Phillip Lahm, «talvez o jogador mais inteligente» que Pep Guardiola treinou, só vai andar por aí mais uns meses. Aos 33 anos, o internacional alemão decidiu terminar a carreira. O campeão do mundo, o defesa que subiu no terreno e se tornou referência da equipa, no Bayern Munique e na seleção da Alemanha que chegou ao topo em 2014, sairá ao fim de mais de 500 jogos pelo Bayern, a que se somam duas épocas pelo Estugarda e mais 113 jogos com a camisola da «Mannschaft». Ou seja, pelo menos 750 jogos. Sem ter visto um único cartão vermelho. Um exemplo. Lahm foi central no crescimento do Bayern Munique e no renascimento da Alemanha, um pequeno grandíssimo jogador, mas é este registo imaculado que serve de pretexto a uma viagem por outras marcas disciplinares de alguns dos grandes jogadores da história.

Até porque, em simultâneo, assistimos nesta terça-feira à expulsão de outro craque famoso precisamente pelo inverso: Luis Suárez. Um caso insólito no que à folha disciplinar diz respeito.

Começando por Phillip Lahm, ele está ao lado de alguns nomes ilustres, como recordava ainda nesta terça-feira a UEFA no seu site oficial: entre eles o português João Moutinho, numa carreira de 663 jogos que já passou por Sporting, FC Porto, Mónaco e, claro, a seleção nacional. Mas também os espanhóis Andrés Iniesta e Raul Gonzalez, ou o francês Michel Platini.

E depois, no outro extremo está Luis Suárez. Mas, se olharmos apenas para o registo disciplinar de jogos, Suárez não tem muitos mais. Sério. Pois bem, a expulsão no jogo de Taça do Rei com o At. Madrid foi apenas a terceira em jogos oficiais ao longo de toda a carreira do uruguaio. Suarez viu o segundo amarelo em cima dos 90 minutos, quando saltou com Koke a uma bola e depois saiu a contestar a decisão até ao túnel.

Não era expulso num jogo há quase sete anos. As duas anteriores expulsões aconteceram ambas no verão de 2010. A primeira na fase final do Mundial da África do Sul e foi Olegário Benquerença quem lhe mostrou o vermelho. No último minuto do prolongamento Suarez levou as mãos à bola para evitar um golo do Gana e foi expulso. O Uruguai acabaria por passar nos penáltis.

O vermelho seguinte seria na Supertaça da Holanda, pelo Ajax e frente ao Twente. Sim, teve todos aqueles casos e castigos. Mas nunca mais viu vermelho em campo. Nem na mordidela a Chiellini durante o Mundial 2014, que lhe valeu quatro meses de suspensão de toda a atividade, mais nove jogos impedido de representar o Uruguai.

Essa foi apenas a última mordidela famosa de Suárez. Já tinha sido suspenso por sete jogos com o Ajax, por outra mordidela a um jogador do PSV. E depois quando jogava no Liverpool, dez jogos pela mordidela a Ivanovic. E ainda mais oito jogos por insultos racistas a Evra durante um jogo com o Manchester United. Mas em nenhum desses casos foi expulso.

Quando falamos de grandes e expulsões há um nome incontornável. Zinedine Zidane, claro. O génio que acabou a carreira a ver vermelho, a cabeçada a Marco Materazzi na final do Mundial 2006 a condenar a França e a fechar de forma incrível uma grande carreira. Mas longe de ser caso isolado. E, ao contrário de Suárez, Zidane não passou entre as gotas da chuva em campo.

O agora treinador do Real Madrid viu 14 vermelhos ao longo da sua carreira. Dois deles pela seleção, sendo que ambos aconteceram em pleno Campeonato do Mundo. O primeiro foi no Mundial 1998, no segundo jogo da fase de grupos frente à Arábia Saudita. A França seria campeã do mundo, mas viu-se privada de Zidane em dois jogos. Anos mais tarde, Zizou justificava assim o seu registo disciplinar, numa entrevista à Esquire: «Se olharem para as 14 expulsões da minha carreira, 12 delas foram resultado de provocações.»

Dos grandes jogadores da história Zidane é mesmo aquele com pior registo disciplinar. Mas Cristiano Ronaldo também tem um número considerável de vermelhos na sua carreira. Nove ao todo, cinco pelo Real Madrid e quatro pelo Manchester Unitd. Ainda assim, menos que Zlatan Ibrahimovic ou David Beckham.

Lionel Messi, a «nemesis» de Ronaldo, tem apenas um cartão vermelho em toda a sua carreira. E foi logo na estreia pela seleção da Argentina. No verão de 2005, num particular com a Hungria, viu vermelho um minuto depois de entrar (!), por reagir a um defesa que tentava travá-lo.

Mesmo Diego Maradona, temperamental como era, só teve quatro expulsões ao longo da carreira. Pelé e Eusébio, por exemplo, menos ainda. O «Pantera Negra», aliás, foi expulso uma única vez. Foi nas Antas, num jogo de Taça de Portugal entre o FC Porto e o Benfica em 1964. Não havia vermelhos ainda nesse tempo, mas havia expulsões. Eusébio recordou um dia esse momento, em declarações ao jornal I: «Só para ver a injustiça da expulsão… Nem apanhei castigo! O jogo já estava 1-1 quando o árbitro, o já falecido Porfírio da Silva, me mandou para a rua. Estava a ajeitar a bola para outro livre, na mesma posição do 1-0, e o árbitro disse-me para não mexer na bola, mas eu tinha de a colocar a meu gosto, como sempre fazia, sem a adiantar nem nada disso. Ainda não tínhamos essa manha. Eu, pelo menos, não tinha. O Coluna defendeu–me e disse-lhe que era eu quem marcava os livres e os penáltis. De nada valeu. Ele expulsou-me e saí das Antas com o público a bater palmas e o Otto Glória até me cumprimentou.»

Há expulsões raras, mas marcantes. Como a de Rui Costa, talvez a expulsão mais célebre do futebol português. O antigo 10 apenas viu um vermelho em toda a sua carreira profissional, que passou por Benfica, Fiorentina, Milan e, claro, pela seleção nacional. Foi o tristemente famoso Alemanha-Portugal de setembro de 1997. Portugal vencia por 1-0, Pedro Barbosa tinha marcado três minutos antes, quando aos 74m Rui Costa recebeu indicação para sair. Dirigiu-se para a linha, o árbitro Marc Batta achou que o português estava a queimar tempo e mostrou-lhe segundo amarelo. Reduzido a 10, Portugal sofreu o empate e viu esfumarem-se ali as esperanças de chegar ao Mundial 1998.