O golo que decidiu o clássico de domingo não é propriamente uma novidade para Seferovic: o avançado está habituado, um bocadinho como o pássaro da mitologia grega, a renascer das próprias cinzas. Sobretudo quando veste uma camisola com a águia ao peito: o que faz todo o sentido.

Mas já lá vamos.

Antes de mais convém começar pelo início. É provável que os seguidores mais fiéis do futebol tenham ouvido falar pela primeira vez de Seferovic em 2009, quando o avançado foi o melhor marcador do Mundial sub-17, realizado na Nigéria. Os cinco golos que apontou foram fundamentais para conduzir a Suíça ao título de campeã mundial.

A partir daí o jogador ficou nos cadernos de apontamentos dos grandes clubes europeus.

Nascido na Suíça, mas filho de pais bósnios que emigraram para a pequena localidade de Sursee no final dos anos 80, Seferovic começou a jogar no clube da terra, o FC Sursee, com sete anos.

O pai Hamza foi o principal impulsionador da carreira do miúdo. Desde criança, aliás, que o levava para o campo de futebol da escola local, para o colocar a finalizar bolas que ele próprio cruzava.

Para o premiar pelo esforço, o pai começou a pagar-lhe cinco euros por cada golo que marcava nas escolinhas do FC Sursee. Houve um jogo em que fez oito golos e a brincadeira saiu cara. Mas se havia dinheiro que o progenitor tinha prazer em gastar, era seguramente este.

Seferovic é filho de uma família de operários – o pai Hamza trabalha numa metalúrgica e a mãe Sefika numa empresa têxtil -, que tinha saído da Bósnia à procura de melhores condições de vida.

Apesar de ser uma casa de gente humilde, o jovem teve sempre os parentes por perto. Sobretudo o pai, que juntava dinheiro e metia dias de folga, que compensava nas férias, para poder acompanhar o filho onde ele jogasse.

O investimento teve retorno e Seferovic deu nas vistas. Aos 12 anos, por isso, saltou para o Lucerna, ali pertinho de casa, ainda na parte alemã. Dois anos depois, deu um novo salto e assinou pelo Grasshoppers, de Zurique, ainda na parte alemã. Foi no Grasshoppers que passou a sénior e que se estreou a nível profissional, antes de brilhar no tal Mundial sub-17 com cinco golos.

A Fiorentina ganhou a corrida pelo jovem jogador e Seferovic, então com 18 anos, mudou-se para o exigente campeonato italiano. O sonho de criança, alimentado por um poster de Cristiano Ronaldo no quarto, deixava de ser uma ilusão: ganhava forma e justificava todos os sacrifícios.

A vida em Itália não correu, porém, de feição.

O suíço era apenas um jovem, demasiado novo para a Série A. Por isso acabou por ser cedido ao Neuchatel Xamax, ao Lecce e ao Novara. Neste último foi colega de Bruno Fernandes, aliás.

Seferovic tinha 21 anos e fez 10 golos em 19 jogos. O que justificou a transferência para a Real Sociedad. Espanha, no entanto, voltou a não ser uma aventura feliz. Por isso durou apenas um ano. Na época seguinte foi transferido para o Eintracht Frankfurt, para mudar a carreira, e a vida.

Antes de mais porque encontrou Amina Bakic, a namorada que se tornou a cara metade. A história dos dois é curiosa. Os pais são naturais, em ambos os casos, de Sanski Most, na Bósnia, e deixaram o país no final dos anos 80 para procurar melhores condições de vida no estrangeiro.

Os pais de Seferovic viajaram para Sursee, como já se disse, os pais de Amina seguiram para Frankfurt, na Alemanha. Os dois nunca se tinham visto, mas sabiam da existência um do outro através de conversas em família. Quando Seferovic assinou pelo Eintracht, puderam por fim encontrar-se. Foi amor à primeira vista que dura até hoje: os dois vivem em Lisboa, aliás.

Para lá do aspeto familiar, também a carreira ganhou um novo impulso. No clube que tem uma águia como símbolo, Seferovic fez 106 jogos, apontou 17 golos, justificou a chamada ao mundial 2014 – o primeiro da carreira – e a cobiça do Benfica, que o contratou a custo zero.

Nesta altura vale a pena dizer que o avançado tanto podia representar a seleção suíça como a seleção bósnia. Chegou a dizer que preferia fazê-lo pela segunda, em homenagem à história dos pais. A Suíça fez, no entanto, a primeira convocatória e ficou então com o jovem avançado.

Seferovic mantém, porém, uma ligação forte à Bósnia, que visita todos os anos pelo menos uma vez. Também ajuda o Podgrmec, o clube da cidade dos pais, com dinheiro e equipamentos.

Ora regressando à carreira do avançado de 26 anos, o resto já se sabe: no Benfica teve um enorme impacto logo de início, mas acabou por cair de produção. Esteve quase a sair no último verão, mas acabou por ficar. As lesões de Castillo, Ferreyra e Jonas lançaram-no para a titularidade, e respondeu com golos: três, para se ser mais exato, o último dos quais na vitória no clássico.

Frente ao FC Porto, de resto, o suíço ganhou o direito a encher novamente as capas dos jornais.

Confirmando que Seferovic tem ares de pássaro que renasce das próprias cinzas: sobretudo quando se veste com uma águia ao peito. O que segue agora?