Mais longe e mais alto é uma rubrica do Maisfutebol que olha para atletas e modalidades além do futebol. Histórias de esforço, superação, de sucessos e dificuldades.

Há decisões que não acontecem por acaso. E trocas que fazem todo o sentido. Diogo Rocha e Miguel Oliveira são dois exemplos de sucesso disso mesmo. Atualmente são os dois melhores jogadores portugueses de padel, depois de terem jogado ténis durante muitos anos.

Foi a faculdade que os fez afastar do ténis e as companhias levaram-nos para outros (bons) caminhos. Isso e a dedicação a 100 por cento à modalidade que, para grande parte dos portugueses, não existe há muito tempo.

Em Portugal agora é «moda», mas o padel não é de todo recente. Segundo a história, surgiu em 1890 (!) e na Argentina, que é o país com maior tradição. Por isso, é a modalidade mais praticada depois do futebol. Em Espanha também já vai sendo assim.

Por cá é diferente. Já se joga há mais de dez anos, mas só agora se começou a tornar popular. Pela criação da Federação Portuguesa de Padel e porque há nomes como o de Diogo e de Miguel a ajudar a expandir a modalidade.

Recentemente ouvimos falar muitos dos dois e do padel. Tudo porque em novembro disputaram a final do Mundial, realizado em Cascais, frente aos espanhóis Juan Lebrón Chincoa e Álvaro Cepero Rodríguez. Não venceram, mas o feito foi histórico.

Por isso, o Maisfutebol quis falar com eles, perceber mais sobre a modalidade e o porquê desta escolha. Pelo meio ficou a saber que a relação entre os pares se chega a parecer a uma relação... amorosa. Vale a pena ler.

Como tudo começou

A vida de Diogo, de 32 anos, e de Miguel, de 28, está separada por mais de 700 km. O primeiro é natural do Porto e é lá que vive, o segundo é lisboeta e mudou-se para Bilbau. Conheceram-se no padel e atualmente fazem par nas provas nacionais.

Ambos descobriram a modalidade na altura da faculdade. O Diogo chegou a tirar a licenciatura em Psicologia, o Miguel desistiu de Marketing e Publicidade porque não se via fechado num escritório.

Os planos eram diferentes, a paixão pelo ténis a mesma. Ambos foram jogadores a sério. Mesmo assim, os dois desistiram. Miguel chegou a dar aulas de ténis, mas o melhor amigo convidou-o a experimentar padel: «Fui jogando e em 2011 fiz um torneio. Gostei da competição e da adrenalina, era idêntica à do ténis.»

A Diogo aconteceu o mesmo: «O meu antigo treinador de ténis chateou-me para ir experimentar e fui. Começou tudo assim. Fui jogando com amigos e… até hoje.»

«Foi tudo muito rápido. Ganhei logo o primeiro campeonato nacional em que participei com um amigo e isso foi logo motivante. A partir dai dediquei-me mais. Pensei que poderia ter sucesso. Comecei a treinar mais, a jogar mais, entrei no World Padel Tour e hoje sou profissional», disse Diogo.

Miguel também não deu pelo tempo passar, mas percebeu a meio do «caminho» que seria bom emigrar: «Senti que se me dedicasse podia tornar-me num dos melhores jogadores nacionais e ir mais longe a nível internacional. Por isso, há três anos vim viver para Bilbau.»

«Mudei a minha vida com o objetivo de saber mais sobre a modalidade e de jogar melhor. Aqui o padel está muito mais desenvolvido», justificou, referindo que Espanha é o país europeu com maior tradição na modalidade e por isso não é à toa que os espanhóis ocupam a maior parte dos lugares cimeiros do ranking do World Padel Tour, juntamente com os argentinos.

E é lá que os dois portugueses também já estão. Diogo Rocha acabou 2016 em 68.º lugar e Miguel Oliveira fechou a época no 87.º posto. Mas o objetivo de ambos é chegar ao top50.

Miguel Oliveira, 87.º do ranking WPT

As dificuldades e a importância do patrocinador

Para esse sucesso tem contribuído o esforço de ambos. Tanto Miguel como Diogo são professores de adultos e crianças em clubes das cidades onde vivem e dedicam à modalidade a maior parte do tempo.

