«La va a tocar para Diego, ahí la tiene Maradona, lo marcan dos, pisa la pelota Maradona, arranca por la derecha el genio del fútbol mundial, deja el tendal y va a tocar para Burruchaga...

¡Siempre Maradona! ¡Genio! ¡Genio! ¡Genio! Ta-ta-ta-ta-ta-ta-ta-ta... Gooooool... Gooooool... ¡Quiero llorar! ¡Dios Santo, viva el fútbol! ¡Golaaazooo! ¡Diegoooool! ¡Maradona! Es para llorar, perdónenme...

Maradona, en recorrida memorable, en la jugada de todos los tiempos... Barrilete cósmico... ¿De qué planeta viniste para dejar en el camino a tanto inglés, para que el país sea un puño apretado gritando por Argentina?

Argentina 2 - Inglaterra 0. Diegol, Diegol, Diego Armando Maradona... Gracias, Dios, por el fútbol, por Maradona, por estas lágrimas, por este Argentina 2-Inglaterra 0.»

22 de junho de 1986, Estádio Azteca. 13 horas, 12 minutos e 27 segundos no México, três horas mais em Buenos Aires, seis horas mais em Londres e em Portugal Continental. Há 34 anos a PERFEIÇÃO vestiu o número dez da Argentina para desenhar O momento, O milagre, O Golo do Século.

Na relva, o génio de D10S. Na bancada de imprensa, as palavras galopantes de Victor Hugo Morales, o jornalista uruguaio que vestiu a alma argentina na tarde da Jogada de Todos os Tempos.

Terry Butcher sopra-lhe para a nuca, Glenn Hoddle fecha a linha de passe para Burruchaga. Terry Fenwick caminha sobre o limbo, Peter Reid e Peter Beardsley ficam pelo caminho. Resta o derradeiro Peter.

Shilton e os seus caracóis mergulham para a esquerda. A bola foge, foge, foge, até Maradona a voltar a controlar, amansar, amar e cuidar. Minuto 55, quartos-de-final do Campeonato do Mundo, 114 mil bocas abertas nas bancadas do coliseu mexicano.

34 anos depois, Victor Hugo Morales aceita o convite do Maisfutebol para uma viagem no tempo. Uma viagem ao dia em que ele próprio entrou, por direito próprio, para as páginas douradas da enciclopédia dos Mundiais.

12 toques, 44 passos e 10,6 segundos do génio de Diego Armando Maradona nas palavras de Victor Hugo Morales.

Tudo começa num passe defeituoso de Hector Enrique. O resto é D10S e a poesia emocionada de Victor Hugo Morales, que 34 anos depois recorda ao Maisfutebol aquele lance de génio.

«Foi instinto, foi coração, foi o risco que aceitei correr. Nós, os narradores, somos um pouco loucos. Estamos sempre a exagerar. Quando há um Campeonato do Mundo tudo é o universo, os planetas, o infinito, a eternidade, a glória eterna. Os Mundiais têm uma presença galática na nossa vida. A imensidão do espaço saúda os deuses», sussurra Victor Hugo Morales, o dom da oratória, o génio em cada sílaba.

Nascido no Uruguai, o jornalista mudou-se para a Argentina em 1981. Foi ao serviço da Radio Argentina que viajou para o México cinco anos depois, assistindo na primeira fila à homilia de um deus vestido de alviceleste.

«O melhor golo de sempre foi convertido por um artista sublime, incomparável, chamado Diego Armando Maradona. Uma jogada colossal, a que me permiti chamar ‘A Jogada de Todos os Tempos’. Essa jogada nunca foi superada», considera o jornalista, homem com milhares de jogo na carreira e na cabeça.

Victor Hugo tornou-se o co-protagonista do assombro maior de Diego. Um portento de habilidade natural e impacto selvagem. «Estarei para sempre ligado a essa jogada e sou um beneficiário direto dela. Tive a sorte de relatar esse golo e esse relato ficou emparelhado à maravilha que Maradona fez no relvado. Estou agradecido à vida por me ter colocado ali naquele momento.»

«O Diego já era para muitos o melhor do mundo antes desse Mundial», considera Victor Hugo Morales. «Depois dessa jogada, claramente, ele passou a ser para todos o melhor do planeta. Foi um alívio para Maradona, porque no seu íntimo aspirava a esse reconhecimento total. Esse golo foi também definitivo em relação ao significado de Maradona para o futebol e para a vida.»

Mais de três décadas e oito Mundiais depois, Victor Hugo Morales jura não ter voltado a ver «nada igual». Maradona e Morales têm caminhado juntos pela coleção de memórias de milhões e milhões de apaixonados. Viverão felizes para sempre.

«Devo a Diego esta conversa. Estão a ligar de Portugal para um narrador desportivo de Rio de la Plata. Eu só estava na Argentina há cinco anos e foi esse relato que me permitiu entrar nos corações dos argentinos. Gracias, Diego.»

Três minutos antes de Maradona pegar na bola e fuzilar o pelotão inglês, a bola já entrara na baliza inglesa. Os 165 centímetros de Diego voaram mais alto e mais longe com a ajuda da Mão de Deus. Victor Hugo Morales percebeu de imediato o logro que «até como mentira foi uma genialidade».

«Disse de imediato ‘Diego toca com a mão’ e depois gritei o ‘golo, golo, golo’, com entusiasmo. Depois insisti que o golo tinha sido ilegal e que os ingleses tinham razão nos protestos. Acabei a dizer algo do género: ‘Que querem que vos diga? Contra Inglaterra [devido à Guerra das Malvinas] até um golo com a mão grito com a alma.»

A epopeia sintática de Victor Hugo Morales é um recado de outro tempo. Um aviso ao futebol moderno. O futebol das redes sociais e dos diretores de comunicação, o futebol das comissões pesadas e dos direitos televisivos pornográficos.

O tempo separará as coisas, o maniqueísmo ditará quem sobrevive. Victor Hugo Morales já leu, viu e comentou praticamente tudo. Por ele, e para ele, o que se cobra a um herói não deve ir além da obra que nos deixa. No futebol isso mede-se em memórias.

«Alguns jogadores resistem ao elogio. Para sempre. Por exemplo: qualquer elogio ao Cristiano Ronaldo fica-lhe bem. Não o podemos fazer com qualquer jogador. Só os grandes resistem ao exagero, à fantasia, ao intento poético que um narrador desportivo possa ter», explica-nos Victor Hugo, rematando: «Pertenço àqueles que estão convencidos que Diego foi o deus maior do futebol.»