Benedict Saul McCarthy, 43 anos, treinador do AmaZulu FC, a equipa-sensação na África do Sul. Benni para os amigos, glória do FC Porto. 125 jogos e 59 golos de dragão ao peito, de 2001 a 2006.

O Maisfutebol procura-o a propósito do feito europeu dos dragões em Turim, e do livre de Sérgio Oliveira que é quase uma réplica do seu em Old Trafford-2004, mas com Benni a conversa vai sempre um bocadinho mais longe.

Na pesquisa feita, rapidamente percebemos que o antigo avançado recebeu há dias o prémio para melhor treinador da liga sul-africana de fevereiro e, mais do que isso, recebeu um elogio público de José Mourinho.

Ficámos a saber também que os campeões europeus de 2004 têm um grupo privado no whatsapp e que Benni McCarthy continua a não falhar um jogo do FC Porto. O último, o de Turim, acabou-o agarrado aos candeeiros de um hotel e aos gritos, perante todos os seus jogadores. «Eles nunca me viram assim, não sabiam que eu podia ser tão doido.»

A construir uma carreira muito prometedora como treinador, Benni não esconde que a grande ambição é transportar o sucesso atual no país-natal para uma liga europeia. Se for em Portugal, ainda melhor.

Adjunto no Hiberninan (Escócia, 2015/16) e no Sint-Truiden (Bélgica, 2016/17), Benni McCarthy cumpre a quarta época como treinador principal. Esteve três anos no Cape Town City e procura agora fazer história com o AmaZulu FC, que está num ciclo de sete jogos sem derrotas – seis vitórias e um empate – e a afrontar os maiores emblemas do país.

O Benni treinador: posse de bola, controlo do ritmo e muita pressão

O AmaZulu FC está sediado em Durban e tem uma alcunha curiosa: Usuthu, um grito de guerra zulu. Em 2017 subiu ao primeiro escalão e procura agora estabelecer-se entre os melhores. Em dezembro de 2020, Benni McCarthy foi nomeado treinador da equipa e a aposta não podia ter sido melhor.

«As coisas estão a correr-me bem. Muito bem, se me é permitido dizer. Os jogadores agarraram-se à minha filosofia, à forma como pretendo jogar e à minha mentalidade. Estamos a ser recompensados nos jogos e não me posso queixar de nada. Só posso estar orgulhoso do que já conquistamos num período tão curto de tempo», diz o sul-africano ao Maisfutebol, no final de mais um treino.

Benni ainda é «um treinador jovem», com «muito para aprender», mas já capaz de saber o que pretende a curto prazo para a carreira e para a equipa que treina.

«Estou a aprender todos os dias. Quero fazer as coisas bem. O maior objetivo é fazer com que os jogadores saiam melhores do que quando me chegaram às mãos», explica o antigo internacional pelos Bafana Bafana, 80 vezes internacional e presente nos Mundiais de 1998 e 2002.

«Na África do Sul há qualidade, mas a maior parte dos futebolistas precisa de orientação, de alguém que esteve no topo do futebol. É isso que tenho tentado fazer, ensinar tudo aos meus atletas. Sou um treinador jovem, preciso de evoluir em todos os campos, mas estou satisfeito com a forma como a minha carreira tem evoluído.»

E que tipo de treinador é Benni McCarthy? Como olha para o jogo e o que pede às suas equipas? «O jogo tem evoluído bastante. Os atletas têm uma capacidade física incrível hoje em dia. Gosto de colocar as minhas equipas a fazer uma pressão muito alta. Se pressionarmos bem e se roubarmos a bola rapidamente, o adversário terá poucas possibilidades para nos ferir», defende o histórico avançado do FC Porto, campeão da Europa em 2004.

As minhas equipas têm de ser pressionantes e depois de ter qualidade na posse da bola. Gosto de obrigar os adversários a correr sem bola e de ditar o ritmo do jogo. É preciso bons jogadores para isso. Posse de bola, controlo do ritmo e criação de oportunidades de golo. Resumiria assim as minhas ideias fundamentais enquanto treinador.»

Estará, então, este jovem treinador já preparado para liderar um projeto ambicioso europeu? Esqueçam o Benni bon vivant e rebelde, a versão coach de McCarthy é precisamente o oposto.

«Não treino há muitos anos, mas sou um tipo confiante. Mergulho de cabeça nos meus projetos e acho que tenho a capacidade de mexer com a cabeça dos meus atletas. Sou um ‘serial winner’», vinca o líder do AmaZulu FC.

«Esses são atributos obrigatórios para alguém que quer trabalhar e triunfar nas ligas europeias. Trabalhei em Portugal, Inglaterra, Holanda e Espanha. Se tiver uma oportunidade no futebol europeu, só posso dizer que tudo farei para ter tanto sucesso como estou a ter agora na África do Sul.»

