Depois de tantos anos ao mais alto nível, Gaspar até tem medo de se esquecer de alguém no lote de agradecimentos. Sintetizámos aqui alguns dos mais significativos.

«Nicolau Vaqueiro foi quem apostou em mim. Foi, sem dúvida, aquele que ficou e ficará para sempre na minha gratidão. A minha última camisola será seguramente para ele, e a minha primeira camisola da seleção também lha ofereci. Também agradeço a outros, como o José Romão, que me abriu as portas da I Divisão. Não esqueço o mister Mário Reis, que deu o tal empurrão para, passados três meses, ter assinado um pré-contrato com Benfica. Só que despediram o Paulo Autuori, veio o Manuel José, as coisas mudaram, e apareceu, entretanto, o FC Porto», enumera.

Se esta fosse uma história em fascículos, estaríamos apenas no primeiro. Há mais. Muito mais. «Aprendi muito com Jorge Jesus e tenho pena de não ter sido meu treinador mais cedo. Num exercício, ele pedia mais e mais, e eu, num desabafo, digo-lhe que já estava a dar o máximo. Se este é o teu máximo…», conta, antes de mencionar João Eusébio:

«Foi quem me confiou a braçadeira de capitão. Numa altura em que esta só se dava ao jogador mais antigo no plantel, a alguém com ligação ao clube, ou então ao mais velho, ele quebrou essa máxima.»

«O mister José Augusto foi do melhor que apanhei no futebol como pessoa», deixa ainda bem claro, antes de se concentrar no técnico com o qual teve mais empatía. «Tem uma forma de estar no futebol de nervo, raça, e, talvez por ter sido o treinador com quem mais tempo trabalhei, numa altura em que eu, por ser capitão, era um pouco como os olhos dele dentro de campo, criou-se um laço muito forte.»

«Carlos Brito foi o verdadeiro engenheiro, arquiteto, o que lhe quiserem chamar, do Rio Ave europeu. Com o seu trabalho, tornou este clube mais sólido para encarar o futuro com outra chama e glória. Deve-se dar mérito a quem o merece e o mister Carlos Brito merece-o por inteiro», afiança.

Trofense no coração

Natural de Santo Tirso, Gaspar fez a formação no Trofense, dos sete aos 19 anos. «Claro que não poderia deixar de fora o meu presidente José Leitão, que foi meu diretor, e responsável máximo no clube, e sempre me ajudou ao longo da minha carreira», refere, elegendo um dos primeiros dirigentes que conheceu, falando de seguida de um dos últimos.

«Por má leitura minha, e até más influencias, acabei por discutir com o presidente José Manuel Mendes, do Sp. Covilhã, que é uma pessoa digna, e de palavra, algo que no futebol é raríssimo. Ajudou-me numa fase difícil de minha vida e a ele o meu muito obrigado, continuarei a ligar-lhe para falarmos de futebol.»

Do lado dos ex-colegas, fala do plantel do Rio Ave da época de 2007/08, aquando da subida à Liga, mas em particular de Costa, pelo estágio que fizeram pelo FC Porto, que parecía nunca mais ter fim, ou de Paulinho Santos, por aquilo que ele representava na altura. «Conseguiu agredir o João Pinto estando eu ao lado dele e não vi nada… é obra [risos]», conta.

«Não posso esquecer também o meu querido amigo, meu protetor no início de carreira, Paulo Sérgio, atual treinador da Académica. Era eu um miúdo [em Setúbal, na época de 96/97], e ele o tal veterano, numa altura em que a mentalidade era mais de lixar os mais novos. Mas ele defendeu-me. Certo dia, chegámos atrasados a um treino, eu passei e andei, nem falei com o treinador, enquanto ele foi dar o peito às balas e proteger o menino…só tu, Paulo!», prossegue.

«Mais amigos? O Rui Borges, o baixinho, como eu lhe chamava, enquanto para o Silas ele era o snake [Por que seria?]. O José Pedro, o galático, aquela esquerda fazia milagres!, o Nandinho, o Luís Coentrão, e o Nunes, mais conhecido como o mudo. Quando jogávamos à lerpa, ele ia a jogo apenas quando tinha grande hipóteses de ganhar. Por isso, o Coentrão, dizia sempre: eu não vou a jogo… falou o mudo!»

