Já vimos este filme. Neymar protagonista do verão, sai não sai, pressão sobre o clube onde joga, milhões a circular. Em 2017 a novela acabou com Neymar transformado no jogador mais caro de sempre, a mudança do Barcelona para o PSG custou 222 milhões. Exatamente dois anos mais tarde, volta a forçar a saída e a alimentar uma espécie de leilão que envolve vários clubes, incluindo… o Barcelona. Neymar é tanto talento como agitação, sempre a querer mais e sempre lado a lado com a controvérsia. Casos e casos. Tantos, em campo e fora dele.

Neymar foi uma estrela prematura, desde muito cedo debaixo dos holofotes, para o bem e para o mal. Aos 14 anos já era notícia. Não era só mais uma promessa a despontar, carregava enormes expectativas e já muita bagagem. Não se falava apenas do seu potencial, mas também de negociações e contratos, já com empresário e o pai no meio.

As notícias sobre o interesse dos grandes da Europa eram recorrentes, mas ele foi ficando no Santos. Precoce em tudo: na estreia pela equipa principal do «Peixe», com 17 anos feitos há pouco, e nas atitudes polémicas. No final do verão de 2010, os primeiros grandes sinais. Em agosto foi para o Twitter criticar assim um árbitro, por causa de um penálti assinalado contra o Santos num jogo frente ao Vitória, quando nem estava em campo: «Juiz ladrão, vai sair de camburão.» O árbitro processou-o e Neymar foi condenado a uma indemnização.

O insulto ao treinador e o aviso: «Estamos a criar um monstro»

Em setembro, o primeiro caso sério. Num jogo com o At. Goianiense, amuou e insultou o capitão Edu Dracena e o treinador Dorival Jr por não o terem deixado marcar um penálti. No final do encontro, o treinador adversário, René Simões, estava chocado. E foi nessa altura que disse aquela que seria a frase mais citada de sempre sobre Neymar: «Está na hora de alguém educar esse rapaz, ou vamos criar um monstro. Estamos a criar um monstro no futebol brasileiro.»

O Santos suspendeu Neymar por um jogo por causa do incidente, mas o treinador Dorival Jr decidiu prolongar o castigo e acabou despedido.

A transferência para o Barça, um nó que acabou nos tribunais

O destino de Neymar na Europa acabou por ser o Barcelona, no verão de 2013. A transferência revelou-se um novelo de contornos obscuros, envolvendo o Barcelona, o Santos, o grupo acionista do clube e o pai do jogador e transformou-se num caso para muitos anos, com consequências para o Barcelona – levou à demissão do presidente Sandro Rosell, e vários processos e acusações fiscais em Espanha e no Brasil ao Barcelona e à família de Neymar. Os problemas de Neymar com o fisco começaram ainda no tempo do Santos e parecem não ter terminado. Ainda agora o jornal «El Mundo» escreveu que as autoridades fiscais espanholas reclamam uma dívida de 35 milhões de euros de Neymar referente à sua cláusula de renovação com o Barcelona, um problema mais para um eventual regresso ao Camp Nou.

Em quatro épocas no Barcelona, Neymar viveu a melhor fase da sua carreira. Ganhou uma Liga dos Campeões, dois campeonatos de Espanha, um Mundial de clubes, marcou 105 golos em 186 jogos. E cresceu na seleção do Brasil, onde parecia destinado a cumprir todo o seu potencial.

Do Mundial 2014 à Copa América que acabou à cabeçada

Era enorme a expectativa em torno de Neymar para o Mundial 2014, aquele em que o Brasil depositava todas as esperanças e acabou em choque. E sem Neymar. Marcou quatro golos na fase de grupos, marcou o penálti decisivo no desempate com o Chile nos oitavos de final, mas uma entrada de Zuñiga no jogo dos quartos de final, frente à Colômbia, tirou-o da meia-fina. Foi fora de campo que assistiu à humilhação do Brasil no Mineirão, o 1-7 frente à Alemanha. Na altura solidarizou-se com os colegas, mas mais tarde puxou dos galões: «Comigo em campo o resultado teria sido outro.»

A próxima grande competição de seleções foi a Copa América 2015. E acabou com Neymar a ser Neymar. Capitão do escrete, envolveu-se numa confusão no final do jogo com a Colômbia, na fase de grupos, deu uma cabeçada em Murillo, acabou expulso e foi suspenso por quatro jogos. A competição acabou ali para ele, para o Brasil acabou nos quartos de final, frente ao Paraguai.

