A forma atribulada como subiu ao palanque para celebrar a vitória eleitoral, em março de 2011, perante a contestação dos adeptos da lista liderada por Bruno Carvalho, pressagiava tempos difíceis para Godinho Lopes, na presidência do Sporting. Mas talvez nem os seus críticos mais aguerridos pudessem prever dois anos marcados por tantas percalços e mudanças de rumo. Com ou sem recandidatura do presidente demissionário, as novas eleições, marcadas para 23 de março, viram a página num ciclo que acentuou a perda de terreno para os dois rivais históricos, Benfica e F.C. Porto, tanto no plano desportivo, como no económico.

Os números marcantes

Ainda no último domingo, em entrevista à TVI, o dirigente leonino valorizava os pontos positivos do seu mandato, destacando os «mais de 700 títulos» conquistados pelas modalidades. Mas Godinho Lopes sabia o óbvio desde o primeiro dia: é o futebol a determinar o sucesso ou insucesso dos mandatos presidenciais.

No caso da sua Direção, as bandeiras usadas na campanha eleitoral (regressos de Carlos Freitas e Luís Duque para o comando do futebol, Domingos Paciência como o treinador eleito) mantiveram a chama acesa até ao fim de novembro de 2011, mas perderam força depois de a derrota no «derby» da Luz ter interrompido uma sequência de dez vitórias. A partir daí foi sempre a descer.

No início de 2012, já a Direção estava minada por divisões internas, que levaram à saída do vice-presidente Carlos Barbosa, em fevereiro. Domingos Paciência sairia nesse mês, sendo substituído por Ricardo Sá Pinto, um nome com crédito junto das claques, e com trabalho promissor na equipa júnior. O novo técnico manteve um breve estado de graça, que acabou com a eliminação nas meias-finais da Liga Europa e, principalmente, a derrota na final da Taça, com a Académica.

O falhanço do acesso à Liga dos Campeões completa o quadro de fiasco desportivo, agravado pela turbulência interna. Um nome surge no centro do vulcão: o do vice-presidente Paulo Pereira Cristóvão, cuja ascensão na estrutura é travada pelo envolvimento no caso Cardinal, tornado público em abril. A sua saída, dois meses mais tarde, marca já um ponto de degradação acelerada na estrutura leonina.

No início de outubro, com a equipa em queda livre na Liga e humilhada na Europa, Sá Pinto é sacrificado a uma derrota pesada na Hungria. Três semanas depois, ainda com o processo de sucessão em aberto e com Oceano a dar a cara na travessia do deserto, saem Luís Duque e Carlos Freitas, antes de Vercauteren assumir como novo treinador, em novembro.

O objetivo era modesto: tirar a equipa da cauda da tabela e aguentar o barco até final da época. Nem isso é conseguido, e a chegada de Jesualdo Ferreira, em dezembro, pressagia mais uma mudança de orientação, consumada no início de janeiro, já sem a possibilidade de títulos no horizonte.

Durante o mercado de inverno, o Sporting já não esconde as dificuldades de tesouraria, nem a necessidade de aliviar uma folha salarial incomportável para o volume de receitas. O clima de desconfiança entre a direção e a mesa da Assembleia Geral torna impossível a colaboração institucional, e a última semana de janeiro precipita o fim.

Godinho responsabiliza os adversários internos pelos sucessivos fiascos no mercado de contratações, e dois dias depois a equipa sofre a primeira derrota na era Jesualdo.

A Assembleia Geral, marcada para 9 de fevereiro, contra a vontade da Direção, ameaça uma destituição com mais incidentes e polémicas. Godinho Lopes dá o passo que lhe restava para evitar a AG, negociando a demissão coletiva dos órgãos sociais. Ganha, assim, mais 45 dias para prosseguir a reestruturação da dívida junto da banca. O processo volta à casa de partida, dois anos depois.