Mais longe e mais alto é uma rubrica do Maisfutebol que olha para atletas e modalidades além do futebol. Histórias de esforço, superação, de sucessos e dificuldades.

10 221 quilómetros. É esta a distância entre Lisboa e Santiago, capital do Chile. E é esta a distância física entre Macarena Ramos, conhecida no mundo do desporto por Maca, hoquista do Benfica, e o pai. A covid-19 impediu o reencontro após largos meses de separação e colocou Maurício na linha da frente de uma pandemia.

«O meu pai é médico anestesista e trabalha na saúde pública no Chile. Já não o vejo desde junho e ele vinha visitar-me nos últimos dias de março. Ficava comigo uns dias para me acompanhar também na final four da Liga Europeia [começava a 4 de abril], mas com isto tudo, fronteiras fechadas, voos cancelados… não pôde vir», conta Maca Ramos ao Maisfutebol.

«Custa bastante porque eu sempre fui muito apegada ao meu pai, sempre fui menina do papá, por assim dizer, e tenho muito orgulho nele, por isso, quando ele vem ter comigo, é a melhor prenda que me podem dar», diz a hoquista de 23 anos. «Tiraram-me essa prenda, mas eu sei que vai chegar daqui a um par de meses… espero eu.»

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

Supuestamente iba a ver a mi papi el 31 de marzo, en 12 días, y aún que fuera atrasado le iba a tener un regalo del día del papi porque no lo puedo celebrar con el hace casi cinco años. Ahora se suspendió su viaje por esto del coronavirus, se suspendió su visita hasta nuevo aviso, y ya no le podré celebrar su día este mes (porque él no se merece solo un día, se merece todo el año). Disfruten a sus papis, que hay quien quisiera abrazarlo todos los meses (por no decir días) y no puede. Nos vimos el 28 de junio, ahora no sabemos cuándo nos volveremos a ver, por eso, quédense en sus casas, no es sólo por prevenir y cuidar a los otros, es porque también cuanto más responsables sean, antes podrán juntarse familias que están separadas por el cierre de fronteras. Piensen en los demás, porfa. Que ganas de abrazarte papi ❤️

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Apesar da «preocupação» porque estamos a viver «tempos difíceis», Maca Ramos garante: «Eu sei que ele agora está onde tem de estar. Claro que ninguém gosta de estar no meio de uma pandemia, mas ele está a fazer o que gosta e a cumprir o seu dever de salvar vidas.»

E não é só o pai de Maca que está a lidar de frente com o vírus que afetou todo o mundo. «A mãe dos meus irmãos mais novos, que é como se fosse minha mãe, também é anestesista e trabalha num hospital público. Passam o dia todos tapados, com máscaras enormes», conta.

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

Te amo papi ❤️ Hoy deberías estar almorzando aquí conmigo.. pero habrá una mejor altura para vernos..

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As videochamadas ajudam a matar as saudades da família e a acompanhar a situação da doença no Chile, onde vive o resto da família de Maca.

«A linha de infetados está a subir bastante de dia para dia. É verdade que podia ser pior, mas podia ser melhor também. No Chile só em alguns locais é que há quarentena obrigatória. Não percebo bem porquê. As pessoas continuam em contacto umas com as outras, continuam a sair porque têm de ir trabalhar», explica.

Uma preocupação que contrasta com a confiança com que encara a situação em Portugal. «As coisas parecem-me mais controladas. Acho que em Portugal quase todas as pessoas estão a respeitar, da forma como conseguem. Estou bastante confiante de que as coisas vão correr bem, dentro do possível», conta, dizendo que já se conformou com o isolamento social.

«Eu vivo com o meu namorado e nós respeitamos bastante. Vou à rua só passear o cão e fazer algumas compras para termos comida em casa. Nos primeiros dias foi um bocadinho pior porque a minha vida é bastante ativa, mas agora já me habituei, de alguma maneira.»

«Obviamente sente-se aquela vontade de patinar, de ir dar uma volta, mas tento fazer a minha rotina o mais normal possível, dentro das condições, e está melhor do que no início», garante.

Além de hoquista, Maca Ramos é também estudante do 2.º ano de Educação Física na Universidade Lusófona. As aulas, por videoconferência, ajudam a manter alguma normalidade na rotina. «Continuo a acordar cedo todos os dias, só não tão cedo porque não tenho de ir apanhar o metro e o comboio, mas acordo quase à mesma hora para não perder o hábito», conta.

