A futebolista portuguesa mais internacional de sempre, com 145 jogos, aquela que deixou marcas mais duradouras na modalidade, colocou um ponto final na sua carreira. Esta quarta-feira foi o último dia como atleta, mas Carla Couto tem já preparado o futuro e obviamente está ligado ao futebol.

Lesionada, deu o pontapé de saída no jogo entre o Valadares e o Cesarense, relativo à última jornada da segunda fase de manutenção no campeonato nacional feminino. «Foi uma forma bonita das minhas colegas e do clube me homenagear, deixando dar o pontapé de saída. Tudo na vida tem um ciclo e o meu como atleta acabou», contou ao Maisfutebol, sem dramatismos, mas também com a consciência que as emoções chegarão mais tarde:

«Foram 24 anos a jogar futebol. Ainda não caí bem em mim. Quando começarem os jogos na próxima época não vou lá estar e aí se calhar vou sentir um pouco, mas foi uma decisão ponderada e pensada. Mesmo sabendo que poderia fazer mais um ano, a minha opção foi deixar. A certa altura passamos a ser mais uma em campo, por isso acho que neste momento ser mais útil ao futebol feminino nas novas funções».

Carla é embaixadora da seleção feminina e do sindicato de jogadores, pelo que a responsabilidade é enorme. Aos 40 anos tem um mundo de oportunidades à sua frente. «A minha missão com jogadora acabou, mas vou continuar ligada ao futebol. Tenho objetivos e sonhos por realizar, com a certeza de que me vou empenhar tanto como quando era jogadora, agora com a obrigação de olhar para o panorama nacional e não só para o clube que represento. É um até já», frisou.



Feliz com a sua carreira, um dos maiores orgulhos de Carla foi representar a Seleção Nacional. E foram 145 vezes, com 29 golos marcados. Há dois decidiu colocar um ponto final nesta ligação e no fundo também foi ali que decidiu terminar a carreira, ainda que tenha jogado duas épocas no Valadares Gaia. «Quando tomei a decisão de terminar a carreira, foi ponderada, com a consciência de que o ciclo tinha começado a acabar no dia em que abdiquei da seleção», reconhece.

«Estou feliz por tudo o que consegui, conquistei e partilhei. Estou imensamente grata a todos os que se cruzaram comigo», reforça a ex-jogadora, que começou a jogar no Sporting em 1990, passou pelo Trajouce, representou o 1º de Dezembro durante 14 anos, esteve no Futebol Benfica, deu um salto à China (Fhosan Guandzon) e teve a oportunidade de disputar o campeonato italiano pela Lázio.

«Se tiver de olhar para os momentos mais marcantes aquilo que me vem à memória foi o primeiro jogo pela seleção (em 1990). Depois, o íitulo de campeã nacional também é um marco que realça. Foi um momento muito bonito. Tenho recordações boas, de jogos que fizemos, mas o que guardo mais foi as amizades que travei», refere.

O futebol feminino mudou muito nas últimas décadas e hoje o futuro parece mais radiante, mesmo num país obcecado pelo futebol dos homens. «Tudo mudou e ainda bem que assim é. Nota-se uma grande diferença, começa a trabalhar-se mais cedo, existe formação de jogadoras e de treinadores e tudo isso permite que tudo melhore. São inúmeros fatores que nos colocam num patamar bastante aceitável», considera, acrescentando o bom trabalho feito pela federação e pelo sindicato.

O caminho a seguir está delineado: «A federação sabe qual é a lacuna. Falta base de recrutamento e isso resolve-se com maior aposta na formação. Está a ser criado um plano nesse sentido, apostando na formação e criando mais quadros competitivos nas camadas jovens temos potencial para num futuro próximo estar num patamar mais elevado».

Mas talvez esteja na altura de irmos um pouco mais longe. «Na minha opinião um bom resultado da seleção feminina serviria para dar um salto muito grande. Um apuramento para uma fase final despertaria maior atenção. Resta-nos aguardar e dar tempo que as coisas resultem no devido tempo. Temos jogadoras de grande qualidade, todos os anos vão saindo mais jogadoras para o estrangeiro. Temos de dar tempo às pessoas e às instituições para que o futebol feminino se afirme», assegura.



A carreira de Carla Couto foi magnífica e fica para sempre inscrita na história da modalidade em Portugal. Como disse Mónica Jorge um dia: «Não me parece que vá existir outra Carla Couto nos próximos anos. O que Marta é para o futebol brasileiro, a Carla Couto é para os portugueses».

Para além das 145 internacionalizações foram onze títulos de campeã nacional, seis Taças de Portugal e muitas outras distinções individuais e coletivas.

No final da carreira teve a oportunidade de jogar no estrangeiro. «Depois de ter passado pela China (em 2002), onde fui profissional durante três meses, estive um ano em Itália (na Lazio, em 2011/12), o que foi muito enriquecedor. Fez crescer, ter conhecimento de outras realidades», conta, lamentando não o ter feito mais cedo: «Tive medo de arriscar, tive várias propostas no passado e nunca fui. Arrependo-me um pouco de não ter arriscado, mas os tempos eram outros e o futebol feminino não era o que é hoje. De qualquer forma, fico muito feliz por ter aberto portas e por saber que na atualidade muitas colegas tenta a sua sorte lá fora».

«Orgulhosa» do que fez, Carla regressou a Portugal depois da passagem por Itália e terminou a carreira no Valadares-Gaia ao lado de Edite Fernandes, outra das grandes figuras da Seleção. Juntas partilharam muitas alegrias no 1º de Dezembro e na Seleção, só fazia sentido que estivessem uma ao lado da outra quando Carla pendurasse as chuteiras.