Havia 2-2 no Stade de France, nesta terça-feira, quando aos 78 minutos, Ousmane Dembelé teve a bola na área. O francês recebeu de pé direito e foi com esse pé que bateu o guarda-redes inglês, para dar uma vitória aos bleus.

Antes disso, o extremo do Borussia Dortmund já tinha tentado o golo, mas com o outro pé. Supostamente, o mais fraco. Sidibé teve de ir lá confirmar o golo gaulês, mas o remate de Dembelé, apesar de não ser forte, colocou em dificuldades o guardião dos Três Leões.

O facto de ser ambidestro é uma das vantagens do internacional francês, que confunde adversários com velocidade e com a habilidade que tem nos dois pés. Ele próprio não sabe responder com certeza absoluta qual o melhor pé.

Dembelé não é caso único no futebol mundial e o Maisfutebol recorda-lhe alguns dos nomes de ambidestros: uns eram-no de forma natural, outros treinaram para sê-lo. Ainda assim, eram e são jogadores a quem se aplica uma das velhas frases do futebol - «chutar com o pé que está mais à mão» - embora no caso deles não se notem grandes diferenças.

O maior jogador da História do Manchester United

Sobrevivente do desastre de Munique, Bobby Charlton tornou-se no mais emblemático jogador do Manchester United. O internacional inglês, campeão do mundo em 1966, era um ambidestro puro.

Sir Bobby tanto apontava cantos com o pé direito como o fazia com o pé esquerdo. Questionado sobre esse facto, num trabalho da FourFourTwo, respondeu.

«Eu era ambidestro. Nenhum dos meus pés era mais forte e nunca fiz trabalho para ser ambidestro, era natural. É uma surpresa que mais pessoas não tentem melhorar para ser ambidestros, mas quem somos nós para criticar alguém como Puskas, um jogador fenomenal que nunca, jamais tocou a bola com o pé direito?»

Um penálti no México 86 de pé esquerdo, outro em Itália 90 com o pé direito

A Alemanha foi finalista no Mundial 1986 e no Itália 90 com Andreas Bhreme. Apesar de ter jogado toda a carreira do lado esquerdo, o internacional germânico era outro ambidestro puro.

Nascido em Hamburgo, Brehme fez carreira no Kaiserslautern, Bayern Munique, Inter de Milão e ainda Saragoça, depois de ter começado no HSV Barmbek-Uhlenhorst. Em Itália, completava o trio de alemães do Inter com Lothar Mathaus e Jurgen Klinsmann e fez deles campeões do mundo em 1990.

Como? Com um penálti apontado com o pé direito, frente à Argentina, de Maradona

Quatro anos antes, no México, numa decisão por grandes penalidades, Brehme marcou de pé esquerdo.

A explicação para o germânico era esta: o direito tinha mais colocação, o esquerdo mais força.

Para ver, ao minuto 8:30.

Paolo Maldini: com que pé chuta mesmo?

Há vários jogadores em Itália que se tornaram ambidestros. Darmian, do Manchester United, até é considerado um deles, mas o mais mediático de todos foi Paolo Maldini.

O antigo jogador e capitão do Milan começou cedo a carreira e, originalmente, era destro. Aliás, reza a lenda que quando optou pelo jovem defesa para substituir o lesionado Battistini, ao intervalo, frente à Udinese, em 1985, o treinador Nils Liedholm lhe perguntou: «Queres jogar à esquerda ou à direita?»

Paolo Maldini atuou pelo lado direito, mas a partir daí começou a surgir no lado esquerdo, o que levou à evolução do pé esquerdo, ao ponto de, anos mais tarde, se questionar com qual ele realmente chutava melhor.

«Tive de treinar a jogar com o pé esquerdo, até ser natural rematar com ele, quando a bola vinha no ar. Quando ela vinha rasteira….tive de treinar muito!»

Passado uns anos, Filippo Galli confirmava o que se via em campo, ao Corriere della Sera: «Paolo era destro e canhoto. Um exemplo para todos.»

Treinou tanto que até começou a apontar penáltis com o pé esquerdo.

A explicação de Cazorla

O próprio Arsène Wenger não conseguia distinguir, assume o site do Arsenal. O treinador francês contratou Santi Cazorla ao Málaga em 2012, numa altura em que o internacional espanhol já era bicampeão europeu com a seleção e, claro, já dominava a arte de bater faltas com qualquer um dos pés.

