O FC Porto cumpre esta sexta-feira 125 anos de vida – apesar da data de fundação não ser pacífica, é aceite pela maioria das pessoas que aconteceu a 28 de setembro de 1893 – e para o celebrar o Maisfutebol foi à procura da explicação para a alcunha de «os dragões».

Uma alcunha que encontra fundamento nas armas da cidade do Porto.

Com efeito, e ao contrário do que acontece hoje em dia, o brasão original da cidade tinha uma coroa por cima das armas, coroa essa da qual saía um dragão e a palavra «invicta».

Um brasão que foi assim definido no séc. XIX, na sequência das lutas entre miguelistas e liberais, que passou à história como o Cerco do Porto.

Durante um ano, entre 1832 e 1833, os absolutistas que apoiavam D. Miguel cercaram o Porto e tentaram invadi-lo, para derrubar o Rei D. Pedro IV (ele que também foi o primeiro Imperador do Brasil) que se encontrava na cidade com os liberais.

Os miguelistas acabaram por perder e D. Pedro IV agradeceu o estoicismo dos portuenses, na defesa dos ideais liberais. Por isso prometeu oferecer o coração à cidade, deu a condecoração mais alta – Ordem de Torre e Espada – aos habitantes, prometeu atribuir a todos os segundos filhos o título de Duque do Porto e passou a designar o Porto como «cidade invicta».

D. Pedro morreu em 1837 e a filha D. Maria cumpriu as promessas do pai, acrescentando ao brasão o colar da Ordem de Torre e Espada, uma imagem do coração do pai que foi depositado na Igreja da Lapa, uma coroa que representa o título de Duque do Porto e, a sair dessa coroa, um dragão, símbolo da dinastia de Bragança, da qual fez parte D Pedro, com uma fita a dizer «invicta».

Foi este brasão que viveu durante quase 200 anos e se espalhou por toda a cidade. Até chegar ao símbolo do FC Porto. Aconteceu em 1922, quando o jogador portista Augusto Baptista Ferreira sugeriu que o símbolo do clube passasse a ter por cima da bola azul o brasão da cidade do Porto.

A proposta foi aceite pelo clube e o símbolo do FC Porto adquiriu a forma que tem hoje.

Esta história, no entanto, não termina aqui. Cerca de vinte anos depois, a 25 de abril de 1940, uma portaria do Estado Novo obrigava todas as cidades, aldeias e vilas de Portugal a retirar dos seus brasões as referências à monarquia. Uma ordem para reafirmar o nacionalismo do país, diziam.

Foi por isso que o brasão da cidade perdeu a coroa e o dragão que saía dela, com uma fita a dizer «invicta», símbolos que foram substituídos por uma fila de torres.

Ora esse brasão com a fila de torres mantém-se até hoje, mas a verdade é que o FC Porto recusou alterar o seu símbolo por imposição do governo e manteve sempre o brasão original da cidade.

Com um dragão a sair de uma coroa.

Foi uma espécie de 25 de abril portista, uma atitude de revolta e resistência. Nesta altura, aliás, nos anos 40, houve várias associações que se juntaram ao FC Porto na luta pela resistência do velho brasão, como aconteceu com a Associação Comercial do Porto e com o Orpheu do Porto, as quais ainda mantêm também o dragão no símbolo. Outras, como o Clube Fenianos, cederam.

Ora e como é que o dragão passou do símbolo para a alcunha?

«Essa importação do dragão para a designação aconteceu ali no início dos anos 80 e foi toda ela uma ideia do presidente Pinto da Costa. Penso que um pouco em resposta ao facto do Benfica ser o clube da águia e o Sporting o clube do leão, o FC Porto passou a ser o clube do dragão», conta o historiador Joel Cleto, que se tem debruçado sobre a história do Porto.

«A designação encontrou eco na comunicação social e espalhou-se, tornando-se universalmente aceite. Logo nos anos 80, mais propriamente em 1985, deu nome à revista do clube, a Dragões, mais tarde deu também nome ao novo estádio e ao novo pavilhão do clube.»

Não se sabe se a ideia de Pinto da Costa passava também por reafirmar a oposição do clube ao poder centralista, já que a ordem para retirar o dragão do brasão da cidade veio de Lisboa, ou se foi apenas por ser o animal que estava no símbolo do clube. Certo é que essa ideia teve de imediato um grande impacto, não só no clube como em todo o país. O dragão pegou de estaca.

Um sinal disso mesmo, aliás, está numa carta que a poetisa e deputada Natália Correia escreveu a Pinto da Costa, em 1985, em nome de um grupo de deputados.

Nessa carta, afirmava que a designação de dragão era feliz, até porque remetia para os Dracanos, um dos povos que habitaram a Galácia (região que compreende a Galiza e o norte de Portugal).

Acarinhada por todos, a designação «dragões» veio para ficar e espalhou-se por todo o corpo do FC Porto. Na sua origem remete para a Casa de Bragança, e em particular a defesa dos ideais liberais de D. Pedro IV, mas remete também para a resistência portuense ao poder do centralismo.

Um dragão de mão cheia, portanto.