Depois de 16 anos de ligação ao FC Porto e de três temporadas consecutivas em Tondela, David Bruno está preparado para novos desafios. O contrato com o emblema beirão expirou no final de mais uma época de sofrimento, mas com um epílogo feliz.
A entrevista ao Maisfutebol surge numa altura em que está a refletir sobre as várias abordagens recebidas neste início do mercado de transferências. De Portugal e do estrangeiro.
A conversa passa obrigatoriamente pela antiga ligação ao FC Porto, mas também por Tondela e pelo ambiente difícil do nosso futebol.
David Bruno, 27 anos, um lateral direito livre para escolher o futuro.
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Maisfutebol – Três anos no Tondela, três anos a lutar pela manutenção até ao limite. Que sensação leva desta experiência?
David Bruno – Acima de tudo, uma sensação de dever cumprido. Conseguimos sempre a manutenção, com maior ou menor dificuldade. Desta vez pareceu-me quase um milagre e é isso que as pessoas de Tondela também dizem.
MF – Não é frustrante estar três anos seguidos só a lutar pela manutenção?
DB – Compreendo a questão. Eu joguei 16 anos no FC Porto, sempre com o objetivo de ser campeão nacional e no Tondela foi tudo diferente. Jogávamos para ganhar, claro, mas a estratégia era distinta. Fiz mais de 80 jogos em três anos, acabei agora o contrato e tenho a perspetiva de dar o salto para um clube com outros objetivos, em Portugal ou no estrangeiro.
MF – Depois de fazer três anos consecutivos na I Liga, o David é um lateral diferente?
DB – Há três anos eu nunca tinha jogado neste patamar e se calhar olhavam para mim de outra forma. Creio que agora é diferente, já sou um lateral com experiência e andamento.
MF – Como é que se prepara uma final como esta que vocês tiveram contra o Chaves?
DB – O Tondela é especialista nisso (risos). Andávamos com a corda ao pescoço, mas essa semana de trabalho até foi tranquila. Os mais experientes soltaram os colegas mais novos, gerimos bem todas as emoções.
MF – E depois há aquele início de sonho.
DB – 4-0 aos 28 minutos… nem nos nossos melhores sonhos. Olhávamos uns para os outros dentro do campo e nem sabíamos o que pensar. Marcámos aos três minutos, os adeptos foram essenciais e fomos por lá fora. Foi um final de época incrível.
MF – Que resumo faz desses três anos em Tondela, longe da sua casa no Porto?
DB – Pela primeira vez tive de sair da minha casa, apesar de não ser uma viagem muito longa. Vivi sozinho pela primeira vez e aprendi a jogar sob a pressão da aflição constante, de saber que se não ganharmos o próximo jogo podemos descer. Isso deu-me uma estabilidade emocional muito grande.
MF – O David esteve 16 anos no FC Porto. Como é que foi jogar contra o seu clube de sempre?
DB – A primeira vez foi muito estranha. Fui capitão na formação e na equipa B, tenho uma ligação forte ao clube… no futebol português fala-se tanto de corrupção, tanto de esquemas, e isso acaba por contagiar-nos. Sentimo-nos intimidados. Sabia que se errasse, todos iam dizer que eu estava comprado. Felizmente fiz três jogos contra o FC Porto e todos me correram bem. Eu também queria demonstrar-lhes que podia estar lá, ter outro tipo de oportunidades e ainda ser jogador do FC Porto.
MF – O que achou do Petit e do Pepa, os seus treinadores no Tondela.
DB – Bem, antes tenho de dizer que eles tiveram de se adaptar ao clube e às necessidades do clube. Isso é importante. Estive dois anos e meio com o Pepa e sei que as ideias dele sobre o futebol são diferentes daquelas que pusemos em prática, são mais atraentes, mais ambiciosas. A cultura do Tondela, se calhar, não permite esse tipo de futebol. Gostei de trabalhar com os dois, são nomes para seguir no futuro.
MF – É possível projetar futebolistas num clube que luta só pela manutenção?
DB – O Cláudio Ramos chegou à seleção e até devia ter sido chamado mais cedo. Essa é a prova de que mesmo num clube como o Tondela é possível projetar jogadores para patamares altos, sem dúvida.
MF – O Cláudio foi um dos jogadores que no final da época criticou abertamente o comportamento de alguns colegas. O David tem a mesma opinião?
DB – O Cláudio e o Tomané. Percebi o que eles queriam dizer, mas aquilo saiu ainda muito a quente. É verdade que os portugueses sempre sentiram mais a derrota, a necessidade da permanência, preocupavam-se mais. Nunca vi nada de especial, sinceramente, mas talvez alguns dos meus colegas estrangeiros não vivessem as coisas da mesma forma. Se calhar, no estrangeiro, aconteceria o mesmo comigo ou outro português.