Já não restam dúvidas, nem entraves: depois de se desvincular do Nantes, Sérgio Conceição está finalmente prestes a ser apresentado como treinador do FC Porto.

Aos 42 anos, o antigo jogador dos azuis e brancos regressa ao Porto, cidade onde vive, para abraçar o maior desafio da sua ainda curta carreira de treinador, que começou a 8 de janeiro de 2012, quando assumiu o comando técnico do Olhanense em substituição de Daúto Faquirá.

À semelhança do que fez na Ligue 1 nesta temporada, guindando o Nantes da zona de despromoção até ao 7.º lugar, nessa época de estreia Conceição livrou os algarvios da luta pela despromoção e terminou em 8.º lugar.

Essa primeira impressão marcou o plantel, como salienta o médio da Académica Nuno Piloto, que ao Maisfutebol traça o perfil do técnico que o orientou em Olhão (2011/12 e 2012/13) e também na Briosa (em 2013/14).

«A imagem e a mensagem que ele transmite logo à partida causam um impacto muito forte no grupo. É muito rigoroso nos treinos, que são intensos mas não muito longos, e exige compromisso e empenho a cada jogador. Cada exercício tem um propósito. Lembro-me de que quando algo não estava a ser feito da forma que ele queria, ele acabava com o treino, mandava toda a gente tomar banho e obrigava-nos a voltar à tarde para o concluir o que faltava. Ele é um detalhista. Não facilita e não permite relaxamentos ou que os jogadores façam um exercício só por fazer.»

Fernando Alexandre, médio da Académica que esta época esteve emprestado ao Moreirense, também foi treinado por Conceição em Olhão e em Coimbra e corrobora a versão: «Quando o Sérgio apareceu em Olhão foi um choque pela positiva. Era diferente de todos os treinadores com quem já havia trabalhado. Mostrava paixão e requeria exigência máxima no treino e nos jogos. Isso obriga-nos a evoluir. Ia aos pormenores e, talvez também por ter estado muitos anos a jogar em Itália (Lazio, Parma e Inter entre 1998 e 2003), as equipas dele são sempre muito organizadas. Depois, há o resto: espírito de liderança, saber ouvir e motivar os jogadores. Além disso, o seu passado como jogador incute respeito ao grupo.»

Caneta como presente

Há, claro, o lado temperamental de Sérgio Conceição e Nuno Piloto recorda-o com um sorriso: «Se algo não lhe agradar ele manda um berro e faz-se logo entender aos jogadores. Dá um murro na mesa quando é preciso. Mas há ali uma relação de franqueza e até companheirismo com os jogadores. Nos primeiros treinos toda a gente fica a saber as regras. Fica logo tudo bem definido. Ele diz o que tem a dizer nos olhos e que não olha a nomes na hora de tomar opções. A partir daí, sabe promover a união de grupo.»

São habituais sessões de stand-up comedy ou paintball, corridas de karts e outras atividades, mas sobretudo almoços e jantares só com a equipa. Nos primeiros convívios, os caloiros do plantel são convidados para cantar. É uma forma de quebrar o gelo, tudo em nome do fortalecimento do espírito de grupo.

Além disso, há gestos que ficam na memória. Como um presente especial que Sérgio Conceição ofereceu a cada jogador aquando da sua despedida do comando técnico do Olhanense.

«Marcou um jantar com a equipa e no final ofereceu uma caneta Montblanc com as iniciais de cada jogador. Era uma forma de nos agradecer e de marcar o início da carreira dele como treinador. Ainda hoje a guardo essa prenda com muito carinho», lembra Nuno Piloto.

Altruísta e devoto

Não é de agora que é conhecido o espírito altruísta do rapaz que cresceu no seio de uma família humilde na aldeia de Ribeira de Frandes, nos arredores de Coimbra, e que aos16 anos, no dia seguinte a assinar pelo FC Porto, enfrentou as agruras da vida com a morte do seu pai num acidente de moto – a que se seguiria o falecimento da sua mãe pouco tempo depois.

«O Sérgio é capaz de assistir a um programa onde alguém precisa, por exemplo, de uma cadeira de rodas, e ligar para a produção, sob anonimato, a oferecer-se para a comprar», contou o empresário e amigo Jorge Manuel Mendes ao Maisfutebol numa reportagem publicada em 2013, onde se salienta também o seu lado devoto. Uma vertente bem patente não só nas contribuições habituais junto da Colónia São Francisco de Assis, que se dedica a ajudar crianças desfavorecidas, como noutros gestos de fé: como aconteceu em maio de 2015, quando após o jogo frente ao Rio Ave em que apurou o Sp. Braga para a final da Taça de Portugal cumpriu a promessa de, juntamente com a sua equipa técnica, fazer a pé os 40 quilómetros entre Vila do Conde até Braga.

Pelo tempo que demoraram as negociações entre FC Porto e Nantes, houve quem por estes dias dissesse que Sérgio, pai de quatro filhos futebolistas (com a curiosidade de um deles jogar no Benfica e outro no Sporting) mais parecia vir a pé de França.

A verdade é que está há mais de uma semana no Porto e na segunda-feira até esteve reunido ao almoço com o presidente Pinto da Costa e com o diretor-geral Luís Gonçalves.

Falta agora formalizar a apresentação, algo que deverá acontecer na quinta-feira. Terá Sérgio uma caneta especial para rubricar o tão ansiado contrato?