«FC Porto em Turim? Os meus jogadores nunca me tinha visto tão doido»

A conversa saltita entre o português e o inglês. Entre a carreira de treinador e as memórias do FC Porto. Benni McCarthy é um bom saudosista e conta que mantém contacto com grande parte dos colegas que o acompanharam na conquista europeia de 2004.

«Temos um grupo no whatsapp com a malta que ganhou a Liga dos Campeões em 2004. O José Mourinho também faz parte do grupo, é espetacular. Partilhamos o que estamos a fazer, como estão as nossas famílias, as nossas memórias. É brilhante e é uma forma de estarmos em contacto», confidencia Benni McCarthy, destacando depois os nomes de «Costinha, Bosingwa, César Peixoto, Vítor Baía, Deco, ‘Ninja’ Derlei, Carlos Alberto, Paulo Ferreira», aqueles com que mais fala. «Ah, e com o mister Mourinho também. É ótimo falar sobre os bons velhos tempos.»

Na conversa não podia faltar, claro, a vitória do FC Porto em Turim. Em 2004, Benni McCarthy rematou de livre e Costinha marcou na recarga ao Manchester United; em 2021, na mesma zona do relvado, Sérgio Oliveira rematou de livre, Cristiano fechou os olhos e saltou.

«Estou muito feliz com o meu FC Porto. O presidente continua a fazer um trabalho maravilhoso, agora está também a trabalhar com o Vítor Baía, e estou orgulhoso daquilo que o Sérgio Conceição, meu antigo colega de equipa, está a conseguir. Ele é fenomenal», atira Mccarthy, todo sorrisos.

«Amo e respeito o Mourinho, mas o Sérgio está a fazer algo verdadeiramente especial. O FC Porto continua a competir a grande nível contra as melhores equipas da Europa.»

E como foram os festejos de Benni ao segundo golo de Sérgio Oliveira? «Acabei o jogo agarrado aos candeeiros do hotel», responde McCarthy, mais gargalhadas. «A minha equipa jogava no dia seguinte e vimos o jogo do FC Porto juntos. Acho que os meus jogadores ficaram chocados, nunca me tinham visto tão doido, tão feliz. ‘Uau, não sabíamos que o nosso mister era assim tão louco’.»

«O FC Porto é a minha paixão, o meu amor e onde passei os melhores anos da minha carreira, por isso celebro tudo aquilo que o clube vai conquistando», completa Benni McCarthy, voltando ao livre de Oliveira, papel-químico do seu em Old Trafford.

«Eu vi, eu vi. Há pessoas que até fizeram essa montagem, com os dois livres. A distância para a baliza, para a área. O golo aparece de livre, como há 17 anos. E até a forma como o Sérgio Oliveira celebrou foi exatamente igual à do Costinha. Foi puro júbilo. A equipa está a portar-se muito, muito bem na Europa.»

«Foi comovente ler a mensagem que o José Murinho me enviou»

No mês de fevereiro, Benni McCarthy recebeu o primeiro prémio individual enquanto treinador. Foi o melhor da liga sul-africana. Nas redes sociais, José Mourinho foi dos primeiros a parabenizá-lo pelo feito, enquanto o tratava por «o meu velho avançado». McCarthy comoveu-se com a surpresa.

«Foi o melhor treinador que tive. Um gentleman, mas um gentleman duro e exigente. Era muito específico naquilo que queria de um jogador. Eu ainda era um jovem quando o conheci e percebi que se ouvisse o que ele me dizia podia tornar-me um jogador de elite», diz o agora treinador sul-africano.

«O que ele fez no FC Porto, Chelsea, Inter, Real Madrid, Tottenham é impressionante. É um dos treinadores mais icónicos do jogo. Ver uma mensagem tão pessoal, de alguém tão ocupado como ele, é comovente. Foi uma honra ler essas palavras do mister e saber que um dia fui um dos seus avançados preferidos.»

Benni McCarthy reconhece, aliás, que no seu manual do bom treinador estão ainda muitos dos ensinamentos de Mourinho. «Aprendi com o homem que me transformou de jogador normal em grande jogador. Quero ser um treinador como o José Mourinho foi comigo e claro que imito alguma das suas ideias.»

A despedida é feita em português. Num português perfeito, com uma pergunta a acompanhar: veremos Benni McCarthy por cá nos próximos tempos?

«Estou disponível para trabalhar em Portugal, claro. É um dos meus países favoritos. Gostava de ter uma oportunidade em Portugal num bom clube e fazer um trabalho, pelo menos, tão bom como o que fiz como jogador. Adorava voltar, não me vejo sequer como um estrangeiro em Portugal. As pessoas são muito simpáticas, sempre fui muito bem tratado.»

Atenção: Benni ‘serial winner’ McCarthy está a tornar-se um grande treinador de futebol.

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