Motocross com o amigo Paiva e os três dentes na mão

Há quem diga que, fora do futebol, torna-se difícil cultivar amizades. Gaspar tem, contudo, alguns exemplos de colegas que se tornaram bons amigos, como o ex-médio Paiva.

«Com menor ou maior dificuldade dá sempre para irmos convivendo. Já lá vai o tempo em que, nos dias de folga, pegávamos na mota e fazíamos o nosso enduro ou motocross… era um grande treino de recuperação [gargalhadas]», revela, no momento em que lhe vem à cabeça uma imagem do antigo companheiro de equipa:

«Parece que ainda o estou a ver a resmungar com o árbitro por uma falta do avançado, que marcou golo, e, para o provar, mostrava a boca em sangue, e três dentes numa mão! Mesmo assim, o árbitro não quis saber e, por acaso, o jogador do Marítimo, Baba, acabou por levar sete pontos no cotovelo…»

De todos eles se tivesse de escolher agora um adjunto, seria Bruno Mendes. «Muito partilhámos e discutimos sobre futebol», assegura, deixando ainda uma palavra para Miguel Lopes: «Ao meu menino, o que me deixa mais feliz, é poder ligar-lhe para lhe comunicar o meu ponto final na carreira, e ele não querer saber dos meus agradecimentos. Estás a brincar? Eu é que te agradeço por tudo!... »

O melhor e o pior num nome: Fábio Faria

Agora, um momento forte. «O que de pior e de melhor guardo do futebol resume-se a um nome: Fábio Faria.» Coloca um tom sério. «Tinha uma capacidade acima da média, seria seguramente o futuro da Seleção, mas o destino assim não o quis… Como fiquei destroçado e confesso que até um pouco revoltado com a situação mas, como se costuma dizer, é a vida, e foi o que foi.»

Uma palavra também para Vítor Hugo, do Varzim, pela ajuda que lhe deu a enfrentar uma realidade até então desconhecida, o futebol amador, e a vários preparadores-físicos, como François Costa, Mário Monteiro, ou para o já referido Vitor Pimenta, este pela enorme paciência.

O empresário Artur Fernandes, a quem «obrigou», todo engravatado, a arregaçar as mangas e carregar-lhe os móveis numa mudança de casa, também ocupa um lugar especial.

«Se me falhou alguém, premita-me que vos diga, e em tom de brincadeira, pois foi assim que estive e soube estar no futebol, foi por causa de problemas… editoriais, pois jamais vos esquecerei, nem da grande ajuda que me deram. A todos o meu MUITO OBRIGADO, por terem feito parte e contribuído, e até mesmo ajudado a que a minha bonita carreira se tornasse ainda mais bonita e melhor!»

A familia, o porto seguro


A lista de agradecimentos de Gaspar não ficaria completa sem um enorme bem-haja à família.

«Ao meu filho José Miguel e ao meu filho José Bernardo, o meu obrigado do tamanho do mundo por terem aguentado e ficado sozinhos enquanto o papá estava em estágio. Obrigado por terem suportado o meu mau humor depois das derrotas, entre muitas outras coisas», refere, com uma ponta de emoção.

«Ao meu pai, que desde os meus 10 anos me acompanhou, e filmou os jogos até eu chegar aos séniores do Trofense, e continuou a gravar na televisão um jogo ou outro, que guardo religiosamente. Ter jogos de quando se tinha 10,11 ou 12 anos é um privilégio que o meu pai me proporcionou», prossegue, com mais emoção à mistura:

«Aos meus padrinhos, a quem nem preciso de dizer nada, pois eles foram, e são, o meu porto seguro. Ao senhor Ademar, avô dos meus filhos, fica a gratidão e o reconhecimento. E, claro, ao meu querido e grande irmão Ricardo Filipe (és enorme, mano!), que sempre me apoiou e demonstrou grande orgulho por mim. Muito me orgulho dele, também. Ajudou-me em tudo na vida, e continua a ajudar.»

Leia também: