O eixo Lumiar-Campo Grande foi sempre a casa do Sporting. Desde 1906, quando a zona ainda era espaço aberto, reservado para quintas dos fidalgos de Lisboa. A história começou assim, quando o Visconde de Alvalade cedeu os seus terrenos para que fosse instalado o campo do novo clube do seu neto, José Holtremann Roquette, também conhecido por José Alvalade. O mesmo que deu o nome ao estádio que vai agora abaixo.

O Sporting nasceu de uma discussão entre membros do Campo Grande Football Club. Zangados, José Alvalade e um grupo de amigos decidiram fazer um clube novo. Diz a lenda que José Alvalade saiu zangado de uma reunião, mais ou menos com estas palavras, reproduzidas no livro História do Futebol em Lisboa: «Vou ter com o meu avôzinho e ele me dará dinheiro para fazer outro clube!»

Assim foi. Alfredo Augusto das Neves Holtremann, que o rei D. Carlos fez Visconde de Alvalade, doou a parte de leão dos seus terrenos da Quinta das Mouras, a outra parte foi arrendada a D. Beatriz Poche Castello. As quotas dos sócios fundadores ajudaram a construir o parque de jogos, com a ajuda adicional do eterno benemérito Visconde de Alvalade. Era preciso muito dinheiro, só o nivelamento do campo custava 200 mil reis, uma fortuna. O Visconde de Alvalade seria o primeiro presidente de um clube que sonhou grande, «tão grande como os maiores da Europa».

52 contos para arranjar o Campo Grande

Os «leões» ainda mudaram algumas vezes de campo, mas sempre sem sair da zona do Lumiar. Depois de uma passagem pelo Stadium de Lisboa, bem ali ao lado das Mouras, mudam-se em 1916 para as instalações do Lisboa Football Club, ao Campo Grande. O Sporting fez obras de melhoramento no local, gastou 52800 escudos na construção de arquibancadas e deu nova dimensão ao Estádio do Campo Grande, que seria a sua casa durante 20 anos.

Mais tarde foi também casa do Benfica, forçado a deixar as Amoreiras por força da construção do viaduto Duarte Pacheco. Até 1954, durante mais de 10 anos, os velhos rivais foram vizinhos, os «encarnados» num estádio de cuja precariedade os «leões» não se cansavam de troçar. Chamavam-lhe estância de madeiras, por causa do material de que eram feitas as bancadas.

Os «leões» planeavam entretanto construir o seu novo campo. O espaço seria o mesmo do Estádio do Lumiar, o relvado que lá está hoje é aliás o mesmo de então, mas teria bancadas novas e um ambiente moderno. Anselmo Fernandez, que era arquitecto e foi o treinador que liderou a equipa na conquista da Taça das Taças em 1964, projectou o espaço.

As sessões de «picaretadas» para ajudar a construir Alvalade

O resto fez-se com a boa vontade e o suor dos adeptos. Organizaram-se espectáculos de angariação de fundos, promoveram-se sessões de «picaretadas». Quem quisesse ia dar umas marretadas nas paredes do velho recinto, de caminho pagava o que pudesse.

Já que o estádio seria novo, os «leões» decidiram rebaptizá-lo e deram-lhe o nome de José Alvalade - o neto do visconde, por sua vez avô de José Roquette, que foi presidente do clube entre 1996 e 2000.

O esforço, dedicação e devoção dos sportinguistas resultou num estádio completamente transformado. Do anterior recinto ficou o peão ¿ que seria mais tarde substituído pela bancada nova ¿ e pouco mais.

A 10 de Junho de 1956, comemorando o cinquentenário do Sporting, é finalmente inaugurado o novo Estádio José Alvalade. Um recinto imponente e completo, com pista de atletismo e ciclismo. A vocação eclética é selada com um pedaço de terra trazido de Olímpia, na Grécia, que chegou a Alvalade escoltada por motards do Vespas Clube de Portugal.

Alvalade apresenta-se com pompa e circunstância, perante 60 mil espectadores, entre os quais o chefe de Estado, Craveiro Lopes. Desfilaram 1500 atletas do Sporting, estiveram representadas 31 federações e associações, 200 clubes e 71 filiais. Jogou-se futebol, claro, o Vasco da Gama do Brasil foi o convidado, venceu por 3-2, o resultado não ensombrou a festa dos «leões».

Desde esse dia Alvalade viveu muitas mudanças, até ao fim. Neste sábado recebe um último concerto, depois prossegue a demolição. O futuro, sob a forma de um estádio ultra-moderno, está mesmo ali ao lado.