Julio é um de tantos que se encosta às grades no exterior da Luz, a ver passar o tempo e a história, antes que comece o jogo. De camisola às riscas vermelhas e brancas, a sua expressão é de felicidade, serena. Era assim que pareciam a esmagadora maioria de adeptos que viveram a final da Liga dos Campeões no Estádio da Luz. Fossem do Atleti ou do Madrid, eles estavam bem. Com a vida e uns com os outros. No fim ganharam os brancos, a Décima que já era obsessão é mesmo do Real Madrid. O Atlético esteve a dois minutos de fazer sua a festa, mas a cabeça de Sérgio Ramos mudou a história. Ainda assim, porquê verter uma lágrima, como diz Simeone, no final da época mais bonita da história do clube?

A impressão forte que fica deste dia, do ambiente da final que fez da Luz capital de Espanha, na primeira decisão de sempre da Champions entre duas equipas da mesma cidade, é essa de festa plena. E da coabitação pacífica, tranquila, entre os adeptos dos dois rivais centenários de Madrid. Entraram por pontos opostos do estádio sim, mas cá fora, antes de tomarem os seus lugares, misturaram-se, conversaram, cantaram ao desafio. Trocaram algumas provocações também, claro. Mas em paz.

«Não há problemas entre nós, tranquilo. Só há problemas com os ultras», diz Julio, a constatar uma evidência que reforça apontando um grupo de adeptos mesmo ali ao lado à conversa, camisolas brancas e rojiblancas juntas.

Era uma festa para todos. O Real Madrid voltava a estar perto da Décima como não estava há tanto tempo, o Atlético tinha ali a última etapa da época de sonho que já valeu a Liga espanhola.

Muitos dos adeptos andaram por Lisboa, muitos também chegaram cedo à Luz. Mas não entraram logo. Umas largas centenas concentraram-se junto ao local por onde iriam chegar os autocarros. Na maioria adeptos do Real, por uma questão logística: a entrada deles era por aquele lado, a dos colchoneros pelo lado oposto do estádio.

A canção que cantaram quando passou o autocarro branco é aquela que agora vão ter de atualizar. «Como no te voy a querer, como no te voy a querer, se fuiste campeón de Europa por novena vez.»

Desmobilizaram logo a seguir, rumo ao interior do estádio onde, por um dia, quase não se ouviu falar português. A língua oficial era, claro, o castelhano, mas uma final da Liga dos Campeões é também um caldo de culturas. Havia gente de todo o lado: do Brasil, da Rússia, da Turquia, México, Paraguai, Alemanha.

Sim, a identificar um terceiro clube em número de adeptos pela Luz provavelmente seria... o Bayern Munique. Muitos adeptos bávaros, confiantes na equipa de Pep Guardiola que seria eliminada pelo Real na meia-final, compraram bilhetes antecipadamente. E não perderam a oportunidade de vir na mesma. Alguns equipados mesmo com a camisola vermelha do clube alemão.

Mas os verdadeiros protagonistas vieram de Madrid. Foram os que estiveram no relvado, mas tambémos que estiveram na bancada. No estádio, durante o jogo, todos eles fizeram um grande ambiente. Desde o primeiro minuto, quando cada um dos setores exibiu uma mensagem em forma de cartaz gigante. Mais direta a do topo sul: «Até ao final, vamos Real.» Mais funda a do lado colchonero: «Nuestra forma de vida.» Até ao último minuto. Enquanto se soltava a festa branca no relvado e nas bancadas, do lado colchonero os milhares de adeptos que vieram à Luz ergueram os cachecóis e dedicaram uma última ovação a Cholo Simeone e aos jogadores rojiblancos.