Ao fim de nove anos, o estatuto de vice-campeão alemão pertence ao Schalke 04. Mérito de Domenico Tedesco, um jovem técnico com raízes italianas. A época transata foi excelente, visto que para além do segundo lugar na Bundesliga, a formação de Gelsenkirchen chegou às meias-finais da Taça. Porém, o arranque da temporada 2018/19 tem sido um pesadelo: uma vitória na Taça e três derrotas em três jornadas na Liga.
Contudo, é preciso salientar que esta versão 18/19 do Schalke 04 é diferente daquele que encantou a Alemanha no último ano. Thilo Kehrer (PSG), Max Meyer (Crystal Palace) e Goretzka (Bayern Munique) saíram e a equipa ainda está em fase de reconstrução. Prova disso, são as inúmeras alterações no onze titular e os vários sistemas que Tedesco realizou, nas quatro partidas oficiais já realizadas.
Mas, no fundo, a ideia mantém-se, independentemente do sistema. Tedesco privilegia a largura de jogo, oferecida pelos laterais/alas, e, ao mesmo tempo, procura manter o onze coeso. A equipa tem sentido dificuldades gritantes em ataque continuado – demasiadas bolas longas para Burgstaller e Uth – e em estancar as variações de flanco por parte do adversário, devido à pressão asfixiante que tenta fazer na saída de bola do adversário.
Sistemas utilizados:
Para além do penúltimo lugar no campeonato, Domenico Tedesco fez constantes alterações na equipa, desde o onze base ao desenho tático. Por exemplo, na estreia na Liga montou a equipa em 3x4x3, no segundo jogo em 4x2x3x1 ou e recuperou a fórmula inicial para o jogo frente ao Borussia Monchengladbach, o último antes de receber o FC Porto.
A variabilidade do sistema afeta, naturalmente, a forma como o Schalke 04 defende, embora a maioria dos princípios se mantenham. Por sua vez, ofensivamente, as alterações do esquema tático pouco ou nada têm mudado a forma de atacar: um sem fim de bolas despejadas para a frente ou uma sobre-exploração dos corredores para tirar cruzamentos.
Organização e transição defensiva
Ao contrário do ano anterior, o Schalke 04 ainda evidencia algumas lacunas no momento de organização defensiva. Quando a equipa está alinhada em 3x4x3, por exemplo, dois dos homens mais adiantados preocupam-se em condicionar os centrais adversários, enquanto o outro fecha no médio mais defensivo. Formam uma espécie de pentágono no corredor central. No momento em que o oponente consegue ligar o jogo pelo lateral, os extremos, por vezes, não têm tempo para chegar para a pressão e, os médios e os laterais, especialmente Baba, não dividem o espaço. Consequentemente, quando chegam perto do adversário, a bola já lá não está e a equipa começa a desequilibrar-se.
No entanto, quando um dos extremos consegue chegar ao lateral contrário, o homem do lado oposto não fecha por dentro, junto aos médios.
A forma como o Schalke 04 quer pressionar é corajosa, embora a equipa ainda não esteja totalmente identificada com a ideia do seu treinador. A linha defensiva afunda muito, ou seja, não acompanha o «pressing» feito pelos sectores intermédios e avançados, originando, por vezes, espaço tanto no corredor lateral como central.
Alguns dos jogadores ainda não estão totalmente identificados com o processo. Não percebem quando fazer contenção ou quando pressionar, acabando por cometer erros e desorganizar a equipa.
As situações de organização/transição defensivas acima explicadas sucederam, quase todas, em alturas em que o Schalke 04 atuava numa estrutura de 3x4x3. Quando Tedesco altera para o 4x2x3x1 a equipa ocupa melhor o espaço e fica menos exposta, sobretudo no corredor central.
Há vários pontos que o FC Porto pode explorar, consoante o sistema do adversário. Tedesco apostou no 3x4x3 durante grande parte dos jogos disputados e, não deverá, fugir muito desta linha terça-feira. Por isso, não seria de estranhar que Conceição recuperasse o 4x3x3 que muito sucesso deu aos portistas nos jogos europeus na época anterior. Se tal não acontecer, há sempre a possibilidade de sair pelos dois laterais, devido ao posicionamento dos extremos do Schalke 04 no momento de pressão. Os dragões vão ganhar superioridade numérica à medida que avançarem no terreno.
Momento ofensivo
Os dois momentos - defensivo e ofensivo - não podem nem devem estar dissociados. Os dois estão interligados. No entanto, nesta breve e simples análise ao primeiro oponente do FC Porto na Champions, optamos por dividi-los.
Este é o momento de jogo em que o Schalke 04 mostra maiores dificuldades. O processo de jogo encontra-se pouco desenvolvido, quer em 4x2x3x1, quer em 3x4x3. O jogo interior é escasso, o que é pouco compreensível, visto que, alem dos médios, os três homens da frente ocupam quase sempre zonas interiores.
