O rescaldo do Clássico faz-se ao ritmo do bloqueio. Vítor Pereira queixou-se da forma como os jogadores do Benfica abordam as bolas paradas, acusando-os de fazer sempre falta. Jorge Jesus negou qualquer estratégia. «O Benfica não faz bloqueios, os meus jogadores não treinam isso. Não há aqui nada de estratégico», disse o técnico no final do jogo.

Será mesmo? O Maisfutebol falou com dois defesas que sofreram golos de bola parada do Benfica esta época: Gaspar, do Rio Ave, e Cláudio, do Gil Vicente. Ambos reconheceram que tiveram de lidar com lances semelhantes aos que Vítor Pereira se queixou. Ambos ressalvaram que o Benfica não é a única equipa a fazê-lo.

Ainda assim, Gaspar, que foi treinado por Jorge Jesus no Belenenses, contesta a versão do técnico encarnado. E lembra que não é de agora que se preocupa com situações do género.

«Treinávamos bloqueios no Belenenses. O treinador indicava, por assim dizer, o elo mais fraco do adversário e apontávamos para aí. Por isso, não há de ser agora no Benfica que vão deixar de treinar. Aliás, basta ver os jogos. Não é algo que acontece uma ou duas vezes. São duzentas, trezentas. Não digam que não é estratégia, porque é. Se querem atirar areia para os olhos...», afirma o central.

Gaspar confessa, de resto, dúvidas quanto à legalidade deste tipo de lances. «Na última reunião que houve com os árbitros isto foi discutido e disseram que era ilegal. Admito que para um árbitro seja difícil de ver, mas talvez tenham de estar mais atentos. Isto é algo que se faz há anos, mas vai ser mais mediático depois deste jogo», antevê.

Cláudio é da mesma opinião: «Bloqueios sempre existiram». Mas depois separa as águas: «Cada lance é um lance. Uma coisa é agarrar ou impedir um jogador de passar, outra coisa é ficar parado na área. Aí acho que não há falta nenhuma.»

Como Jesus «bloqueava» o...Benfica

Gaspar e Cláudio também estão de acordo noutro ponto: esta ação não é nova no Benfica. «Se reparar, há um ano ou dois, sobretudo nas bolas paradas defensivas, os jogadores até davam as mãos para formar uma corrente», lembra Gaspar. Cláudio usa o mesmo exemplo: «Eles faziam essa corrente mas não o podem usar para impedir que um jogador passe. Aí é falta.»

O central do Rio Ave dá, depois, um exemplo curioso. A forma como Jorge Jesus preparava os bloqueios nos jogos contra...o Benfica.

«Era muito simples. O Léo era o defesa mais baixo. Fazíamos o bloqueio entre ele e o central do lado esquerdo. Depois a bola era colocada ao segundo poste. Basta um toque ligeiro para desviar o adversário da jogada.»

Todos os treinadores que Gaspar teve treinavam este tipo de lances. Nenhum como Jorge Jesus. «Era o mais meticuloso de todos, sem dúvida. Chegava ao ponto de parar o exercício e corrigir o posicionamento de um jogador que estava um metro ao lado do sítio que ele queria», explica.

Gaspar assume: «Já fiz bloqueios»

Cláudio não separa o Benfica das restantes equipas do campeonato neste tipo de ações. «Talvez façam por estratégia, mas não notei grandes diferenças», garante. Gaspar pensa da mesma forma, mas diz que são os encarnados que mais vezes usam esta estratégia nestes lances.

E pede que os árbitros estejam atentos: «Se marcam obstruções em vários lances, porque não marcar nestes? Há lances em que os jogadores estão de costas para a bola. Não me venham dizer que têm intenção de a discutir.»

E o capitão do Rio Ave assume, também, que já «bloqueou». «No jogo com o Sporting, vi que não chegava a uma bola, deixei-me ficar parado e ela seguiu para o João Tomás, que por acaso falhou. Mas foi algo de momento, que me lembrei de fazer. Não era estratégia», garante.

Para os dois fica uma certeza: tudo isto é útil para ganhar no futebol moderno. «São estes detalhes que decidem», diz Cláudio. «Ontem houve dois golos de bola parada. A França foi campeã do mundo com dois golos de bola parada. Quem não treina isto está muito atrás», conclui Gaspar.