Sagrado, enquanto na Luz ficava uma equipa que tinha de honrar não apenas um, mas os dois maiores nomes da história futebolística do clube.



Na Liga Europa, frente ao PAOK [3-0] a bancada homenageou o capitão Coluna com uma tarja. Gigante, como ele foi. Em campo, Gaitán tirou um poema de pé esquerdo, num livre, para a despedida ao antigo camisola 10 da Luz, guardião da mística encarnada. A partir daí, ao minuto 72 de cada jogo [seria a idade do Pantera Negra], Eusébio e Coluna voltaram a ser dupla, agora na voz dos adeptos. E foi assim, das bancadas ao relvado, das vozes às chuteiras, que o Benfica honrou os dois ases com um título de campeão, em jeito de vénia.