Kevin-Prince Boateng ficou conhecido em Portugal depois da transferência falhada para o Sporting, mas tem um historial dentro e fora dos relvados que o notabilizaram no mundo do futebol.

O médio ganês alinha agora no Las Palmas de Espanha, onde é uma das principais figuras e tem somado várias boas exibições e também golos, o que muitos traduzem como uma espécie de renascimento, após uma fase menos positiva na carreira.

Numa extensa entrevista ao The Guardian, esta terça-feira, o jogador contou várias histórias do seu passado problemático, mas também outras curiosidades engraçadas, entre as quais um encontro insólito com Nelson Mandela durante o Mundial de 2010.

«Na minha vida sempre quis conhecer três pessoas: Michael Jackson, Muhammad Ali e Nelson Mandela. Só conheci um e é difícil de descrever (…) Eu estava ali sem saber o que fazer e ele quebrou o gelo dando-me um aperto de mão. Depois aproximou-me dele e disse-me: “a minha filha quer casar contigo”. Eu respondi-lhe: “desculpe, mas já tenho namorada”. Então ele disse: “não, não mas eu tenho outras, mais bonitas”. Estavam todos a rir-se. Foi pena não ter tirado fotografias porque o flash magoava-lhe os olhos, então só tenho uma e nem pareço eu», contou.

Tal como Mandela, Boateng dedica-se há uns tempos à questão do racismo, até porque já sofreu na pele a descriminação racial enquanto jogador.

A sua luta foi reconhecida pelas Nações Unidas (ONU), que o convidaram para fazer um discurso durante um dos encontros do organismo.

«Estava muito emocional, mas não consigo explicar o que senti, para além de uma coisa bonita. Pessoalmente foi inacreditável ter a possibilidade de dizer o que penso, o que vejo, o que experienciei na minha vida. Mas estava lá por uma coisa muito negativa, então estava zangado, foi difícil falar (…). Falando nas Nações Unidas consegues chegar a todo o mundo, mas é só por um dia, no outro já está esquecido», sublinhou, prosseguindo:

«Haver anúncios da FIFA sobre racismo na Liga dos Campeões é bom, mas cinge-se a essa competição. Agora tiraram-me desses anúncios, talvez porque estou no Las Palmas e não disputo a Champions, mas isto é uma mensagem sobre racismo, não sobre a Champions. Claro que conseguem ter grandes jogadores como Ibrahimovic, Neymar, Messi, Ronaldo, porque eles têm visibilidade, mas o que fizeram eles contra o racismo? É engraçado, o único jogador a fazer um discurso na ONU e tiraram-me.»

Na conversa com o órgão de comunicação britânico, Boateng falou também dos tempos em que alinhou por empréstimo no Borussia Dortmund, então orientado por Jurgen Klopp, atual técnico do Liverpool.

O ganês foi perentório a falar da relação com o treinador germânico, garantindo ter sido o melhor que teve na carreira.

«É o melhor treinador do mundo, sabe quando puxar por ti e quando te confortar. Sabe quando precisas de uma bebida, quando precisas de água. Ele tem essa capacidade, tem tudo. Perguntem aos jogadores e eles dirão que é o melhor, que morriam por ele. Havia jogadores no Dortmund que só tinham jogado cinco minutos em seis meses mas estavam felizes, porque ele fazia-os sentir-se importantes, mesmo que nem contasse contigo enquanto jogador, mas como pessoa. É por isso que ele tem sucesso em todo o lado, e o Liverpool é perfeito», vincou.

Quanto ao passado, Boateng revelou pormenores duros que começaram em 2007/2008 quando chegou ao Tottenham, proveniente do Hertha, e era colega do português Ricardo Rocha.

«Parecia um velho e só tinha 20 anos. Ficava na rua até às seis da manhã, pesava 95 kg e estava inchado de beber álcool e comer mal.»

«Depois percebi que não queria ser assim e disse aos meus amigos para me limparem o frigorífico. Deixei de beber, de sair e comecei a cozinhar coisas saudáveis. Fiquei assim porque o treinador me disse que já não me queria, então pensei em desfrutar da vida. Agora dou conta do erro: saia seis vezes por semana e bebi quase um ano inteiro.»

«Gastei sérias quantias de dinheiro em bares, roupa e carros. Tentei comprar a felicidade. Como não jogava, comprei um Lamborghini. Agora olho para trás e penso no estúpido que fui.»

O melhor aconteceu depois no Porthsmouth, após a passagem sem brilho pelo Dortmund: «Disseram-me que o estádio era pequeno e disse que não me importava, que o relvado era mau e não me importava, que não havia muito dinheiro e disse que me dava igual. Deram-me o contrato e assinei. Adorei jogar ali.»

Seguiu-se depois a oportunidade no Milan, que nem o próprio acreditava ser possível: «Quando o meu agente me falou disso pensei que estava a gozar comigo. Fui sair e ligou-me às 8h00. Perguntei-me se tinha ido treinar e disse-lhe que sim, mas era mentira. Estava de férias e a aproveitar.»