A estação televisiva France 2 decidiu investigar os fundos de investimentos que proliferam no futebol mundial e rumou a Portugal. Não foi por acaso. Clubes e empresários do nosso país abraçaram o conceito e lidam com dinheiro de origem desconhecida.

O segredo tem sido a alma deste negócio e o futebol português ganha exposição mediática face à necessidade de divulgação das movimentações relevantes à Comissão de Mercado e Valores Mobiliários. Algo que não acontece em Espanha, Argentina ou Brasil, por exemplo.

A Doyen Sports tem percentagens dos passes de Defour, Mangala, Ola John, Marcos Rojo e Labyad. Ao que o Maisfutebol apurou, Jackson Martínez é uma hipótese. O fundo tem interesse no jogador do F.C. Porto, envolvido num longo processo de renovação e desejado por vários clubes europeus. Para além disso, garantiu parte dos direitos de jogadores que atuam no futebol espanhol, mas por lá não são divulgados os montantes nem as percentagens. O português Nélio Lucas é o CEO desta empresa.

Rinaudo, Elias e Diego Rubio, para além de vários jovens do Sporting, estão na lista de ativos da Quality Football Ireland e todos os seus derivados. Este fundo negoceia regularmente com o emblema leonino e pontualmente com o Sp. Braga. Juan Carlos foi adquirido pelos minhotos, que venderam imediatamente 90 por cento do seu passe (e direitos desportivos) à Quality. O espanhol nunca vestiu a camisola arsenalista.

A Quality Football Ireland tem sido associada a Peter Kenyon, antigo diretor desportivo do Chelsea, e mesmo a Jorge Mendes. Em 2011, o jornal El País noticiou que tinha sido este fundo a suportar a transferência de Roberto Jimenez do Benfica para o Saragoça. Um dado não confirmado nas informações enviadas pelos encarnados à CMVM.

Como resposta a essa notícia, a Gestifute de Jorge Mendes garantiu que o empresário era «um simples consultor» da empresa, sem «poder de decisão». Ao contrário do que aconteceu com a Doyen, o Maisfutebol não conseguiu dialogar com responsáveis destes fundos, nomeadamente a Creative Artists Agency, dos Estados Unidos.

De qualquer forma, existem ligações confirmadas entre empresários portugueses e os maiores fundos de investimento a operar na Europa, para além de um leque significativo de ativos dos clubes grandes associados aos referidos fundos.

«Abordagem firme é necessária»

A UEFA está preocupada. Michel Platini já falou várias vezes sobre o tema, prometendo medidas num futuro próximo. A FIFA, no seu artigo 18, não fecha por completo a porta a estes fundos de investimento, mas o organismo que regula o futebol europeu quer ir mais longe. «Acreditamos que uma abordagem firme a esta matéria é necessária», escreveu recentemente Gianni Infantino, diretor-geral da UEFA.

«Hoje em dia, os fundos são uma realidade incontornável no futebol e, ainda que a UEFA não esteja a favor, não há nada que possa fazer. Os fundos mantém vivos alguns clubes», salienta ao Maisfutebol uma pessoa que trabalha diariamente neste meio.

Pini Zahavi (curiosamente associado pelo Sporting ao fundo Gol Football Luxembourg, que detém parte dos direitos económicos de Diego Reyes), disse recentemente que «sem os fundos, o dinheiros, os investidores, não haveria FC Porto». Veja o vídeo com esta declaração polémica no final do artigo.

À margem dos fundos sem rosto, surgem realidades paralelas como a Holdimo, empresa de capitais angolanos que detinha percentagens dos passes de 28 jogadores do Sporting, e os fundos criados pelos próprios clubes. O FC Porto não aderiu a essa lógica, ao contrário de leões e águias.

O Benfica Stars Fund é gerido pela Espírito Santo Fundos de Investimento Mobiliário, do Grupo BES, tal como o Sporting Portugal Fund. Os clubes têm participações nos fundos, tal como investidores privados. Não será esse o tema desta reportagem.

Caso a caso, o Maisfutebol procurou respostas para a questão fundamental: de onde vem o dinheiro dos fundos sediados em paraísos fiscais? Extremamente difícil. Em países como Inglaterra, França e Turquia, a divisão de passes com terceiros não é permitida.

