1990. Tito morrera há nove anos e com ele morrera também a ambição jugoslava. O ditador, croata de nascimento, sonhara unir seis repúblicas numa bandeira. O mundo olhava com receio para os Balcãs: «Seis repúblicas, cinco etnias, quatro línguas, três religiões, dois alfabetos e um partido», brincava.

A frase faz-se acompanhar de uma graça relativa, mas de uma curiosidade pertinente: a Jugoslávia era realmente uma aliança étnico-religiosa de residência pouco pacífica. Com a morte de Tito, o fim precipitou-se. Cresceu a animosidade, o ódio e a raiva. Os jogos de futebol tornaram-se campo fértil ao rancor.

O dia em que um clube adiou a guerra (e venceu a Champions)

Sobretudo os jogos entre sérvios (Estrela Vermelha e Partizan) e croatas (Hajduk Split e Dínamo Zagreb) eram um excelente barómetro da convivência jugoslava. Em 1990, no tal dia 13 de Maio, o mundo percebeu que aquele era um país com fim anunciado. Num Estrela Vermelha-Dínamo Zagreb, lá está.

O encontro ficou para a história como o jogo de Boban, mas a verdade é que começou muito antes dele. Decorreu sob fortes medidas de segurança, num perigoso. Não chegou ao fim, obviamente. Os confrontos começaram nas bancadas, invadiu-se o relvado, o estádio parecia um campo de guerra.

Nessa altura dás nas vistas Boban. O jovem croata, com 21 anos, agridiu um polícia sérvio e multiplicou o confronto. «Os ultras do Estrela Vermelha é que provocaram tudo e a polícia desatou a agredir os croatas. Revoltei-me quando os vi bater em simples miúdos e gritei isso para a polícia.»

Memórias de uma geração roubada pela guerra

«Em resposta fui agredido com matracas. Nunca esquecerei os olhos do polícia cheios de ódio», disse Boban numa entrevista anos mais tarde. À custa desse episódio foi transformado em herói nacional e capitão da selecção. Antes disso, porém, foi suspenso oito meses pela federação e andou fugido da polícia.

Milic Jovanovic estava nesse jogo e diz que foi das coisas mais feias que viu. «Foi muito feio. Foi mau. É uma situação que sempre quis esquecer. Estive presente, vi tudo com os meus olhos e prefiro nem falar disso», diz, ele que se afirma como um jugoslavo convicto. «Nessa altura não nos faltava nada.»

O antigo guarda-redes leu a entrevista de Boban e não gostou. «Não sei se ele está arrependido ou não do que fez... Ele é meu amigo, continuo a falar com ele, mas aquela entrevista saiu-lhe mal», atira. «É um grande jogador, mas às vezes a cabeça não acompanha o talento.»

Veja como tudo aconteceu: