A 'World Cup Experts Network' reúne órgãos de comunicação social de vários pontos do planeta para lhe apresentar a melhor informação sobre as 32 seleções que vão disputar o Campeonato do Mundo. O Maisfutebol representa Portugal nesta iniciativa do prestigiado jornal Guardian. Leia os perfis completos das seleções que participarão no torneio:

Autores dos textos: Juan Fernando GuerreroAlberto GuarandaMayra Bayas
Parceiro oficial no Equador: Ecuagoal
Revisão: Berta Rodrigues


Reinaldo Rueda tem uma missão para este Campeonato do Mundo e é uma missão muito difícil. Depois de cair na fase de grupos quando era selecionador das Honduras na África do Sul, em 2010, o treinador tem uma segunda oportunidade de se tornar uma das surpresas.

Com base no 4x4x2 inicial e com a opção de um 4x5x1 para explorar os flancos e apenas um ponta de lança, Rueda vai tentar chegar desta vez às fases a eliminar.

O elo que falta no Equador é Christian «Chucho» Benítez, o antigo avançado do Birmingham City que morreu no verão passado, aos 27 anos. A sua morte foi um brutal golpe emocional para a seleção, bem como uma perda para a equipa. Chucho jogou no Mundial 2006 e a sua experiência e velocidade eram uma grande mais-valia para o Equador.

Um dos jogadores que pode destacar-se no Brasil é Enner Valencia. O médio direito de 25 anos que joga nos mexicanos do Pachuca avançou para o ataque nos últimos cinco jogos, quatro de qualificação e um particular. Nessa nova posição ele deu muito bons sinais, marcou dois golos e apareceu como uma possível solução para o enorme buraco deixado por Benítez. 

Mas a grande questão agora é quem fará dupla com Enner Valencia na frente. O antigo jogador do Manchester City (e do Sporting) Felipe Caicedo parece ter a confiança de Rueda, apesar de uma época irregular, primeiro no Lokomotiv Moscovo e depois no Al Jazira, nos Emiratos Árabes Unidos. A falta de outro jogador com a experiência necessária – Caicedo tem 15 golos marcados em 48 internacionalizações, faz dele a única opção no ataque.

Há dois médios organizadores de jogo na equipa de Rueda, o capitão Antonio Valencia e Jefferson Montero. Ambos são chave para o jogo ofensivo do Equador. A velocidade e experiência fazem do jogador do Manchester United tão valioso defensivamente como nas movimentações de ataque. Montero, como Valência no United, teve uma época difícil no clube (o Morelia, no México), mas a sua presença no onze titular não é questionável. Está em vantagem sobre Fidel Martínez, João Rojas ou Renato Ibarra, do Vitesse Arnhem.

Uma das forças do Equador é o seu meio-campo. Jogadores como o perigoso médio do Dínamo Moscovo Christian Noboa ou Segundo Castillo têm muita experiência, podem passar da defesa ao ataque rapidamente e têm ambos bom sentido de baliza.

O principal problema do Equador, no entanto, é na defesa. Mesmo não tendo sofrido muitos golos na qualificação (16 golos em 16 jogos), é preciso lembrar que Rueda usou oito jogadores no centro da defesa à procura da combinação certa. A sua melhor combinação foi a dupla Frickson Erazo/Jayro Campos. Mas Campos sofreu uma lesão grave e não estará no Brasil, o que forçou Rueda a procurar uma alternativa. Erazo é muitas vezes suplente no seu clube, o Flamengo, do Brasil, enquanto os jogadores que serão as outras opções, Jorge Guagua e Gabriel Achilier, não estão habituados a jogar a este nível pelo seu clube no Equador, o Emelec.

A defesa completa-se com os laterais Juan Carlos Paredes e o veterano Walter Ayoví. É uma zona onde o Equador tem tido grandes problemas e encurtar espaços será vital frente a equipas como a Suíça e a França, já para não falar da velocidade e força física das Honduras.

O Equador deve alinhar assim frente à Suíça, a 15 de junho: Máximo Banguera na baliza; Juan Carlos Paredes, Jorge Guagua, Frickson Erazo e Walter Ayoví na defesa; Christian Noboa, Segundo Castillo, Jefferson Montero e Antonio Valencia no meio-campo; Enner Valência como avançado-centro, junto com Felipe Caicedo.
Rueda tem consciência de que em termos individuais o Equador pode não parecer uma ameaça, mas como equipa pode ser forte e isso pode ser mais determinante num Mundial que se joga no seu próprio continente. Combinem o potencial da equipa e o elemento surpresa e não se pode excluir nenhum cenário.

Que jogador pode surpreender no Campeonato do Mundo?

Definitivamente, Enner Valencia. O avançado tornou-se uma figura crucial nos últimos meses e é o melhor marcador fora do Equador, depois de as suas boas exibições no Emelec terem aberto caminho para que assinasse pelo Pachuca. No primeiro ano, marcou 12 golos pelo clube mexicano. A sua velocidade é chave nos duelos com os defesas. Depois de uma época tão boa no México um bom Campeonato do Mundo pode catapultá-lo para uma liga mais competitiva. Depois deste Mundial pode valer bem mais do que os cinco milhões de dólares (3,6 milhões de euros) que o Pachuca pagou por ele no início deste ano.

