Estávamos no minuto 13. Para quem acredita em superstições, a história começa logo de forma interessante. Há um mau passe em zona proibida, no caso de Brahimi o que não é muito importante para a ideia que se quer passar, e um contra-ataque do Liverpool finalizado com um remate de Robertson por cima.

Pode parecer estranho, mas a queda do FC Porto começa num remate por cima.

Este foi o lance que intranquilizou a equipa, deixou na gaveta das recordações a boa entrada em campo e afundou-a no buraco de onde nunca mais saiu. O Liverpool sai do Dragão com uma goleada de 5-0 e a eliminatória no bolso, perante um Dragão a corar de vergonha na sua pior noite europeia de sempre.

Decidimos começar com um lance aparentemente inofensivo, que passará ao lado da maioria das análises, para demonstrar que o desastre que se viu nasceu precisamente daquilo que o FC Porto não conseguiu fazer quando teve a bola. A intranquilidade evidente, acirrada pelo golo inaugural, somada a uma falta de agressividade pouco comum perante um rival que faz disso mesmo uma das suas maiores valias, fez o resto: nestas condições, difícil era não perder o jogo. E quando se insiste no erro, as coisas podem ganhar contornos históricos.

No onze inicial, Sérgio Conceição mudou três peças face a Chaves, todas previsíveis: Felipe, castigado, deu lugar a Marcano, Maxi a Ricardo Pereira e Corona a Brahimi. Otávio mantinha-se, no que foi a maior surpresa da equipa inicial portista. O brasileiro jogou pelo centro, numa tentativa de reforçar o miolo, mas a verdade é que pouco ajudou Sérgio Oliveira e Herrera, embora não tenha estado mal no ataque. Foi dele, aliás, a primeira oportunidade do jogo, num remate que desviou em Lovren e rasou a trave.

Ora, com Otávio pouco dado a tarefas defensivas, as contas são fáceis de fazer: havia três homens no miolo do Liverpool (Wijnaldum, Henderson e Milner), para dois do FC Porto. Se a isso se acrescentar o desacerto no passe em momentos cruciais, extensível a boa parte da equipa, chega-se ao caminho que levou ao descalabro. E não se fala em último passe. Muitas vezes, até o primeiro saiu mal.

O lance de Otávio, aqui referido, aconteceu dois minutos antes do remate de Robertson que abre esta crónica. O FC Porto só voltou a criar perigo quando já perdia por 2-0. E o Liverpool, por seu turno, foi crescendo até construir tal vantagem.

Reyes, primeiro, e Marcano depois, ainda evitaram que as transições rápidas da equipa de Jurgen Klopp provocassem estragos mais cedo, mas quando José Sá, a última barreira, falhou copiosamente nada havia a fazer. Má reposição com os pés e, a seguir, terrível abordagem ao remate de Mané. Se o FC Porto já tremia, a partir dali caiu de vez.

Até porque nem cinco minutos tinham passado e já o Liverpool fazia o segundo, com Salah, com toda a classe do mundo, a tirar Sá da frente antes de marcar, na recarga a um remate ao poste de James Milner.

As bancadas emudeciam, os nervos transformavam-se em desânimo. Era preciso virar a imagem 180 graus para safar a noite, mas quando Soares atirou a rasar o poste em cima do intervalo, na melhor jogada coletiva do FC Porto, percebeu-se que não era jogo para grandes feitos.

Pelo menos do lado português, é claro, já que o Liverpool viu que tinha pela frente a oportunidade soberana de resolver a eliminatória em 90 minutos e, por isso, não mudou uma linha. Conceição trocou Otávio por Corona no descanso, abdicando de vez do terceiro homem no miolo para tentar um golo que fizesse renascer a esperança. Não ficou perto sequer.

Outra perda de bola na saída motivou novo contra-ataque letal dos «reds». José Sá ainda deteve o primeiro remate de Firmino mas nada pôde fazer perante a recarga de Mané, que bisava. Mais de meia hora para jogar e o FC Porto sabia que a eliminatória estava perdida, praticamente. E ficou pior, em novo erro ofensivo portista. Agora foi Herrera a tocar «à queima» para Corona, que perde a bola e motiva contra-ataque inglês: Milner assiste Firmino e o quarto chegou a vinte minutos do fim.

Já não dava para esconder: a página de glória que o FC Porto queria escrever era um pesadelo, com contornos de vexame. Já era a maior derrota europeia da história do Estádio do Dragão e uma página negra para a história do clube, na pior exibição da época, mas ficou pior: chegou o quinto, novamente por Mané, num remate forte de fora da área.

No dia de S. Valentim é o FC Porto que sai de coração partido, num banho de realidade que pode deixar marcas no que aí vem. Vai depender da força da equipa para se levantar. Os adeptos, pelo menos os que aguentaram até ao fim, deram o mote no final: pediram o título. Até porque seguir em frente na Champions, mesmo que ainda faltem 90 minutos, é uma miragem.