«Mais longe e mais alto» é uma rubrica do Maisfutebol que olha para atletas e modalidades além do futebol. Histórias de esforço, superação, de sucessos e dificuldades.

Caldas da Rainha. Ciclismo. Bairrada.

Região, modalidade e equipa que facilmente remetem para João Almeida, mas que, por estes dias, têm outro nome proeminente no ciclismo nacional.

António Morgado tem 18 anos e é mais um talento a despontar para o ciclismo nacional na zona caldense. Está no escalão de juniores e as vitórias e os pódios já começam a ser um hábito. De Norte a Sul, mas também além-fronteiras, em algumas corridas internacionais.

No domingo, Morgado não repetiu a vitória de 2021 na clássica Gipuzkoa, em Espanha, mas arrecadou o segundo lugar na importante prova UCI para o escalão júnior, uma semana depois de – e pelo segundo ano consecutivo – ter ganho a Volta a Loulé.

Em 2022, já venceu as três provas pontuáveis para a Taça de Portugal de juniores, que lidera, num currículo já honroso e variado para um jovem com ambições maduras sobre rodas.

Até porque 2021 foi também um ano para recordar: Morgado venceu a Volta a Portugal do escalão, arrecadando as quatro camisolas da 15.ª edição da prova, além de duas das quatro etapas. Foi também campeão nacional de contrarrelógio. E brilhou na Cantábria, ao vencer a Volta ao Besaya, uma das principais voltas europeias na categoria júnior.

O percurso do menino da freguesia de Salir do Porto, nas Caldas da Rainha, que tem as equipas Ecosprint e a CDM-Alexandre Ruas de Alenquer no currículo, passa agora pelo elenco júnior da Bairrada e pela seleção, com mais metas para alcançar este ano depois dos desempenhos recentes.

«O desempenho tem sido o esperado, tem sido fruto do trabalho. Esta última corrida não conseguimos ganhar, mas pronto. Estava constipado, não podia pedir muito melhor. O principal é tentar ser campeão da Europa em Anadia este ano [ndr: pela seleção em julho], Volta a Besaya e as Taças das Nações», refere Morgado, que concilia ciclismo e estudos. Está no 11.º ano, em Humanidades, mas o foco é mesmo sobre rodas. «De segunda a domingo», atira. «Este ano decidi dedicar-me mesmo a isto, corridas importantes que estão no top-15/20 mundial, então sei que é preciso muito esforço», diz quem vai tentando gerir tudo da melhor forma entre bicicleta e livros.

O impulso pelo pai e a referência João Almeida

António Morgado tem 18 anos e cerca de 12 deles agarrados à bicicleta.

Não nasceu com ela. Mas cresceu praticamente com ela, à boleia do pai. Costuma treinar no Montejunto, que é como uma «segunda casa».

«O meu pai praticava ciclismo, fazia maratonas, Taça de Portugal e os nacionais. Só por diversão, mas pronto. Cresci sempre com o ciclismo aqui e andei sempre de bicicleta também. Eu sempre pensei assim desde os seis anos, foi o meu objetivo sempre», conta. Outra modalidade? Nunca pensou «a sério».

Nas primeiras pedaladas, na Ecosprint, António Morgado coincidiu com João Almeida, seu conterrâneo. «Foi um orgulho e é sempre bom aprender com os melhores», salienta o teenager caldense nascido em 2004, que tem no atual ciclista da UAE Team Emirates uma das suas três principais referências. As outras são o belga Wout Van Aert e o esloveno Primoz Roglic.

«Gosto da maneira como eles correm, das características deles, acho que dão sempre um bom show», justifica.

Dar o salto para fora em sub-23: «Sonhar é grátis e não quero ficar aqui»

António Morgado cumpre o segundo ano de júnior e passa ao escalão sub-23 no ano de 2023 e os objetivos são claros para o próprio. Sair de Portugal e continuar a carreira no estrangeiro.

«Para o ano subo a sub-23, este é o segundo ano de júnior. Objetivos? É sair de Portugal o mais cedo possível. As minhas ambições não se enquadram aqui, sonhar é grátis, portanto não quero ficar aqui», refere, não escondendo que o World Tour é, não só para ele – mas também – «o sonho de qualquer ciclista».

Gosta de subir. E quer chegar às «três grandes»

Para quem tem ganho com frequência e feito pódios quase de forma consecutiva a cada corrida, há uma especialidade de eleição? Morgado defende que, no escalão júnior, é preciso polivalência. De uma coisa, para já, está certo: o que gosta menos é do sprint.

«Eu gosto de subir, de descer, de rolar. Não gosto muito de sprint, mas quando tem de ser, tem de ser. Gosto mesmo de subir. Nesta altura é o meu pensamento: em júnior não faz muito sentido especializar só numa parte, 50 por cento das corridas de juniores acabam ao sprint. Se não se tiver um bom sprint, não se ganha. Então prefiro ter mais dois quilos agora e conseguir sprintar melhor e tento conseguir passar as montanhas com os melhores e continuar mais explosivo e melhor rolador nesta fase», explica Morgado, que em 2021 teve a oportunidade de estar, em setembro, nos Europeus em Trento e nos Mundiais na Flandres. Em Itália, foi 18.º no contrarrelógio e 20.º na prova de fundo. Em solo belga, Morgado, foi 43.º classificado no contrarrelógio e sexto na prova de fundo, este último o segundo melhor resultado de sempre para Portugal em provas de fundo para juniores em Mundiais.

Ao falar da competitividade nos Europeus e Mundiais face às provas em que habitualmente marca presença em Portugal, Morgado admite que não conseguiu fazer a total comparação, apesar da boa experiência que teve.

«Vou ser sincero: eu trabalhei e era um objetivo de época ir aos Mundiais e Europeus. E apanhei uma constipação. Nos Europeus não tinha, senti-me bem na corrida toda, consegui andar em fuga. Ao sprint não gosto muito de meter-me, ou seja o resultado não foi grande coisa. Nos Mundiais, estava em baixo, não estava perto do meu melhor. Foi sofrer. Ou seja, não consegui comparar-me aos outros porque não estava nas condições normais, mas foi uma experiência positiva e uma aprendizagem enorme», afirma.

Palavras de quem, além de querer ir além-fronteiras no ciclismo a breve trecho, não esconde a ambição de correr «as três grandes» voltas.

Das Caldas para o Tour, para o Giro e para a Vuelta.

O tempo o dirá. A bicicleta na estrada de Morgado também.

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