Os vice-campeões alemães limitam-se a canalizar jogo pelas alas, por Caligiuri ou por Baba (mais utilizado face à lesão de Oczipka). O italiano abre bem junto à linha lateral e varia pouco os movimentos, ao contrário do ganês. O lateral que pertence ao Chelsea tanto faz movimentos por fora - junto à linha lateral - como por dentro - entre central e lateral, beneficiando das constantes derivações interiores do extremo (por norma, Konoplyanka).
A primeira fase de construção é pouco trabalhada. Dois dos três defesas, Naldo e Nastasic, dão boa capacidade de saída de bola, ao contrário de Sané (o outro central) que é mais limitado nesse aspeto. Todavia, os médios predispõem-se a receber à frente da linha média adversária e raramente tentam passes verticais, o que dificulta a construção. Tedesco deve sentir muitas saudades de Max Meyer, neste capítulo.
Três médios permitem ao Schalke 04 ensaiar um movimento que tanto gosta. O extremo aproxima-se do lateral para receber, arrasta o lateral e abre espaço para a entrada do médio nesse espaço.
Raras vezes o Schalke 04 consegue sair jogar dentro do bloco adversário. Quando o faz, torna-se uma equipa perigosa.
De forma resumida, o Schalke 04 tenta através de lançamentos longos chegar à área adversária. Burgstaller e Di Santo são poderosos no jogo aéreo, o que muitas vezes permite à equipa ganhar a segunda bola e construir de outra forma dentro do último terço. Quando quer sair desde trás, os vice-campeões alemães utilizam sobretudo Naldo para fazer chegar a bola com qualidade aos sectores mais adiantados.
O FC Porto terá de controlar muito bem a segunda bola, ter os jogadores perto para roubar capacidade de criação nos últimos trinta metros e de ter em atenção Naldo. Além disso, os portistas devem vigiar de perto Konoplyanka. O ucraniano tem por hábito receber na esquerda e conduzir para a zona interior, sempre à espera de fazer um «passe de morte» ou de atirar à baliza.
Face ao que foi observado, os campeões nacionais têm todas as possibilidades de voltar a sorrir em Gelsenkirchen, palco da conquista da Liga dos Campeões em 2004.
Bolas paradas
O maior problema do Schalke 04 até ao momento. Por muito que a formação de Tedesco seja apanhada mal organizada em alguns momentos, acaba por resolver esses mesmos problemas. No entanto, no que diz respeito aos lances de bola parada, a situação é muito distinta.
Três dos seis golos sofridos na Bundesliga, nasceram na sequência de lances de bola parada: um de livre direto e dois pontapés de canto. Bolas tensas ao segundo poste são o calcanhar de Aquiles desta equipa que opta por uma marcação mista para defender este tipo de lances.
Ofensivamente, o Schalke 04 não aproveitou nenhum dos lances de bola parada para marcar golos. Aliás, todos os golos que marcou na Bundesliga (2) nasceram de situações avulsas e, aparentemente, pouco trabalhadas. Convém referir que Caligiuri é o responsável por cobrar quase todos os lances de bola parada. O italiano varia os cruzamentos: ora procura a zona do primeiro poste, ora tenta colocar em Naldo ou Sané, poderosos no ar. Nos jogos observados, os germânicos não mostraram nenhum outro tipo de jogada ensaiada.
Figura: Konoplyanka
Tedesco recuperou a melhor versão do internacional ucraniano. É dos poucos jogadores que durante o momento ofensivo consegue segurar a bola, esperar apoio e associar-se com os restantes colegas. A capacidade do Schalke 04 para desequilibrar depende muito do que Konoplyanka é capaz de fazer. As diagonais da esquerda para o meio são um movimento que o FC Porto terá de controlar, de forma a não passar por calafrios.
Resumo:
Como não poderia deixar de ser, esta análise, sublinhe-se, é simples e apenas lhe oferece alguns traços gerais do que o FC Porto pode esperar. Como resultado desta observação, é possível afirmar que o Schalke 04 está completamente ao alcance do conjunto de Sérgio Conceição. A formação do norte da Vestfália gosta de jogar em largura e de efetuar lançamentos longos para os homens da frente. Todavia, ainda apresenta algumas limitações na maneira ousada como pretende pressionar. Se os portistas controlarem o espaço aéreo, ganharem a segunda bola, anulam ofensivamente os alemães. No que ao processo ofensivo diz respeito, os azuis e brancos podem aproveitar o espaço interior tanto por Brahimi ou Otávio (4x4x2) ou pela presença de um terceiro médio (4x3x3). Conceição tem a palavra.