Os campeonatos profissionais continuam à espera, mas com o passar do tempo torna-se cada vez mais complicado o cenário da conclusão das Ligas europeias, mesmo num horizonte temporal para a temporada alargado até ao verão. A intenção assumida pela UEFA de dar prioridade às decisões em campo, jogando o que falta jogar, vai prevalecendo, ainda que com alguns sinais dissonantes a manifestar vontade de acabar com a espera e encontrar outras soluções de conclusão antecipada da época. Não jogando, será muito difícil encontrar uma solução comum, entre muitas opções, da conclusão antecipada sem definir títulos a alternativas que encontrem um desfecho que permita definir posições. Do ponto de vista desportivo a paragem, imperativa e dependente da evolução no combate à pandemia do novo coronavírus, alimenta um gigantesco nó, quando está tudo por decidir nas várias Ligas. Campeões, mas não só. Quem desce, quem sobe, quem vai à Europa. Com muito em jogo para todos, mas com significado muito especial para alguns. O caso mais notório é o do Liverpool, que estava mais que lançado para chegar ao título inglês pela primeira vez em 30 anos. Mas há mais.

Em Portugal, a FPF já optou por dar por finalizadas todas as competições sob a sua alçada, sem definição de campeões. Em relação ao futebol profissional, I e II Ligas, mantêm-se os vários cenários em aberto. Lá por fora, se as cinco principais Ligas se mantêm oficialmente também na expectativa, a Bélgica deu o primeiro passo noutro caminho, com a Liga a aprovar a decisão de dar o campeonato por terminado e assumir a classificação atual. A UEFA reagiu, ameaçando os clubes que anteciparem o fim da época de exclusão das competições europeias, e a Bélgica já recuou, adiando uma decisão final. Na expectativa, alimentada também na Escócia entre planos idênticos para encerrar a época, de novas orientações da UEFA a 23 de abril.

Um olhar breve para o ponto em que ficaram os principais campeonatos europeus dá uma ideia geral da enorme confusão que se avizinha se as limitações por causa da pandemia do novo coronavírus se mantiverem e não se encontrar forma de jogar o que falta da época. Sem falar, nesta abordagem, nas competições europeias, também por completar.

Portugal, tudo por decidir e as promoções à II Liga em suspenso

Em Portugal faltam 10 jornadas de Liga, 30 pontos em jogo. O FC Porto assumiu a liderança na penúltima jornada antes da paragem e tem um ponto de vantagem sobre o Benfica, ambos com larga vantagem sobre a concorrência. A luta pelo terceiro lugar está apertada entre Sp. Braga e Sporting, e a corrida ao quinto lugar, que deveria dar acesso à qualificação para a Liga Europa, pelo facto de FC Porto e Benfica serem os finalistas da Taça, mais ainda.

Portimonense e Desp. Aves são as equipas em zona de descida, ainda sem nada decidido em definitivo. Na II Liga, estão em posição de subida o Nacional, a espreitar o regresso uma época depois de descer, e o Farense, que sonha em voltar à Liga pela primeira vez em 18 anos. Casa Pia e Cova Piedade estão no fundo da tabela, em zona de descida, quando já se sabe, por causa da conclusão antecipada do Campeonato de Portugal, que terá de ser encontrada pela Federação uma solução para definir as duas equipas que sobem à II Liga. Vizela, Arouca, Olhanense e Praiense eram os líderes de cada uma das séries no campeonato agora terminado.

Inglaterra, o absurdo do Liverpool e o primeiro campeão de sempre à espreita

Olhando para as grandes Ligas, Inglaterra tem o caso mais forte contra qualquer argumento de cancelar a época sem atribuição de títulos, quando o Liverpool já se preparava para a enorme celebração que seria a conquista do seu primeiro campeonato na era Premier League, do alto de 25 pontos de vantagem para o Manchester City, a 11 jornadas do final. Aliás, no limite podia ter festejado matematicamente a conquista do campeonato logo na primeira ronda que não chegou a jogar-se. Um argumento a favor da posição da UEFA, cujo presidente já deu o exemplo dos «reds» para reforçar o absurdo de não consagrar campeões esta temporada.

