O cenário parece um campo de concentração. Há um árbitro com parecenças físicas com Adolf Hitler. Os jogadores e os adeptos são todos nazis. Na tarja lê-se «arianos». A partida é um desastre, tudo lhes corre mal. A caricatura é tal que o ditador acaba no chão e o bigode é pintado com lama.



O vídeo é do Borussia Dortmund e faz parte da nova tentativa de afastar o clube alemão de um fenómeno crescente na cidade e nos estádios da Bundesliga – o neonazismo. A mensagem que aparece no fim resume o espírito: «Futebol e nazis simplesmente não combinam».

«Um assunto com o qual, infelizmente, tivemos que lidar de novo esta época. (…) Nós queremos mostrar uma posição inequívoca. No nosso estádio, não vamos tolerar qualquer atitude destas. Connosco, toda a gente é bem-vinda e a intimidação e a discriminação de qualquer tipo não têm lugar.

Esperamos que surja uma espécie de efeito dominó. Adeptos, patrocinadores, amigos e parceiros, mas também o resto da Bundesliga, são chamados para lutar contra a extrema-direita. Só juntos podemos banir o racismo e a discriminação dos nossos estádios», lê-se no comunicado do Borussia.


O problema é que, apesar desta luta, os episódios sucedem-se. Em novembro, na partida contra o Estugarda, um adepto fez a saudação nazi quando celebrava um golo do Dortmund e foi captado pela revista «Die Kirsche».


O homem foi banido durante quatro anos do Westfalenstadion. Mas não foi suficiente para desencorajar atitudes do género. Já em fevereiro deste ano, um adepto gritou «Sieg Heil» durante um minuto de silêncio realizado no jogo contra o Hamburgo.



Acabou insultado, expulso do estádio e proibido de voltar a entrar durante seis anos. Como se explica, então, esta tendência crescente?

Dortmund fica no Vale do Ruhr, uma zona industrial com muitos imigrantes, no Estado da Renânia do Norte-Vestfália. A região é conhecida pelo elevado número de neonazis e é recordista nos crimes ligados à extrema-direita. O clube, no entanto, orgulha-se de não ter conquistado títulos até à morte de Hitler e empurra para o vizinho Schalke o título de clube do regime. 

Foi precisamente num dérbi do Ruhr, em outubro de 2012, que a polícia percebeu a dimensão do problema. Os confrontos entre hooligans dos dois clubes fizeram vários feridos e acabaram com quase 200 detidos. As autoridades admitiram na altura que não viam há muito tempo tanta violência ligada ao futebol e, claro, à política. 



É que foi neste momento que reapareceu Siegfried Borchardt, que nos anos 80 foi a grande figura do hooliganismo alemão. «Estou tão orgulhoso dos meus rapazes!», disse, à revista 11Freunde, sobre os confrontos. 

Os seus rapazes são o grupo Borussenfront, criado em 1982, conhecido pelas cenas de pancadaria em jogos do Dortmund e pela perseguição a imigrantes na cidade. «SS-Siggi» tem agora 60 anos e está proibido de entrar no Westfalenstadion para sempre. Já cumpriu várias penas de prisão, não está diretamente envolvido nas claques por agora, mas é não só uma fonte de inspiração, como um ativista político.


Siegfried Borschardt candidatou-se nas últimas eleições municipais pelo partido Die Rechte e a polémica instalou-se. O cartaz de propaganda usava não só as cores do Dortmund, como a mensagem não podia ser mais clara: «Da tribuna sul à Câmara Municipal». O clube viu-se obrigado a avançar para tribunal e conseguiu vencer esta batalha. A guerra, no entanto, continuou a crescer.

Durante esta época, a «Der Spiegel» fez outra reportagem sobre o fenómeno e contou a história dos GnuHonnters, uma mistura de neonazis e hooligans, que usam o futebol para fazer crescer o movimento político. O grupo, formado em 2012, e com centenas de membros, tem 17 núcleos de vários clubes e uma grande incidência entre os Borussenfront. Os extremistas uniram-se e têm como alvos a polícia e os grupos de adeptos (sejam ou não dos seus clubes) que contrariem os seus ideais nacionalistas e racistas. 

Em mais uma tentativa de contrariar o aumento da tensão, o Borussia fez e distribuiu panfletos a todos os adeptos a informar quais os gestos, símbolos e slogans associados ao neonazismo para, desta forma, aumentar a vigilância no seu próprio estádio. 



Na famosa tribuna sul, que leva quase 25 mil adeptos, os neonazis estão em clara minoria, mas a crescer. Os Borussenfront estão proibidos de entrar nos jogos da Bundesliga, mas mantêm-se ativos noutras divisões do futebol alemão. No entanto, «os rapazes» de Siegfried Borschardt estão a influenciar outros grupos de apoio do Borussia, como os «Desperados» e os «Northside». Alguns stewards do estádio também serão membros destas claques.

Também o desmantelamento do grupo político Resistência Nacional de Dortmund (NWDO), em agosto de 2012, levou mais extremistas às claques do clube. Numa partida da equipa B, oito neonazis foram expulsos por mostrarem símbolos de extrema-direita, sendo que a maioria eram membros do NWDO. No início dessa temporada, contra o Werder Bremen, foi mostrada a frase «Solidariedade com o NWDO» e um neonazi, de 27 anos, foi identificado e banido de todos os estádios alemães.



O Dortmund investiu entretanto num sistema de câmaras no estádio para controlar os adeptos e todos os símbolos nazis foram proibidos. Só que os jogos fora são mais difíceis de controlar. Em fevereiro de 2013, dois funcionários do clube, cuja missão é promover a tolerância entre os adeptos, foram brutalmente agredidos no estádio do Shakhtar Donetsk, por extremistas do próprio Borussia, num jogo da Liga dos Campeões. Jens Volke começou por dirigir-se a três neonazis que cantavam slogans de extrema-direita e foi logo agredido. Por pior passou Thilo Danielsmeyer, o líder do projeto que o clube criou precisamente para evitar este tipo de violência, que foi seguido por dois homens até à casa de banho, levou vários socos e pontapés e bateram-lhe com a cabeça contra a parede várias vezes. Os três homens envolvidos foram identificados e banidos de todos os estádios alemães.

Perante a escalada de violência, resta aos outros adeptos do Borussia, a maioria, mostrar através de mensagens e movimentos contra os nazis que a sua única intenção é apoiar o clube.