Lado B é uma rubrica que apresenta a história de jogadores de futebol desde a infância até ao profissionalismo, com especial foco em episódios de superação, de desafio de probabilidades. Descubra esses percursos árduos, com regularidade, no Maisfutebol:

Mauricio Isla tem 26 anos e chegou ao futebol europeu em 2007. O jogador chileno representou a Udinese, assinou pela Juventus e seguiu neste verão para o Queens Park Rangers, por empréstimo da Vecchia Signora.

Nome consagrado do futebol chileno, Mauricio tem uma história que merece ser contada. O sucesso desportivo é um pequeno milagre e o mérito tem de ser repartido com as mulheres da sua vida, sobretudo a mãe e a avó.

Recuemos a janeiro de 1988. Maria, com apenas 16 anos, tinha engravidado de um homem mais velho, já trintão, e indisponível para assumir responsabilidades. A adolescente desejava a criança e procurava a melhor altura para contar ao seu pai.

«Contei logo à minha mãe e ela prometeu apoiar-me, mas avisou-me que teria de ser eu a contar ao meu pai. Deixei passar as festas de fim de ano, porque sei que aquilo lhe ia custar muito, mas não cheguei a conseguir falar com ele. O meu pai acabou por morrer sem saber que o seu neto Mauricio estava a caminho», contou Maria Isla, já este ano, ao jornal Las Últimas Notícias.

O avô de Mauricio Isla tinha 38 anos e desapareceu de forma trágica. A família vendia legumes na feira de Buin e Sérgio juntou algum dinheiro para comprar uma carrinha em Santiago, a capital do Chile. Não voltou.

Sérgio foi encontrado já sem vida, como aparente vítima de um atropelamento, e sem as poupanças. «Foi muito dolorosa a forma como o perdemos», reconhece Maria.

Restavam as mulheres da família, Maria e a mãe, uma casa modesta e o posto de venda de legumes na feira local.

Não seria o ambiente ideal para receber Mauricio Isla e as dificuldades acentuaram-se na reta final da gravidez.

De novo Maria a relatar a experiência ao Las Últimas Notícias do Chile. «Tive placenta prévia e passei quase toda a gravidez com hemorragias, entre hospitais. Mauricio acabou por nascer mais cedo que o previsto (ndr. pouco mais de sete meses), a 12 de junho de 1988, com baixo peso e os pulmões ainda por amadurecer.»

Nascia Maurício Anibal Isla, bebé prematuro de uma adolescente, mãe solteira.


«Ele também ficou hospitalizado durante muito tempo, nos primeiros meses de vida, devido a bronquite. Finalmente, com um ano de vida, teve alta definitiva e nunca mais ficou doente.»

O futuro jogador de futebol recebeu o nome de uma criança, filho de um casal amigo de Maria, que tinha falecido com apenas um mês de vida.

Mauricio estava finalmente livre para crescer nas ruas de Buin, a sul da capital Santiago. Morava junto a um campo de futebol e descobriu rapidamente a paixão por aquele desporto. Seria esse o caminho para um futuro melhor, para si e para as suas mulheres.

Com 11 anos, chegou aos escalões de formação da Universidade Católica e evoluiu de forma sustentada. Em 2007, após um belo desempenho no Campeonato do Mundo de sub-20, foi contratado pela Udinese e fez a sua estreia no futebol europeu.

A partir daí, a história é conhecida. Maurício Anibal Isla desafiou as probabilidades sem o saber. Cresceu sem consequências evidentes da prematuridade e não esqueceu as raízes.

Quando chega o natal, o jogador anda pelas ruas do bairro Los Bajos del Maipo, en Buin, a distribuir presentes pelos mais pequenos. Claudio Bravo, atual guarda-redes do Barcelona, é originário da mesma zona e juntou-se a Mauricio para atribuir bolsas de estudo aos jovens do Liceu Público 131, onde os dois jogadores estudaram. É uma forma de devolver algo à comunidade que sempre o acarinhou.