Sábado é dia de dérbi e as memórias de quem já viveu muitos jogos como este não se esquecem, ainda que a mágoa de não marcar presença nos mais emblemáticos não saia da cabeça. Ricardo Rodrigues abriu as portas da «Tasquinha do Lagarto» ao Maisfutebol e contou-nos algumas histórias que o marcaram, não apenas na adolescência, mas sobretudo na vida adulta.

Aos 47 anos, pai de dois filhos, um do Sporting e outro do FC Porto, garante que é neste tipo de momentos que os adeptos devem marcar presença e ajudar ao máximo a equipa, num dia que pode ser histórico. Tomás, o pai de Ricardo, já não se encontra em Lisboa, mas é em Ponte de Lima que continua a apoiar o clube do coração, o Sporting. Ora, as recordações, essas são as melhores, ainda que não «perdoe» ao pai a ausência de dois eventos que o marcaram de forma especial.

«Tenho duas mágoas em relação ao meu pai. A primeira é a de não ter assistido à goleada por 7-1 no dérbi de 1986/87. Ele não me levou, mas sei que ele foi (risos). Agora, a maior mágoa foi sem dúvida o jogo frente ao Nápoles, com o Maradona a jogar em Alvalade. A única oportunidade que tive na vida para ver o Maradona e o meu pai não me levou. Em contrapartida, já levei os meus filhos a ver o Cristiano Ronaldo e o Messi, quando o Sporting defrontou o Real Madrid e o Barcelona para a Liga dos Campeões. Não quero que os meus filhos, um dia, me digam que não puderam vê-los jogar», refere.

O restaurante, outrora uma carvoaria, na Rua de Campolide, começou por ter o nome de «Taberna do Lagarto», quando ainda se encontrava do outro lado da estrada. Apesar da ligação ao Sporting, estabelecida por Tomás graças ao ciclismo (e a Joaquim Agostinho), as paredes têm camisolas de diversos clubes e até mesmo do Benfica, sendo a casa «para toda a gente».

A própria entrada levanta o véu do que é possível encontrar no interior, com uma vitrine repleta de história e entre outros, bolas assinadas por grandes nomes do nosso futebol. Em tempos, o espaço esteve reservado às memórias leoninas, com posters dos Cinco Violinos, da célebre equipa de hóquei em patins que ganhou a primeira Taça dos Campeões Europeus e a formação de andebol que conquistou cinco campeonatos consecutivos (1968/69 até 1972/73), assim como Carlos Lopes e Fernando Mamede. No meio de tudo isto, surge em conversa uma história que envolve Héctor Yazalde, mais precisamente o filho do mítico «Chirola».

«Estávamos em dezembro de 2018, o Sporting ia organizar a «main round» da Champions de futsal e entra um casal de sul-americanos no restaurante. Mais tarde percebi que eram argentinos e vinham com um português. Às tantas apercebo-me que um deles estava a fazer uma videochamada e a mostrar os posters que tinha afixados na vitrine», começa por explicar.

«Eles acabaram de comer e no fim perguntei-lhe se procurava algum atleta em específico, ao que me respondeu que era filho do Héctor Yazalde. Dei-lhe logo um abraço, ele disse-me que não era o pai, mas confessei que era o mais próximo que algum dia ia estar do Yazalde. A verdade é que nunca o vi jogar, mas a marca dele na história do Sporting é conhecida, os meus filhos sabem quem é o “Chirola”. Senti que ele não fazia ideia do impacto que o pai teve no clube. Além disso, os nossos clientes sportinguistas, que estavam sentados, levantaram-se para o cumprimentar e dar-lhe um abraço. Ele ficou tão emocionado que acabou a chorar à mesa», acrescenta.

O hóquei em patins é uma das grandes paixões de Ricardo e a primeira memória de Sporting que teve foi precisamente um clássico no primeiro pavilhão, ainda antes da «Nave». Com a companhia do pai assistiu ao triunfo por 2-1 dos leões no antigo Estádio da Luz, graças aos golos de Manuel Fernandes (ídolo de infância) e Morato. Sem ele, que tinha de ficar a trabalhar, passava os sábados no antigo campo n.º 2 e lá assistia aos jogos da formação, onde viu crescer nomes como Ricardo Quaresma, Hugo Viana ou Carlos Martins.

«Faz falta existir essa ligação entre adeptos e atletas, sobretudo com as crianças. O desporto é feito de ídolos… e no antigo estádio os jogadores saíam todos pela porta 10-A. Na altura não havia telemóvel para tirar fotografias, mas sempre pedi autógrafos aos meus ídolos, ora fosse numa folha, num caderno ou até num pedaço de jornal. Este é o lado mais romântico do futebol. A primeira vez que o Manuel Fernandes veio ao restaurante fez-me sentir uma criança novamente», partilha.

A primeira memória que tenho de um dérbi é a vitória do Sporting por 2-1 no antigo Estádio da Luz, em que marcaram o Morato e o Manuel Fernandes. Foi a primeira e última vez que pude festejar golos do Sporting ao pé de adeptos do Benfica. Eram outros tempos.»

Mas nem só de memórias se fez a conversa e bem perto do fim, o presente do Sporting veio à baila, com o sentimento agridoce de ter visto partir Ruben Amorim, o melhor que viu treinar em Alvalade, mas com a certeza de que se Frederico Varandas tiver aprendido com a passagem do técnico do Manchester United, o futuro será risonho.

«O Ruben Amorim é o melhor treinador que vi no Sporting. Acreditei que o João Pereira fosse a solução, quando ele saiu, porque não era preciso inventar. Se eu ou tu chegássemos lá e assumíssemos o papel de treinador também faríamos um bom trabalho. Outro ponto positivo da passagem dele é que pouco ou nada se falou de arbitragem, porque éramos os melhores. Espero que quem está à frente do clube tenha aprendido alguma coisa com a passagem dele pelo clube. Antes dele, era fã de Sir Bobby Robson, com uma bela equipa e uma direção que não o conseguiu segurar. Meses depois acabou por ser campeão pelo FC Porto», comenta.

O Estádio da Luz estará certamente cheio para assistir a um dérbi decisivo para as contas do título e Ricardo também não vai faltar. Quanto à Tasquinha do Lagarto, essa terá as portas abertas para quem quiser acompanhar o jogo de uma outra forma, mais apetitosa e com a certeza de que sairá de barriga cheia, independentemente do resultado.