Estava tudo em jogo para lá disso, a começar pela luta pelos quatro lugares de Liga dos Campeões, com City e Leicester mais destacados e um enorme engarrafamento daí para baixo que inclui o Chelsea, o Manchester United, o Tottenham de Mourinho e o Arsenal, mas também o Wolverhampton da armada portuguesa e a surpresa Sheffield United. Com tudo em aberto também na zona de descida, há muita gente no Championship à espreita da subida, incluindo o histórico Leeds de Marcelo Bielsa, que ficou à porta na época passada, e o West Bromwich Albion. Entre as equipas nos lugares que dão acesso ao play-off pelo último lugar de estão  Fulham, Nottingham Forest e dois potenciais estreantes: o Preston North End, o primeiro campeão inglês da história, um dos fundadores da Football League, em 1888, e que nunca jogou na Premier League, mais o Brentford, que procura a primeira presença na divisão principal.

Play-offs de subida a complicar e as histórias que chegam de Itália

Em Espanha, pelo contrário, a luta pelo título estava completamente em aberto, com 11 jornadas por disputar, o Barcelona na frente e o Real Madrid a dois pontos de distância. Tal como a luta pelos outros lugares de Champions, com cinco equipas separadas por apenas dois pontos.

Espanhol, Leganés e Maiorca são as equipas em zona de descida, enquanto na II Liga também há um sistema de play-offs para atribuir o último lugar de subida que é mais uma dor de cabeça para a definição de um desfecho e de um calendário.

Em Itália, o país europeu que mais cedo e mais duramente foi afetado pela Covid-19, o campeonato foi interrompido a 12 jornadas do fim, 13 para várias das equipas. Estava a ser um campeonato bem mais disputado que nos últimos anos. A Juventus liderava, mas apenas com um ponto de vantagem sobre a Lazio. Daí para baixo, a luta pela Champions estava apertada entre Inter, Atalanta e Roma, com os históricos Nápoles e Milan mais atrás. Expectativa a dobrar para a Atalanta, a fazer uma grande época e que já estava nos quartos de final da Champions em ano de estreia.

Lecce, SPAL e Brescia estavam em zona de descida, na Serie B havia várias equipas a alimentar a ilusão de fazer história. Em posição direta de subida estão Benevento e Crotone, nos lugares de acesso ao play-off está o histórico Chievo, mas também o Spezia, o clube que ganhou em 1944 um «scudetto» oficioso, numa época em que não houve Serie A oficial por causa da II Guerra Mundial. Ou o Cittadella, à procura da estreia na Serie A depois de ter chegado ao play-off na época passada, ou ainda o Pordenone, que se estreou na Serie B esta época e se financiou para a temporada entre os profissionais através de uma campanha de crowdfunding em que angariou dois milhões de euros.

Alemanha a treinar e históricos em suspenso

Na Alemanha, com nove jornadas por jogar, o Bayern Munique liderava com quatro pontos, mas esta era uma temporada de Bundesliga extraordinariamente aberta: há sete pontos a separar o primeiro do quinto classificado. Um sinal claro da intenção de manter como prioridade finalizar a época é o facto de vários clubes estarem já a voltar aos treinos, ainda que mantendo as regras de distanciamento social.

No fundo da tabela, o histórico Werder Bremen, quatro vezes campeão, é penúltimo e está em risco de descer pela primeira vez em quase 40 anos. Na 2. Bundesliga, o Arminia Bielefeld lidera, a espreitar o regresso ao primeiro escalão ao fim de mais de uma década, seguido dos históricos Estugarda e Hamburgo, e ainda do Heidenheim, potencial estreante, com duas posições de subida direta e uma outra a decidir em play-off.

Em França não havia nada de novo na frente. A 10 jornadas do fim o PSG ia lançado, com 12 pontos de vantagem, mesmo tendo menos um jogo. Segundo, o Marselha de André Villas-Boas estava em boa posição para garantir o segundo lugar direto de acesso à Liga dos Campeões, enquanto um Lille bem português estava na luta pelo terceiro lugar, onde mora o Rennes, a um ponto de distância.

Na Ligue 2, a luta pela subida, com dois lugares diretos e um terceiro via play-off, estava totalmente embrulhada, com as cinco primeiras equipas separadas por quatro pontos. Entre elas um possível estreante, o Clermont Foot, há muito a procurar bater à porta do primeiro escalão.

