Filho de um ex-jogador do distrital de Viseu, no seio de uma família portista, Licá é um bom exemplo de uma carreira ponderada, e subida a pulso, à qual a perseverança deu o regalo merecido.

Em Lamelas, aldeia da serra de Montemuro, todos recordam o miúdo que vivia perto do campo de futebol da terra, e de lá partiu à procura do sonho.

No último sábado, na estreia em jogos oficiais de Dragão ao peito, abriu caminho à conquista da Supertaça, com Paulo Bento a vê-lo das bancadas. Que mais se seguirá?

O percurso de Licá nem sempre foi traçado de forma linear. O início deu-se por baixo, sempre à margem dos clubes com pergaminhos na formação. Primeiro do modesto Crasto, de Castro Daire, de onde é originário, e passagem de um ano pelo já extinto Social de Lamas, que o contratou para jogar na III Divisão, ainda com idade de júnior.

Do Ol. Lyon a Villas Boas... na baliza da Briosa

É nessa altura, ainda amador, que Jorge Mendes, apenas o mais mediático empresário daqueles que já tinham referenciado o jovem prodígio de Lamelas, o leva a prestar provas no Ol. Lyon. O rapaz agrada, mas acaba por achar que ainda era muito novo para cortar com as raízes.

O argumento da proximidade terá servido para escolher a Académica, pouco depois, para o primeiro contrato como profissional: quatro épocas, das quais cumpriu apenas três. É emprestado ao Tourizense (II Divisão B) na primeira, volta mais rotinado a Coimbra, chega aos sub-21, e faz alguns jogos com Domingos Paciência.

Nesse período, destaca-se pela discrição e pacatez. Uma imagem de marca, explica ao Maisfutebol Pedro Pontes, atual presidente do Crasto, com um passado que o levou até à formação do Boavista. «Lembro-me na altura de falar com o Pedro Costa, que fora meu colega, e perguntar-lhe pelo Licá. A resposta: o rapaz senta-se à mesa e ninguém o ouve. Temos de ser nós a puxar por ele.»

«O Licá sempre foi humilde, reservado, e muito ligado à terra. Mas muito objetivo e determinado nos seus objetivos. O que guardo mais dele é a capacidade de luta. Um talento, sim, mas com caráter, e uma enorme vontade de melhorar e aumentar o seu rendimento», conta.

O tempo de jogo é pouco porque a concorrência é forte para um menino de 19 anos, mas Rogério Gonçalves volta a dar-lhe alguma utilização até se lesionar e reaparecer apenas em Janeiro, já com André Villas Boas, que até na baliza o utiliza.

A II Liga como trampolim

O resto da temporada passa-a ao serviço do Trofense, na II Liga, onde é bem sucedido e leva o emblema nortenho a tudo fazer para o ter de novo na época seguinte. Jorge Costa não se opõe, e José Guilherme não pensa em trazê-lo de volta.

É o desinteresse dos sucessivos treinadores da Briosa, aliada à noção do próprio jogador que teria mais hipóteses se usasse a II Liga como catapulta, que levam o clube deixá-lo partir no último ano de contrato, já no consulado de Pedro Emanuel.

Acorda a rescisão, mas os estudantes tratam de salvaguardar 30 por cento de uma futura transferência, porque confiavam no potencial de rendibilização da jovem promessa.

Marco Silva, à data ainda diretor-desportivo dos «canarinhos», sabia que tinha conseguido uma pechincha. Com o Estoril torna-se no baluarte da subida de divisão, e é eleito jogador revelação do segundo escalão.

De novo na Liga maior, protagoniza um regresso apoteótico, e termina como segundo jogador mais pontuado pelo Maisfutebol, logo atrás de Jackson Martinez. Não tardou muito até que se tornassem colegas de equipa.