Ouro olímpico com ressentimentos

Neymar voltou a ser feliz na seleção em 2016, em casa. Liderou a equipa que conseguiu pela primeira vez o ouro olímpico para o Brasil. Mas a relação com os adeptos há muito que não era pacífica e o caldo entornou no fim. Na ressaca da festa, deixou uma frase forte: «Agora vão ter que me engolir.» E ainda em campo foi tirar satisfações junto de alguns adeptos que o tinham criticado durante o jogo.

Nélson Semedo levou por tabela 

No verão de 2017, a meio do processo da saída do Barcelona, Neymar começou a pré-temporada com o clube culé. E ficou célebre o desentendimento que teve num treino com Nélson Semedo, por achar que o português teve uma entrada mais dura. Neymar acabou por tirar o colete e virar costas ao treino.

Neymar deixou Barcelona pouco depois, no final de um jogo do gato e do rato com o Barcelona, com episódios burlescos pelo meio: os seus advogados a quererem depositar o dinheiro da cláusula de rescisão, a Liga espanhola a recusá-lo, aproveitando para uma posição política, alegando que o PSG estava a violar o Fair Play Financeiro. O dinheiro a acabar por ser entregue no próprio Camp Nou. Com o Barcelona a anunciar que iria desencadear procedimentos disciplinares e a reclamar dinheiro a receber do prémio de renovação do contrato de Neymar.

Cavani e a batalha de egos no PSG

Seguiu-se o PSG, a polémica não tardou. Logo em setembro, uma rábula com Cavani em torno da marcação dos livres e penáltis no jogo frente ao Lyon, com Dani Alves pelo meio, voltou a colocar Neymar nas bocas do mundo pelas piores razões, e a enfraquecer a posição do treinador Unai Emery na gestão dos egos da equipa.

O Mundial no chão, piada global

A época 2017/18 acabou em fevereiro para Neymar, por causa de uma lesão num dedo do pé direito. Era ano de Mundial e ele voltou a tempo de jogar na Rússia. O Brasil caiu nos quartos de final, Neymar caiu muito em campo ao longo da prova e a fama de «mergulhador» virou piada pelo mundo. Passou 14 minutos no chão, houve quem contasse.

Suspensão na UEFA, agressão a adepto na Taça

De regresso ao PSG, Neymar teve mais uma época agitada. Sofreu nova lesão no pé em janeiro e voltou a parar, mas esteve no Rio de Janeiro a festejar o Carnaval. Falhou a decisão dos oitavos de final da Liga dos Campeões com o Manchester United, o que não o impediu de criticar o árbitro no Instagram e ser suspenso por três jogos pela UEFA.

Em abril deste ano, o PSG perdeu a final da Taça de França para o Rennes e no final, quando subia para a tribuna, Neymar reagiu a soco à provocação de um adepto. Foi castigado com três jogos de suspensão, que passam a cinco se reincidir.

A época terminou, mas a confusão em torno de Neymar está longe do fim. Foi acusado de violação e reagiu, para desmentir, divulgando uma conversa e imagens privadas da mulher em causa, o que lhe valeu desde já um processo. Pelo meio, lesionou-se num jogo de preparação com o Qatar e falhou a Copa América deste ano. O Brasil foi campeão sul-americano sem Neymar, enquanto ele preparava o próximo passo.

O futuro e as «margens»

Não se apresentou no início de julho no regresso do PSG ao trabalho, quer sair. Cá vamos outra vez. Aos 27 anos, Neymar devia estar no auge da carreira, que ele quer que seja lá bem no topo. Mas para isso precisa de um equilíbrio que ainda não encontrou. Em muitos aspectos, parece ter mudado pouco desde aqueles primeiros tempos no Santos. Por estes dias, muita gente lembra aquela frase de René Simões como premonitória.

O próprio René Simões não fica feliz por isso. «Não tenho nenhuma satisfação quando as pessoas acham que eu tinha razão, que eu fui um visionário. Eu fui apenas um educador», disse o treinador por estes dias, numa entrevista à rádio Jovem Pan em que elogia o talento de Neymar e lhe deixa um conselho: o melhor mesmo é voltar ao Barcelona. «Foi a melhor época da carreira dele. Ali, ele tinha as margens. Eu comparo a educação a um rio. Você precisa ter margens», afirma: «E o Barcelona fez isso muito bem. Nunca se ouvir falar nada do Neymar enquanto ele esteve no Barcelona. Eu acho que a volta dele seria muito boa, porque nenhum jogador pode ser maior que um clube. E, no PSG, ele estava maior que o clube.»