E que jogador pode ser uma desilusão?

Felipe Caicedo. Se o Equador conseguir bons resultados passará despercebido, mas uma eliminação prematura pode levar a que de alguma forma o responsabilizem. As suas exibições com o Equador têm perdido qualidade e a mudança para o Al-Jazira gerou reações negativas na imprensa, dado o nível de competição do campeonato dos Emiratos Árabes Unidos.

Qual é a expectativa realista para a seleção no Mundial?

Passar a fase de grupos. O primeiro jogo frente à Suíça vai determinar se o Equador tem o potencial para lutar por um lugar. Uma vitória frente a um dos mais fortes rivais europeus garantirá a vantagem necessária para procurar o apuramento direto frente às Honduras na segunda jornada. Chegar ao último jogo com a França a precisar ainda de pontos não é o cenário ideal.

A equipa agora liderada por Rueda tem a experiência da Alemanha em 2006, quando derrotou a Polónia no primeiro jogo e venceu a Costa Rica no segundo, o que significou que puderam dar-se ao luxo de perder com a Alemanha no último jogo do grupo e chegar aos oitavos de final, onde perderam por pouco frente à Inglaterra, com um golo de David Beckham.



Curiosidades e segredos da seleção

Fidel Martínez
Joga atualmente pelo Xolos Tijuana, no México, mas começou a carreira na sua província natal de Sucumbios, que é a mesma de Antonio Valencia. Martínez começou por ser chamado para a seleção sub-20 nos Jogos Pan-Americanos e as suas exibições despertaram a atenção do Cruzeiro, que o levou para o Brasil em 2007. No entanto, não se adaptou e regressou a casa, para jogar pelo Deportivo Quito, onde se tornou estrela e melhor marcador. Por causa do corte de cabelo, Martínez é conhecido como o «Neymar do Equador». Gosta de pintar o cabelo de cores diferentes e de formas vistosas. Outra curiosidade sobre este jogador: esperem movimentos de hip-hop, talvez até rap, nas suas celebrações de golo. Uma vez até levou um computador para o campo para festejar. É um dos jogadores favoritos dos adeptos, talvez porque nas férias nunca deixa de ir ao Equador e comprar milhares de brinquedos para dar a crianças da sua terra natal.

Enner Valencia
O jogador do Pachuca, do México, teve de superar muitas dificuldades para chegar aqui. Antes da sua afirmação como futebolista profissional no Emelec, Valencia tinha dificuldades até para comprar um par de botas. Em criança, ordenhava vacas e ia vender o leite junto com a família. Acabou por conseguir juntar dinheiro suficiente para comprar as suas próprias botas. Agora é um jogador de primeiro plano no clube e no país e recebe tantos pares de botas que não sabe o que fazer com elas.

Jefferson Montero
O jogador do Morelia, no México, também tem origens muito humildes. Em criança, quando crescia em Babahoyo, na província de Los Ríos, a família passou a chamar-lhe «Yepe», porque ele não conseguia dizer o seu nome. A sua mãe, Mercedes Vite, tinha pouco dinheiro e costumava lavar roupa da vizinhança para ganhar algum dinheiro, enquanto o pai, Antonio, recorria a empréstimos na quinta onde trabalhava. Montero começou a guardar dinheiro num porquinho-mealheiro, até que a família se mudou para outra cidade, onde ele acabou por chamar a atenção do Emelec, um dos principais clubes no Equador.

Christian Noboa
O jogador de 29 anos joga atualmente pelo Dínamo Moscovo, na Rússia, mas a sua carreira começou no Emelec. No início Noboa não tinha lugar na equipa, via a maior parte dos jogos a partir do banco e chegou a estar perto de sair do clube para jogar na Serie B, em Itália. No entanto, bastou uma oportunidade para jogar de início e rapidamente ganhou a confiança do treinador. EM dezembro de 2006 foi chamado à seleção do Equador para um particular na Rússia. Poucos dias antes tinha recebido uma chamada do treinador do Rubin Kazan, que lhe disse que estava no Equador com a intenção de comprar Christian Benítez, mas que tudo tinha mudado quando viu Noboa jogar. Por isso marcou uma reunião na Rússia e, quando chegou para o particular, uma senhora russa acompanhou Noboa à reunião. Noboa contou que estava um pouco assustado na altura, mas um representante do Rubin apresentou-lhe um contrato e ele não hesitou em aceitá-lo e assinar. Apenas três dias mais tarde estava na Rússia para o estágio de Primavera. Depois de vários anos no Rubin, transferiu-se para o Dínamo Moscovo, onde se tornou um dos jogadores de referência. Noboa acredita que deve a sua longa carreira na Rússia ao facto de ter casado com uma mulher russa, com quem tem dois filhos. Uma enorme diferença em relação ao primeiro dia em que pisou solo russo, quando brincou e até comeu neve, acabando de cama uma semana com gripe.