«A minha vida é basicamente padel», disse Diogo. E a do Miguel não anda longe disso: «Treino, faço jogos e dou aulas de segunda a sexta-feira e ao fim de semana é quando há torneios.»

Vivem do e para o padel, mas admitem que não é fácil. Como são jogadores independentes não têm ordenado fixo. Recebem os prémios dos torneios e, claro, fora da competição, apenas o salário de professores.

«Quem ajuda são os patrocinadores, mas temos de pagar o treinador, o preparador físico e as viagens», justificou Miguel, admitindo que por vezes «não se consegue ganhar dinheiro», manifestando-se satisfeito com o «boom» da modalidade: «Assim é mais fácil arranjar quem queira patrocinar.»

Para já, ambos estão satisfeitos nessa vertente, fruto também de serem os melhores e por isso ser bom também para quem aposta neles. No entanto, Diogo sublinha que «é difícil arranjar patrocinadores em Portugal porque a modalidade não é muito conhecida».

Essa dificuldade arrasta depois para outra consequência: falhar torneios.

«Sem patrocinadores fica tudo mais complicado. Os torneios são quase todos em Espanha ou fora e fica difícil jogar o ano todo sem a ajuda deles. Este ano não falhei, porque tenho um bom patrocinador, mas também não ganho dinheiro. O bom foi que este ano não perdi também e deu para ir aos torneios todos», disse Diogo, recordando: «Há dois anos não, não pude ir porque as viagens estavam caríssimas.»

Quanto a isso, esclareceu ainda Miguel Oliveira que a Federação Portuguesa de Padel tem apostado e ajudado os jogadores: «Têm um programa de ajudas de custo que tem sido importante.»

Diogo Rocha, 68.º do ranking WPT

O par que é de interesse e quase amoroso

Se o patrocinador é importante, o par também. É o par que ajuda a alcançar as metas e com quem se divide o campo. O padel não tem a opção singular do ténis, joga-se sempre em pares e daí a importância de ter um bom. Podem ter-se vários, consoante o torneio.

Em Portugal jogam juntos, lá fora não. Diogo joga com o espanhol Barbasco Salazar, Miguel joga com o argentino Yain Melgratti.

«Escolhe-se através de proximidade. Se se é amigo ou se se treina junto, por exemplo, mas claro que também se escolhe por interesse e tendo em conta as características de cada um. O objetivo é arranjar um bom jogador e que resulte, que se consiga jogar juntos muitos anos. Isso é o que faz o sucesso», explicou Miguel Oliveira.

«É preciso muita conexão e muito perceber», sublinhou comparando, entre risos, a um namoro: «Não é quase, é mesmo. Há zangas de namoro e tudo mais. Há amuos do género ‘já não jogo mais contigo’.»

«É do género, é», referiu Diogo Rocha, entre risos, revelando para já que terminou a «relação» com Barbasco Salazar, mas que com o Miguel está tudo «perfeito».

«Não vou continuar com o Barbasco, decidimos seguir caminhos diferentes. Já está mais ou menos definido quem será o próximo, mas não quero falar já. Está encaminhado. Será um espanhol. Jogarei sempre com um espanhol em Espanha e com o Miguel em Portugal.»

Já Miguel Oliveira vai continuar ao lado do argentino e justificou porque não se junta a Diogo a nível internacional: «Sou canhoto, jogo com a mão esquerda, por isso tenho de jogar do lado direito e o Diogo tem caraterísticas de direita. Foi um desafio ele querer jogar à esquerda, mas correu bem. Ganhámos quase todos os torneios em que jogámos.»

Por isso, para quê mexer se a relação vai tão bem? É o que dizem ambos, estabelecendo metas: continuarem a ser os melhores portugueses do ranking, a vencer torneios internos e lá fora e a expandir a modalidade.

E já agora ver mais portugueses interessados pelo padel. «Tem sido muito bom ver a modalidade a evoluir. As pessoas estão mais interessadas desde há três/quatro anos em que a Federação apareceu - antes pertencia à de ténis - e apostou na divulgação. Trazer o Mundial foi bom e ajudar na aberta de mais espaços também», finalizou o Diogo.