Quality Football Ireland:
Tem 50 por cento dos direitos económicos de Elias e Rinaudo, mais 40 por cento de Diego Rubio e percentagens de alguns jovens do Sporting: João Mário, Carlos Chaby, Cristian Ponde e Tobias Figueiredo. No verão, lucrou com as transferências de Schaars (37,5%) e Wolfswinkel (50%). Em 2011, esteve envolvido com o Sp. Braga. Os minhotos compraram Juan Carlos por 2,5 milhões de euros e venderam o espanhol ao fundo logo depois, pelo menos valor. Nunca jogou por cá. O fundo foi criado pela Creative Artists Agency, uma empresa de representação de desportistas sediada nos Estados Unidos. Peter Kenyon, ex-dirigente do Chelsea, continua a ser apontado como o gestor do fundo, do qual Jorge Mendes assumiu ser consultor. A partir de Dublin, surgiram novos fundos consequentes, I, II, III, IV, este mais tarde rebatizado como Burnaby Investments Ireland Limited. A Creative Artists Agency não respondeu a várias solicitações do Maisfutebol sobre este tema. Nesta terça-feira, o nosso jornal confirmou que um destes fundos moveu um processo contra o Sporting devido a uma dívida de 800 mil euros relativa a Marco Torsiglieri.

Doyen Sports:
75 por cento de Rojo, 50 de Ola John, 35 de Labyad, 33,3 de Defour e Mangala. Envolveu-se ainda com Falcao, Iniesta e mesmo Neymar. É o braço desportivo do Doyen Group, empresa de capitais de risco com interesses na área de petróleo, minérios e gás, para além do ramo imobiliário, em zonas da antiga União Soviética, África e Brasil. Atualmente, é o fundo com maior volume de negócios e maior exposição mediática. O CEO é um empresário português., Nélio Lucas. Em Espanha, agentes como juanma López (do guarda-redes Roberto) e Mariano Aguillar (de Jose António Reyes) trabalham declaradamente com este fundo. Em Portugal, ao que o Maisfutebol apurou, há relações com empresários como Amadeu Paixão ou Carlos Gonçalves.

Gol Football Luxembourg
Tinha 35 por cento do passe de James Rodriguez (transferido para o Mónaco), 10 por cento de Bruma (transferido para o Galatasaray) e adquiriu neste verão  47,5 por cento dos direitos económicos de Diego Reyes por 3,5 milhões de euros. Este fundo está registado, como o nome indica, no Luxemburgo mas tem ligações a um fundo com designação semelhante em Gibraltar. Em 2007, foi associado ao empresário Pini Zahavi. Recentemente, o Sporting alegou à Comissão Arbitral Paritária que o agente israelista estava de facto ligado à Gol Football Luxembourg, que recebeu 10 por cento dos direitos económicos e 100 por cento dos direitos de imagem de Bruma.

Leiston Holdings
50 por cento de Carrillo, 48 por cento de Viola. Pouquíssimos dados sobre este fundo que estará sediado nas Ilhas Virgens Britânicas. Em 2011, surge a única atividade visível. O Leiston Holdings compra o passe de Ronieri ao Criciúma do Brasil. Seguiu para o Vitesse da Holanda, clube ao qual ficou vinculado, mas regressou pouco depois ao seu país para empréstimos a Figueirense e Palmeiras.

Robi Plus
Tem direito a «10 por cento da receita líquida de uma eventual transferência» de Mangala e Defour e comprou os passes de dois jovens do Benfica: Luciano Teixeira e João Mário Fernandes. Ambos saíram do clube encarnado no final da época passada. Maurizio Delmenico é o diretor conhecido da Robi Plus e um elemento próximo de Luciano Donofrio, belga com ligações históricas aos grandes portugueses.

Pearl Design e For Gool Co.
A primeira tem 25 por cento dos direitos económicos de Walter, adquiridos por 2,125 milhões de euros. A segunda fez um adiantamento ao F.C. Porto de dois milhões de euros, no momento de aquisição do jogador. «Como remuneração deste acordo», a For Gool Co. «auferirá 10% de uma eventual mais-valia numa futura transação do jogador», segundo anunciaram os dragões. A Pearl Design Holding tem como diretor Mário Jorge Queiroz e Castro. Nascido em Portugal há 50 anos, o executivo ocupa o cargo em 14 empresas sediadas em Inglaterra e 19 empresas sediadas em Espanha. Por seu turno, a Gool Co. tem Gary Alan Stern como diretor. O inglês de 32 anos desempenha funções similares em onze empresas registadas no país.

Pencilhill Limited
O F.C. Porto comprou 60 por cento de Iturbe por 4 milhões de euros. Vendedores? O Cerro Porteño e a Sociedade Pencilhill Limited. Entretanto, os dragões alienaram 15 por cento dos direitos económicos, sem «resultados signiticativos». A Penchilhill Limited mantém direitos sobre Juan Iturbe e igualmente Paulo Dybala, jovem argentino do Palermo. Este fundo sediado em Inglaterra está ligado ao empresário Gustavo Mascardi.