Um inspetor da Polícia Judiciária envolvido no processo 'Jogo Duplo' disse nesta quinta-feira em tribunal que quatro ex-jogadores do Oriental receberam 7.500 euros cada um para perderem um jogo frente ao Penafiel na época 2015/16.

O julgamento, que tem como pano de fundo casos de viciação de resultados, está a decorrer em Lisboa e tem 27 arguidos, oito deles antigos jogadores do clube de Lisboa e antigos futebolistas da Oliveirense, do Penafiel e do Académico de Viseu. No rol de arguidos estão ainda dirigentes desportivos, empresários, um elemento ligado a uma claque de futebol e outras pessoas ligadas ao negócio das apostas desportivas.

Nesta quinta-feira, na segunda sessão de julgamento, o referido inspetor - coordenador da investigação criminal da PJ - recordou ao coletivo de juízes o recebimento de uma denúncia (27 de abril de 2016) que dava conta de que o jogo Oriental-Leixões, realizado três dias antes, tinha sido manipulado e que o Penafiel-Oriental, que seria jogado a 30 de abril, também seria manipulado, situação que levou à monitorização da partida pela PJ.

O inspetor referiu que nas escutas telefónicas, entretanto autorizadas, foi possível apurar que o arguido e ex-jogador do Oriental Diego Tavares transmitiu aos arguidos Carlos Silva, conhecido como ‘Aranha’ e elemento da claque Super Dragões, e ao empresário Gustavo Oliveira - estes dois últimos intermediários dos investidores da Malásia - quais os jogadores que estavam dispostos a perder o jogo.

Terá ficado então acordado que Diego Tavares, Rafael Veloso (guarda-redes), João Pedro Carvalho e André Almeida, todos titulares no Penafiel-Oriental, receberiam 7.500 euros cada um para que perdessem deliberadamente o jogo, tendo sido agendado um encontro para o dia do jogo entre Carlos Silva, Gustavo Oliveira e os quatro referidos jogadores no hotel onde se encontrava a equipa lisboeta no norte do país.

No âmbito da operação montada, os inspetores da PJ alugaram o quarto 115, que ficava ao lado do que tinha sido reservado por Carlos Silva e Gustavo Oliveira para o encontro com os futebolistas. Segundo o coordenador da PJ, os dois intermediários estiveram em contacto através de vídeochamada com os investidores malaios para mostrar que os jogadores estavam «controlados».

Ainda de acordo com o mesmo responsável, ficou estabelecido que o Oriental, além de ter de perder o jogo, tinha de ir para o intervalo em desvantagem, situação que acabou por verificar-se: o Oriental a perder por 2-1 e o resultado final ficou 4-2.

Na segunda parte, quando o resultado era de 3-2 favorável ao Penafiel, Diego Tavares foi substituído e, de acordo com o que foi relatado, dirigiu-se ao balneário e trocou mensagens com Carlos Silva, a quem perguntou se aquele resultado era suficiente. Este respondeu-lhe que era necessário sofrer mais um golo para que a soma do resultado da segunda parte também fosse negativa. Assim ficou: 2-1 na primeira parte e 2-1 nos segundos 45 minutos.

«Após os 80 minutos o Oriental sofre mais um golo, numa má intervenção do guarda-redes Rafael Veloso», descreveu este coordenador da PJ, acrescentando que os arguidos receberam mais tarde um montante que ainda não tinha sido pago dos 7.500 euros negociados.

Ainda de acordo com o mesmo inspetor, foi possível apurar que o esquema de manipulação de jogos da II Liga já existia desde a época anterior e era para prolongar-se também para a época seguinte, em 2016/17, cumprindo-se assim o desejo dos investidores asiáticos, que reuniram várias vezes em hotéis de Lisboa com Carlos Silva e Gustavo Oliveira para coordenarem as ações.

O inspetor falou ainda de outros da II Liga, envolvendo, nomeadamente, Oriental, Leixões ou Oliveirense, entre outros clubes, nos quais houve combinação de resultados ou, pelo menos, tentativas.

Para além dos crimes relacionados com o envolvimento neste esquema de combinação de resultados, alguns jogadores constituídos arguidos ainda apostavam paralelamente no jogo Placard nos próximos encontros em que estavam envolvidos, obtendo dinheiro também através desse meio.

Abel Silva, campeão mundial de sub-20 em 1989 na Arábia Saudita por Portugal, é um dos arguidos no processo, tendo estado presente na sessão realizada nesta quinta-feira. Manifestou vontade de prestar declarações mas só o fará na próxima sessão, agendada para 22 de março.

Carlos Silva, conhecido como ‘Aranha’ e elemento da claque Super Dragões, Gustavo Oliveira, empresário, e Diego Tavares, ex-jogador do Oriental, continuam sujeitos à medida de coação de prisão domiciliária.