No entanto, o repertório de Cazorla vai muito para além dos cantos e livres que, dependendo da posição em campo, opta por apontar com a esquerda ou com a direita.

Em declarações ao site dos gunners, o próprio explicou como se tornou num jogador ambidestro.

«Sempre preferi o pé direito, desde que era miúdo. Mas uma vez magoei-me no meu tornozelo direito e comecei a usar mais vezes o pé esquerdo. Poder utilizar qualquer um deles é algo que, para mim, é natural desde que comecei a jogar. Ainda assim, é algo que continuo a praticar de forma árdua, para que o meu nível não desça. Tudo vem daí. Depois dos treinos, eu ficava mais meia hora a chutar a bola contra a parede com o meu pé mais fraco, repetidamente, para o tornar melhor.»

 

De pé esquerdo ou direito, vale sempre a pena lembrar este enorme jogador

Número 10 nas costas, jogadas brilhantes e golos incríveis. Curiosamente, outro jogador contratado por Arsène Wenger, mas…em 1987, para o Mónaco.

Glenn Hoddle foi alguém que deixou os internacionais ingleses de boca aberta quando assumiu os Três Leões. Os futebolistas ficaram espantados com a habilidade do antigo camisola 10 do Tottenham, que permanecia intacta.

Foi nos Spurs que Hoddle jogou mais tempo e encantou os relvados ingleses. Fê-lo com uma facilidade tremenda em jogar com os dois pés, algo que lhe era natural.

«As opções que se abrem, todos os ângulos, como ambidestro são incríveis. Posso falar por experiência própria. Eu tive sorte, era um ambidestro natural, mas também me esforcei nos treinos. Se estivesse a transportar a bola e enfrentasse alguém sentia-me mais confortável com a esquerda, mas se tinha de bater um penálti ou um livre preferia fazê-lo com o pé direito.», Glenn Hoddle, 1 de agosto 2008, in FourFourTwo

Aqui ficam alguns dos grandes golos de Hoddle

«De vez em quando, dou autógrafos com a mão esquerda»

Anderson Hernanes de Carvalho Viana Lima é conhecido no mundo do futebol apenas pelo segundo nome. Foi esse que usou na camisola do São Paulo, do Santo André, da Lazio, do Inter e da Jventus. E é esse mesmo nome que está escrito na do Hebei China Fortune, que agora representa.

Internacional brasileiro, Hernanes é um caso claro de alguém que aperfeiçoou o lado mais fraco, conforme explicou à revista Época.

«Sou ambidestro. De pequeno, era destro. Mas tinha muita vontade de ser canhoto. Então comecei a desenvolver tanto a perna como o braço – escrever, chutar, driblar, fazia tudo com o lado esquerdo. Mesmo que eu não fosse jogador, acho que treinaria essa habilidade. De vez em quando, dou autógrafos com a mão esquerda. Se todos os jogadores aperfeiçoassem a perna contrária, seria uma vantagem para eles. Para mim é.»

Um golo de livre de pé direito

Um golo de livre de pé esquerdo

Cá, andou um em Braga, mas ninguém bate Chalana

Não é fácil encontrar jogadores ambidestros na Liga, mas em Braga passou um recentemente.

Luís Aguiar anda pelo Alianza Lima do Peru, mas ficou conhecido em Portugal sobretudo pelo que fez nos arsenalistas, depois de passar por E. Amadora e Académica, por cedência do FC Porto.

O médio uruguaio tinha preferência pelo pé direito, era com esse que batia penáltis, mas utilizava o esquerdo quase de forma igual. Os golos que apontou são prova disso mesmo.

No entanto, quando se fala de jogadores ambidestros, em Portugal um nome destaca-se de todos: Fernando Chalana. Uma geração inteira desconfia que o Pequeno Genial sempre foi esquerdino, enquanto ele próprio garante que não, que a perna mais forte é a direita.

Chalana era o tipo que tanto marcava um golo na Luz de canto direto, com o pé esquerdo, como o fazia de penálti, de pé direito. Mas incrível, porém, era o modo como conduzia a bola e deixava adversários para trás.

Há outros nomes de futebolistas que têm tanta habilidade a jogar com o pé esquerdo, como com o direito. Pedro Rodriguez, do Chelsea, é um deles, tal como Adriano, lateral ex-Barcelona e agora no Besiktas. Depois há aqueles cujo pé preferencial é notório, mas que têm um outro de grande qualidade. Exemplos? Cristiano Ronaldo ou, melhor ainda, Zinedine Zidane.