No passado fim de semana, um grupo de quatro clubes que disputam o Campeonato Nacional de Futebol de 11 Feminino anunciou em conjunto e publicamente a contestação à criação da Liga Elite conforme está delineado pela Federação Portuguesa de Futebol (FPF).
As
críticas de Ouriense, Albergaria, Futebol Benfica e GD A-dos-Francos tomaram por base o aunciado convite a quatro clubes da Liga profissional masculina para formarem equipas femininas que integrarão esse novo campeonato.
O tema tem contestatários e apoiantes. Falámos com um clube de cada um dos lados da
barricada, não só para saber das suas razões, mas, também, para Ouriense e Cesarense explicarem o que está em causa neste momento para o futebol português no género feminino.
A Liga Elite, de acordo com o Plano Estratégico para o Futebol Feminino (Programa para 2015/16) apresentado publicamente em março (depois de dado a conhecer às Associações) prevê a constituição de uma nova divisão principal com 14 equipas participantes: as quatro convidadas e as atuais 10 do Campeonato Nacional – o futebol feminino português tem nesta altura mais uma divisão (secundária), chamada Campeonato de Promoção.
O Ouriense contesta não só «a forma como o processo foi conduzido» porque «não foram ouvidos os clubes diretamente» como os
convites. «A proposta que mais contestamos e a que levanta mais dúvidas é a entrada direta de clubes numa nova liga anulando um campeonato e criando uma liga de elite», refere ao
Maisfutebol o presidente do emblema bicampeão nacional, João Sousa.
A proposta fala em
até quatro clubes convidados pela FPF e escolhidos preferencialmente de entre os clubes que participem na I Liga (masculina), que tenham o maior número de sócios ou que garantam os mais elevados padrões de formação no âmbito do Futebol. Este é o ponto que «mais dúvidas suscita» num Parecer que o Ouriense fez chegar à FPF «pelos critérios generalistas, que não são objetivos», como reforça o seu presidente.
O peso do impacto financeiro
João Sousa conclui que «o objetivo é chamar os três grandes» do futebol português e que o que vai acontecer é «desvirtuar a verdade desportiva». «É injusto para o campeonato de promoção», diz o líder do Ouriense. O Cesarense tem uma posição oposta. «O que falta ao futebol feminino é o apoio de marcas e patrocinadores que tragam mais receita e outras fontes de financiamento, que só se fazem com entrada dos grandes», afirma ao
Maisfutebol Pedro Ribeiro.
O Cesarense está a lutar pela manutenção no campeonato principal e uma possível descida de divisão poderia ser
superada por um eventual convite para ser um dos 10 dos atuais clubes do Campeonato Nacional a fazer parte de uma Liga Elite que começasse em 2015/16. «A descida de divisão não é o fundamental da nossa tomada de decisão. Estamos na primeira divisão e não conseguimos nenhum tipo de apoio», garante Pedro Ribeiro.
«Com jogos na Benfica TV ou no Porto Canal consegue-se alguma coisa: aqui não há nada de atrativo», aponta o líder do Cesarense contando que, quando recebeu a organização do jogo Portugal-Suíça «a transmissão televisiva conseguiu logo apoios que não teria se não houvesse televisão: os parceiros querem retorno do investimento». João Sousa discorda frisando que «a rentabilidade no futebol feminino é utópica».
O Ouriense dispensa até os apoios da FPF, como, por exemplo, o pagamento das viagens: «Não precisamos de subsídio, precisamos que nos deixem trabalhar. Mas não conseguimos se mudarem as regras do jogo. Nem eu nem qualquer diretor responsável.»
O presidente do bicampeão confessa as incertezas que vive: «Estamos a duas jornadas do fim e não sabemos o modelo do campeonato do ano que vem. E se não houver [Liga Elite], vai haver a mesma instabilidade, podemos fazer investimento? Eu não posso fazer avais pessoais sem saber se amanhã mudam as regras do jogo...» Já Pedro Ribeiro garante que o Cesarense «não conseguia estar na primeira divisão se não tivesse as deslocações pagas».
