O escândalo da manipulação na emissão de gases que abalou a Volfswagen nas últimas semanas atingiu nesta terça-feira o Wolfsburgo de forma direta pela primeira vez. O projeto de construção do novo centro de treinos para as camadas jovens do clube ficou suspenso.

Esta é a primeira consequência para o futebol do Wolfsburgo da crise que se instalou na marca alemã de automóveis que é dona do clube. Mas as consequências para os «lobos» germânicos prometem não ficar por aqui. E podem ter também a ver com o futebol alemão no seu todo, até mesmo com o desporto na Alemanha e além das suas fronteiras.

O escândalo em que a Volfswagen está envolvida e a crise que está no presente ainda em fase de resolução pós-choque «poderá ter um efeito dominó» que irá muito para lá do Wolfsburgo. As palavras são-nos ditas por Alex, antigo jogador do clube alemão e que conhece bem o que representa a Volkswagen para aquela(s) realidade(s).

Há cerca de três semanas, a VW admitia a manipulação na emissão de gases pelos seus automóveis, num número estimado em 11 milhões de viaturas. Ainda há uma semana, Klaus Allofs, o diretor desportivo do Wolfsburgo, reconhecia à DPA que o clube sabia que era «parte» no «contexto» do que estava a acontecer, mas desvalorizando nessa altura «razões para preocupações», pois «está-se a falar de outras magnitudes financeiras».



O novo presidente da VW anunciou no «Frankfurter Allgemeine Zeitung» medidas drásticas. «Vamos revirar cada pedra e também vamos analisar isso», disse a respeito do futebol Matthias Müller: «Estamos a analisar todos os investimentos. Tudo o que não for necessário será removido ou reformulado». Ao falar aos trabalhadores da VW em Wolfsburg, Müller disse: «Isto não acontecerá sem dor.»

A VW tornou-se a maior construtora automóvel do mundo (passando a Toyota) em 2014, com lucros de 14,8 mil milhões de euros. A «Bloomberg» revelou que o gigante alemão vai agora cortar mil milhões de euros por ano nos investimentos planeados. A VW já fez provisões de 6,5 mil milhões de euros para lidar com o escândalo enfrentando processos em todo o mundo e, nos EUA, uma multa que pode chegar aos 15 mil milhões de euros.

As magnitudes são outras, mas fazem parte da mesma realidade. O investimento para o novo centro de treinos da formação a ser construído até 2017 está orçado até 40 milhões de euros. «Pelo menos, por agora, está suspenso», assumiu Allofs no «Der Tagesspiegel». «Claro que este não é a altura de investir, temos de usar o senso comum», frisou o diretor desportivo.

O Wolfsburgo sentiu o primeiro impacto direto no futebol do escândalo VW. A dona do clube está a passar por dificuldades; o clube não lhes escapa. «A Volkswagen, dentro do Wolfsburgo, podemos dizer que é tudo». Alex esteve nos «lobos» alemães três épocas (entre 2005 e 2008) e diz ao Maisfutebol que «dificilmente o clube podia disputar a liga como o faz sem o apoio da Volkswagen».



O agora treinador português recorda que a casa-mãe da construtora automóvel, na cidade de Wolfsburg, «chegou a ter 100 mil trabalhadores». «Agora andará nos 50 a 60 mil, mas, isto, numa cidade que não terá mais de 130 mil habitantes...» Esta é a importância da VW na região. «No clube, ainda mais.» «Se o Wolfsburgo tem o poderio financeiro que tem é devido à Volkswagen», sendo que «o clube também é a imagem» da marca de automóveis.

Foi quando Alex estava no Wolfsburgo que o clube da Baixa Saxónia se transformou num dos mais poderosos da Alemanha. Foi pelas mãos de Martin Winterkorn, em 2007. O presidente da VW que se demitiu agora devido ao escândalo era um dos elementos que dirigiam o clube detido pela construtora.

Alex lembra-se da chegada de Winterkorn, dos jogadores que ele trouxe para tornar poderoso o clube de que era adepto, de trazer com ele Felix Magath, o treinador que guiou o Wolfsburgo ao seu maior título: campeão da Alemanha em 2009. Na última época, os «lobos» ganharam a Taça da Alemanha (foram o vice-campeão) e, já nesta temporada, venceram a Supertaça germânica.



Winterkorn «passou a investir muito refere Alex. Mas a extensão da Volkswagen não fica pelo Wolfsburgo nem pela sua cidade. Passa para todo o futebol alemão. A VW está no Bayer Munique através da sua marca subsidiária Audi. No todo-poderoso do futebol alemão, a VW tem uma participação de 8% e membros seus no Conselho de Supervisão dos bávaros.

No recém-promovido Ingolstadt, a VW tem 20% e quatro membros na administração. No Wolfsburgo, Winterkorn e o seu diretor de comunicação na VW, Stepnah Grühsem, já não estão. Mas o Bayern reiterou a confiança no ex-presidente da VW que se demitiu e Winterkorn ainda está no Conselho de Supervisão do campeão germânico. Hans Dieter Pösch, também antigo diretor da VW, já deixou Conselho de Supervisão da Bundesliga, mas ainda está na Supervisão do Wolfsburgo.

Alex sabe a importância da Volkswagen para o futebol alemão e frisa, inclusive, a «participação [da marca alemã de carros] no desporto em toda a Europa, até em todo o mundo». «Há muitos clubes» dependentes dos investimentos da VW, «não só no futebol, mas no desporto» em geral.

Voltando aos anos de ouro do Wolfsburgo, ainda não foi referido que a equipa feminina do clube, em 2013, ganhou campeonato e Taça da Alemanha e a Liga dos Campeões. E repetiu triunfo na Bundesliga e Champions femininas no ano seguinte. Depois do escândalo da VW, o «Bild» noticiou que o investimento da VW no Wolfsburgo pode descer dos 100 milhões de euros anuais para 30. Esta crise «poderá ter um efeito dominó», não só em Wolfsburgo, «não só no futebol»...