«O único treino que ele faltou, só para verem como levava já a sério as coisas, foi num dia em que o carro do pai avariou e ele não pôde estar presente. Lembro-me que mandou uma mensagem a pedir desculpa, por não ter podido.»

Francisco Leonel Lima Silva Machado. Ou só Chiquinho. O miúdo que cresceu para o mundo da bola, aos oito anos, na UDS Roriz, concelho de Santo Tirso, de onde é natural, chegou ao Benfica.

Chiquinho é um menino de «trato fácil» e que, após o treino nas camadas jovens, já gostava de «ficar a treinar com os escalões acima». Criava «bom ambiente no balneário» e gostava «de aprender com os mais velhos».

Di-lo quem o viu nascer, crescer e afirmar-se no futebol. Das escolas do Roriz à equipa principal da Académica, com eterna passagem pelo Leixões, onde subiu a sénior, além do Gondomar. Da formação no Boavista e no Pasteleira, até à passagem pela Croácia, aos 21 anos.

«Começou a jogar no Roriz com oito anos. Foi uma fase em que começámos a valorizar a formação. Começou a jogar nos infantis com a idade de escolinha, um escalão acima da sua idade», começou por dizer Francisco Bessa, presidente do Roriz, ao Maisfutebol.

Criava «bom ambiente no balneário» e gostava de aprender com os mais velhos. «Era um miúdo muito pacífico, não levantava problemas. Onde ele estava havia alegria. Às vezes era demais. Dizia-lhe “Chiquinho, vais levar nas orelhas”. Era agradável», sublinhou o dirigente, cuja versão é corroborada por Cadú, antigo colega de equipa.

Cartão de atleta de Chiquinho, na UDS Roriz, em 2004/05 (Foto: MF)

«É um palhaço, um jogador que gosta muito de brincar no balneário, uma excelente pessoa. Contudo, gosta de ouvir. Pedia-me conselhos e também falava com o Manuel José. Perguntava se estava bem ou mal. Se achava que devia melhorar aqui ou ali. É importante, na idade dele, querer aprender», refere.

No início, bem ao lado de casa, São Martinho do Campo, ficou no Roriz até aos 10 anos. Era o clube nona filial do Boavista. Tal levou Chiquinho aos axadrezados em 2006, para depois rodar no Pasteleira, onde ficou até aos iniciados. Não prosseguiria devido à crise no Bessa, que ramificou jovens da formação por FC Porto e Leixões.

Chiquinho, como André Pereira, rumou ao emblema do Mar.

«Estava ali um pequeno profissional»

Chegado ao Leixões, Chiquinho encontrou o treinador Rogério Torres, que o recorda como alguém que já se destacava. O «menino» que já encarava tudo com profissionalismo.

«Via um conjunto de características, já naquela idade, que o futebol profissional requer: o modo de encarar os treinos, aprendizagem. Fazia antecipar que podia chegar a outro patamar. Juntando isso à personalidade, era um pequeno profissional que estava ali, com 14 anos», atira Rogério.

Da relva ao balneário, «um dos primeiros a brincar e a criar bom ambiente». Mas só até ao treino. «Quando iniciava o treino, mudava o chip. Treinava com o máximo de concentração», lembra Rogério. De facto, como diz Francisco Bessa, «estava ali uma pedra por lapidar».

Francisco Bessa, presidente da UDS Roriz há 22 anos, viu nascer Chiquinho para o futebol (Foto: MF)

Chiquinho aterrou em Matosinhos rotulado de extremo e foi assim que ali evoluiu. «Gostava de pegar na bola, ir para cima do adversário. Apesar de pequenino, era explosivo. Procurava finalização com o pé direito, ou o movimento do avançado para assistir», prossegue Rogério.

O miúdo cujo pai sempre levava aos treinos desde o Roriz, falhou uma única sessão no Leixões no primeiro ano. Aquela em que o carro do pai, na viagem de 45 minutos/quilómetros, avariou e que motivou o pedido de desculpas do jovem jogador. «Notava-se que eram pessoas modestas, mas responsáveis e que faziam todo o gosto que o Chiquinho estivesse em todos os treinos. Apesar de ser de longe, pautava pela assiduidade», sublinha o técnico.

«Não queria saber se as meias estavam rotas»

O mero desinteresse pelos livros cedo encontrou motivação de sobra na bola. «O que ele queria era treinar. Era raçudo, era fo****. Já tinha um cabedal…», aponta Francisco Bessa.

Denota essa vontade o dirigente do Roriz quando diz que «ele não queria saber se as meias estavam rotas ou se as botas estavam estragadas». A médio ou extremo, Chiquinho queria era jogar. «Mais do que andar ali a dar uns chutos na bola». A ponte entre o passado no pelado de Roriz e o profissionalismo do presente.

Na época passada, o experiente central Cadú cruzou-se com Chiquinho. Apenas meio ano, já que o médio rumaria ao NK Lokomotiva, da Croácia, em fevereiro de 2017.

Chiquinho em ação pelo Leixões em dezembro de 2016, para a Taça de Portugal

De quem está perto do fim aos que agora despontam, Cadú lembra «um número oito como já não se vê há algum tempo, defende e transporta bola até à área». Um jogador que procurava conselhos para melhorar, no meio da dificuldade.

«Houve uma fase em que o treinador o meteu um jogo ou dois no banco e ele vinha perguntar onde é que podia melhorar. Na idade dele é importante, é uma pessoa muito humilde», destaca o defesa.

Suor, esforço, dedicação, alicerces inabaláveis para chegar ao Benfica. Segundo Francisco Bessa, o seu menino «tem tudo para ser um dos melhores médios portugueses».