«O que se pretende é que não sejamos nós a colocar obstáculos à evolução do futebol», diz Pedro Ribeiro considerando que a contestação «é um querer olhar só para o seu umbigo». «Substancio [a proposta da FPF] no que acho que são as mais valias para o meu clube. Se tiver esses clubes grandes a jogarem aqui, quanto mais é que eu consigo trazer?». O presidente do Cesarense responde à sua própria pergunta: «Para o geral do futebol feminino esta liga só vai trazer mais valias.»
O peso do impacto desportivo
Já o homólogo do Ouriense contrapõe a sua posição com a perda de atletas que os atuais clubes vão sofrer com a eventual entrada dos emblemas (muito) mais poderosos financeiramente que levarão as atletas dos outros clubes. «Se os quatro clubes [grandes] entrarem precisam de 100 jogadoras [para quatro planteis médios de 25 futebolistas].
«Mesmo em cenário ideal, se levarem sete ou oito [jogadoras] fica muito difícil», diz João Sousa reforçado pelo Parecer do Ouriense na «consequente possível desistência dos clubes que atualmente participam e competem pelo campeonato nacional». João Sousa acrescenta ainda outra situação: «Se forem buscar três ou quatro a um clube da divisão de promoção, o clube fecha.»
Já o Cesarense «pretende ser um clube de formação, com outros dinamismos». «É a nossa vertente», diz Pedro Ribeiro notando que «o objetivo é ter atletas a entrarem na modalidade». «Eu nunca vou lutar para ser campeão. Estar na primeira divisão seria o ideal, mas o projeto para o clube é ter miúdas a entrar», garante o presidente do Cesarense referindo que, quanto a quem quer jogar para ganhar títulos, «eles próprios terão de se blindar em relação a essas saídas».
Pedro Ribeiro faz questão de lembrar que «países vizinhos como a França só conseguiram dar o salto com a entrada do PSG e do Lyon no futebol feminino». «Tiveram possibilidade de ir buscar jogadoras a nível internacional», o que o dirigente vê como bom para o futebol feminino nacional: «Se conseguirmos é bom. Tivemos aqui uma jogadora norueguesa que estava cá por Erasmus. Ajudou imenso as nossas atletas a treinar, porque elas, lá, trabalham de foram diferente.»
Já o presidente do Ouriense diz que «não é o mediatismo que é importante para o futebol feminino» e, citando a European Club Association contra a entrada de
grandes no quadro, afirma que «
a entrada de clubes poderosos poderá matar a Liga dos Campeões.»
Alternativas propostas
O presidente do Cesarense garante que as atletas do seu clube «vão gostar» da Liga de Elite porque «a jogar com as melhores motivam-se muito mais». «As pessoas que só veem o seu objetivo, não veem o futebol feminino no seu todo», aponta Pedro Ribeiro: «Se tenho o futebol feminino em bom nível, vou ter aqui mais atletas. Se mudarem de equipa para o Porto ou para o Benfica vou ter aqui mais atletas a querer entrar e mais sucesso para o meu projeto.»
João Sousa afirma que a defesa
desta Liga Elite é feita por «quem não conhece a realidade». «Está-se a começar a casa pelo telhado», diz o dirigente explicando que «a solução seria aumentar a quantidade [de praticantes] com outras medidas».
E o presidente do Ouriense deixa alguns pontos já avançados à FPF: «Todas as equipas do distrital masculino terem uma equipa feminina, que não pagaria taxa de jogo: seriam 36.400 euros que a Associação de Santarém não receberia, mas haveria mais 210 jogadoras.»
E contra a entrada de equipas por convite na principal divisão do futebol feminino, João Sousa defende medidas ainda mais estruturais: «E por que não, daqui a dois ou três anos, as equipas da Liga [masculina] serem obrigadas a ter futebol feminino. E depois as da II Liga?»
Futebol Feminino
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2 abr 2015, 10:28
Liga Elite: o duelo de «prós» e «contras» está na mesa
O debate sobre o principal campeonato do futebol feminino em Portugal está aceso. Ouvimos quem defende o modelo avançado pela federação e quem se opõe. Razões divergentes, mas com igualável convicção
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