Parada alta para treinadores portugueses da Ucrânia à Grécia

Continuando a olhar para as principais Ligas europeias no ranking da UEFA, a Rússia tem o Zenit com vantagem confortável de nove pontos na frente, enquanto Lokomotiv e Krasnodar estão iguais na discussão pelo outro lugar de Champions. E na Ucrânia está em suspenso a perspetiva de Luís Castro levar o Shakhtar Donetsk à revalidação do título. O campeonato tinha acabado de entrar na fase de play-off de apuramento do campeão. O Shakhtar segue destacado na frente, com 13 pontos de vantagem sobre o Dínamo Kiev, quando faltam nove jornadas. Daí para baixo, a luta pelo segundo lugar de qualificação para a Liga dos Campeões está muito apertada. O Dnipro-1, sucessor do extinto FC Dnipro, lídera o play-off pela permanência, lugar que dá acesso à discussão do último bilhete de acesso à Liga Europa.

A Turquia foi o último campeonato de alguma dimensão a parar na Europa, com os clubes a procurarem manter alguma atividade, numa competição em que a luta pelo título está totalmente em aberto, com Trabzonspor e Istambul Basaksehir iguais na frente, o Galatasaray a três pontos de distância e o Sivasspor a quatro. Os históricos Besiktas e Fenerbahçe estão longe, mas ainda seguiam pelo menos na corrida por lugares europeus. Na Grécia, o campeonato preparava-se para entrar na fase de play-offs e o Olympiakos de Pedro Martins está na frente, com sete pontos de vantagem sobre o PAOK de Abel Ferreira, que antes da paragem foi condenado na secretaria à perda de sete pontos, o que na prática o arredaria da luta.

Sinais de impaciência da Bélgica à Escócia

A Bélgica foi o primeiro país a dar um passo formal no sentido de terminar antecipadamente a época do principal campeonato, que parou quando faltava um jogo para terminar a época regular. Com o Club Brugge na frente, do alto de 15 pontos de vantagem sobre o Gent, a Liga belga propôs que o campeonato terminasse como está, deixando cair os play-off e assumindo a classificação atual como final.

Abdicava assim do play-off de luta pelo título, entre os seis primeiros e com cada equipa a levar metade dos pontos, bem como dos play-off de acesso ao último lugar na Liga Europa, que juntam as restantes dez equipas do primeiro escalão e as seis melhores da segunda divisão. O histórico Anderlecht de Vincent Kompany, atual oitavo classificado, ainda tinha hipóteses de ficar entre os seis primeiros.

A Escócia é o outro campeonato que dá sinais de se encaminhar para uma solução definitiva antecipada. A Federação vai decidir em breve o que fazer aos vários campeonatos, deixando para já em aberto a Premier League. Mas vários meios de comunicação noticiam que a intenção é «imitar» a solução belga e dar o campeonato como terminado, assumindo a classificação atual. O que consagraria como campeão de novo o Celtic, que lidera com 13 pontos de vantagem a três rondas do fim da época regular, e despromoveria o Hearts, atual último classificado.

O braço de ferro holandês e o insólito austríaco

Da Holanda, onde Ajax e AZ Alkmaar estão iguais na frente e está tudo também por definir do ponto de vista desportivo, chegam sinais contraditórios. O Ajax foi o primeiro clube a defender que o campeonato devia ser dado por terminado, uma posição apoiada por AZ e PSV Eindhoven. A primeira hipótese avançada foi dar a época como nula, sem definir posições, mas não é isso que está em cima da mesa por agora. A Liga mantém a intenção de retomar a Eredivisie e até foi das poucas que arriscou uma data, 19 de junho.

Também na Áustria já se tornaram públicas conversações para encontrar uma solução imediata. E este era um campeonato de onde chegavam ventos novos, com a ascensão notável do LASK Linz, que chegou à fase de play-off na liderança, ameaçando a hegemonia do Salzburgo, hexacampeão em título, vencedor de dez dos últimos 13 campeonatos. O LASK lidera nesta altura com três pontos de vantagem sobre o Salzburgo. Mas entre os cenários tornados públicos estava a possibilidade de tornar nula esta época, fazendo valer a classificação da temporada 2018/19. O que manteria o Salzburgo com estatuto de campeão. Também aqui não está nada decidido, mas é mais um exemplo da complexidade das decisões que terão de ser tomadas, mais tarde ou mais cedo.