Primeiro o selecionador nacional, Fernando Santos, e logo a seguir três treinadores que estão na luta por uma qualificação europeia: Rui Vitória, Paulo Fonseca e Pedro Martins. A quinta edição do Fórum do Treinador arrancou em força, no primeiro de dois dias de debate no Centro Nacional de Exposições de Santarém, com organização da Associação Nacional de Treinadores de Futebol (ANTF).
 
Se a tarde desta segunda-feira estava reservada sobretudo para uma componete mais prática, no pavilhão (treino de futsal com Venancio López, Ricardo Lobão e Raúl Moreira) e no Campo Chã das Padeiras (treino de futebol com José Couceiro, Lito Vidigal, Emílio Peixe e Joaquim Milheiro), o período da manhã ficou marcado por conversas mais informais. E logo após a sessão de abertura foi Fernando Santos a apresentar-se «um para um» com Carlos Daniel (RTP).
 
Entre as vivências do selecionador e a definição das suas ideias, a conversa incidiu várias vezes sobre a filosofia que Pep Guardiola começou por desenvolver em Barcelona e que agora transportou para o Bayern de Munique. O futebol de posse em contraste com uma postura mais especulativa, da identidade inegociável a estratégias moldáveis.
 
Fernando Santos ficou a meio caminho, ao considerar que o ponto de partida de uma estratégia pode não ser a própria equipa. «Não tem de ser forçosamente assim. Admito que possa ser, mas depende do resultado que queres. Há equipas centradas no adversário, em anulá-lo», afirmou.
 
O selecionador nacional defendeu, em todo o caso, que «a equipa pequena é que vive em adaptação permanente», e «um treinador não pode deixar de ter o seu conceito». «Mas se quer ter resultados deve ter a flexibilidade de adaptar a sua equipa», acrescentou, incluindo Guardiola na equação.
 
«No Porto o Bayern privilegiou a saída pelo médio centro, que recuava. O Porto criou muitos problemas e em Munique o Guardiola meteu o central a sair com a bola. Os jogadores do Porto faziam pressão no mesmo sítio mas quem saía com a bola era o central, e o Porto nunca soube lidar com isso», analisou.
 
O valor dos protagonistas
 
No fundo tudo depende do contexto. «Vi o Barcelona do Cruyff treinar no Estoril quando veio defrontar o Belenenses. Fiquei impressionado. A matriz já era a posse de bola. É uma escola que o Guardiola conhece muito bem. É evidente que quem tem bola está mais perto de vencer, mas esta cultura funciona numa equipa em que a qualidade dos artistas o permite. Com outra equipa continua a ser válida, mas não sei se funciona da mesma forma», analisou.
 
«O Guardiola pode comprar o Xabi. Na maioria dos casos isso não é possível. E depois tens um trinco que não varia o jogo. Não podemos ficar sentados na teoria», apontou ainda Fernando Santos, antes de recuperar um episódio pessoal para defender a importância do contexto.
 
«Uma vez, no Estoril, perguntei ao Jimmy Hagan o motivo pelo qual jogávamos da forma que jogávamos. Ele respondeu-me que a jogar assim tinha sido campeão três vezes no Benfica. Eu disse-lhe que no Benfica tinha Eusébio, Simões, Humberto e Toni. O Estoril estava para descer de divisão», recordou o agora selecionador nacional, que incluiu o inglês entre os três técnicos que mais o marcaram, a par de António Medeiros e Manuel de Oliveira.
 
É a importância dos nomes, ou daquilo que eles valem, a prevalecer sobre uma estratégia. E talvez por isso Fernando Santos prefira adaptar o sistema aos recursos, e não o inverso. «Quando cheguei à Seleção olhei para as características dos jogadores e procurei escolher os melhores. Não podia decidir jogar com dois médios e deixar de fora jogadores que, na verdade, eram melhores do que outros», explicou, assumindo-se apologista de uma «matriz de ataque organizado, embora sem perder de vista o ataque rápido».
 
E se Fernando Santos nem tem de pensar em dinheiro para formar a Seleção, o mesmo já não podem dizer os treinadores que participaram no painel seguinte, comandado pelo Alexandre Afonso (Antena 1). Pedro Martins, Rui Vitória e Paulo Fonseca estão habituados a fazer muito com pouco.
 
«Mesmo com as dificuldades que temos somos capazes de competir com os melhores. Jogámos sem complexos frente a equipas que são líderes nos seus países. A diferença fez-se nos pormenores. Com pouco temos feito muita coisa, num país tão pequeno. Temos extraído tanta qualidade», disse o técnico do Rio Ave.
 
Pedro Martins reconheceu que «o mercado de janeiro é muito complicado, sobretudo quando a cobiça envolve jogadores nucleares», e as constantes mudanças «deixam os clubes cada vez mais descaracterizados», mas por estes dias a valorização do plantel tem a mesma importância que as vitórias.
 
«O rendimento deve ser analisado com base em dois aspetos. Por um lado o resultado, que é subjetivo, pois podemos ter resultados sem conquistar títulos. Podemos ter rendimento numa equipa cujo principal objetivo é a permanência. Isso é ter rendimento. A outra vertente é a valorização dos jogadores, fazer evoluir quem trabalha connosco. Essa é uma vertente que, no quadro das dificuldades que existem no futebol português, é determinante», analisou Paulo Fonseca.
 
Os diferentes conceitos de sucesso
 
Rui Vitória defendeu também que «existem várias formas de analisar o rendimento», e «um treinador que evita uma despromoção pode ser mais importante do que conquistar um título». «É importante fazer um rácio», reforçou o técnico do Vitória de Guimarães, dizendo que «não se deve olhar apenas para o resultado».
 
«Muitas vezes ganhamos e não estamos a fazer bem as coisas. E muitas vezes perdemos e não estamos a fazer mal. Muitas vezes as derrotas são o início de grandes vitórias. Aqui a exigência do treinador tem de estar ainda mais vincada», acrescentou Rui Vitória. «Se não conseguirmos descolar desta situação a dada altura vamos cegar também relativamente ao resultado».
 
«Já saí extremamente descontente de uma vitória e já saí relativamente contente de um jogo que perdi», reforçou Paulo Fonseca, defendendo que «algumas derrotas deixam certezas relativamente ao caminho».