Perfil de uma figura da seleção: Felipe Caicedo



A lágrima tatuada sob o olho esquerdo reflete algumas dificuldades por que Felipe Salvador Caicedo Corozo passou durante a sua vida, principalmente na juventude; mas ele também diz que, quando se vê ao espelho, ela não o deixa esquecer-se de onde veio.

Em criança jogava futebol com os amigos nas ruas de Guasmo, um bairro pobre e perigoso no sul de Guayaquil, no Equador. Jogavam descalços, com bolas velhas, mas sempre com o grande sonho de se tornarem futebolistas profissionais.

Aos nove anos começou a jogar pelo Rocafuerte FC e – depois de se ter habituado a jogar com botas de futebol – evoluiu rapidamente e depressa se destacou entre os jogadores das equipas jovens. A prova disso foi a chamada aos sub-17 do Equador e as boas exibições no Mundial, que despertaram o interesse de alguns grandes clubes da Europa.

Quando ele tinha 16 anos, os franceses do Lyon pareciam os mais interessados. Estava quase tudo tratado, mas entretanto apareceram os suíços do Basileia e contrataram mesmo o jovem «Felipao».

Deixar o Equador foi uma decisão difícil para ele mas, depois de receber o apoio da sua família, fez as malas e deu início ao seu sonho europeu. Os primeiros dias e meses na Suíça foram muito difíceis, longe da família e ainda não adaptado à nova vida e à cultura de um país diferente. Mas com esforço e sacrifício gradualmente conseguiu acumular minutos nos azuis e brancos da Suíça, por quem acabou por marcar 16 golos em 44 jogos.

Durante a sua passagem pela Suíça também aproveitou a oportunidade para evoluir fora do futebol: estudou e formou-se em ciência informática. Depois de dois anos no Basileia, o Manchester City interessou-se por ele e pagou sete milhões de dólares (5,1 milhões de euros) pela sua transferência, tornando Caicedo o jogador mais caro da história do futebol do Equador.

Em Inglaterra jogou pelo City em 33 jogos e marcou oito vezes, mas foi perdendo a confiança do treinador, Roberto Mancini, e foi cedido por empréstimo ao Sporting. Não se afirmou em Portugal e em janeiro de 2010 voltou a ser emprestado, desta vez aos espanhóis do Málaga, onde marcou quatro golos em 18 jogos. O seu melhor período aconteceu na época seguinte, quando jogou por empréstimo no Levante, onde foi o melhor marcador, com 14 golos apontados na época 2010/11.

No Levante tornou-se um ídolo dos adeptos e uma estrela da equipa, ganhando também um prémio de melhor estreante na Liga espanhola. Apesar disso, o Levante não podia pagar ao Manchester City o preço de uma transferência definitiva e em vez disso voltou a mudar, agora para o Lokomotiv Moscovo. Depois de duas épocas na Rússia, onde marcou 11 golos em 52 jogos, o muito viajado avançado de 25 anos joga agora no Al Jazira, nos Emiratos Árabes Unidos.

Quanto à seleção, Caicedo estreou-se em 2005 num particular frente à Itália, quando tinha apenas 16 anos. Quatro anos mais tarde deu nas vistas na Copa América na Argentina, onde marcou dois golos em três jogos. Mas depois disso esteve ausente da Tri por um ano.

O motivo para a ausência foi uma alegada má relação com o treinador, Reinaldo Rueda, que sentia que Caicedo prejudicava o bom ambiente da equipa. No entanto, algumas boas exibições de Caicedo no Lokomotiv levaram os adeptos a pedir o seu regresso. Acabou por ser chamado para jogar a qualificação para o Brasil. Foi uma decisão que valeu a pena, porque Caicedo foi o melhor marcador do Equador, com sete golos.

Caicedo nunca se esquece de onde nasceu e foi por isso que criou uma fundação chamada «Felipao» que ajuda as crianças de Guayaquil, especialmente no seu antigo bairro. Quando visita a sua terra é visto com frequência em eventos de beneficência.

É adepto do Barcelona SC, um dos principais clubes do Equador, e já disse várias vezes que o seu sonho é vir um dia a jogar pelo «ídolo do Equador». Mas também é um empreendedor, que lançou recentemente a sua própria marca de roupa, chamada «Felipao», e recorre frequentemente aos companheiros de equipa como modelos.

Caicedo já admitiu que o seu filme favorito é a série Rocky, que revê antes dos jogos, porque o inspiram. Não a ser agressivo no campo, garante, ele que prefere concentrar-se no que faz melhor: golos.

No Brasil, Felipe Caicedo vai jogar o seu primeiro Mundial e a falta de avançados, depois da morte de Christian «Chucho» Benítez, significa que vai liderar o ataque da Tri – e desejavelmente marcar os golos que possam ajudar o Equador a fazer história.