O treino, com as obrigatórias adaptações, também contribui para essa aproximação à normalidade. «Não dá para calçar patins, até porque os meus patins ficaram no pavilhão da Luz e eu em casa também não tenho espaço para patinar, por isso, o treino é basicamente físico. Tenho um par de halteres e uma barra, mas é mais treinar com o peso do corpo», explica a atleta.

E de que sente mais saudades? «De treinar. Não só dos patins, mas também do ginásio com a nossa fisiologista. Normalmente saio do ginásio muito mais contente do que quando lá cheguei», conta Maca Ramos.

Tal como com a família, as videochamadas ajudam a matar saudades das companheiras de equipa, algumas com quem joga já desde o início do percurso europeu.

Maca Ramos chegou a Portugal com 18 anos e está a cumprir a quarta época no Benfica [regressou esta época ao Benfica depois de ter jogado um ano no Cerdanyola, de Espanha].

«O meu pai acompanhou-me nos primeiros sete dias e depois fiquei sozinha», recorda. «A adaptação foi difícil porque além de eu ser muito ligada ao meu pai, tenho quatro irmãos e dois são mais pequeninos. Eles são o meu mundo e não os ver crescer é a parte mais complicada. Um ano depois já tinham crescido dez centímetros. Custa um bocadinho», explica.

A língua também foi uma barreira. «As minhas colegas não falavam espanhol, por isso era um bocado complicado entende-las e fazer-me entender. Ainda bem que existe o Google tradutor», conta, a rir. Mas essa barreira lá foi sendo quebrada de uma forma ou de outra.

«As minhas colegas receberam-me muito bem. Dentro do que eu percebia, ofereceram-me ajuda, acompanharam-me, levaram-me muitas vezes para casa delas, para eu não ficar sozinha quando tínhamos jogo», recorda Maca.

Na altura, a atleta foi viver num apartamento do Benfica, com outras jogadoras de fora de Lisboa. Agora, a situação já é bem diferente.

«Eu e o meu namorado alugámos um apartamento e por isso em Portugal já tenho aqui a minha casinha. Claro que ainda sinto falta de ver os meus irmãos, o meu pai, os meus amigos. Sinto saudades, mas foi uma escolha que eu fiz e sinto-me muito bem aqui.»

«São culturas muito diferentes. Aqui as pessoas são mais sociáveis, o estilo de vida é mais saudável e acho que as pessoas andam um bocadinho mais bem-dispostas em Portugal, mas claro que há de tudo», diz a atleta, que já foi aproveitando para passear um pouco pelo país.

«Já conheço bastante do Sul e perto de Lisboa, o Porto, mas não conheço nada ali para Braga e assim. Quando tiver oportunidade também lá vou», garante.

Além da família e dos amigos, do que Maca Ramos sente muita falta é da comida chilena. «Sinto imensamente. Em Espanha ainda encontrava bastantes restaurantes chilenos, mesmo não tendo o mesmo sabor que no Chile, sempre dava para ficar um bocadinho mais perto. Mas aqui ainda não encontrei.»

E que iguarias fazem mais falta às ementas da hoquista? «O churrasco, mas não é o churrasco daqui, são umas sandwiches com carne e outro recheio. E também das humitas, que é uma comida que se faz com milho», explica, garantindo: «Quando puder vou a casa matar saudades.»

Desde que veio para Portugal, Maca Ramos tem ido uma vez por ano ao Chile e já teve também a visita da família. «Os meus irmãos mais novos já vieram duas vezes: uma com o meu pai e outra com a mãe deles. E agora vinha o meu pai sozinho.»

«É uma viagem muito longa, tira muito tempo. São dois dias de viagem, um dia de ida, um dia de volta. É complicado coordenar tudo. E depois o verão de cá é o inverno de lá», lamenta.

Muito ativa desde sempre, Maca Ramos «fazia vários desportos» em criança. Patinagem artística, ginástica, futebol, andebol, hóquei… «A minha rotina era assim: eu ia para a escola, terminadas as aulas ficava a fazer alguma atividade de desporto, depois ia para o hóquei e só depois é que ia para casa com a minha mãe», conta.

Mas os estudos e os pais foram obrigando a que selecionasse as atividades. «Os meus pais diziam-me que tinha de deixar um desporto. A cada ano que passava ia ficando com menos, e, quando já só praticava hóquei e andebol, tive de escolher e escolhi o hóquei.»

O hóquei que surge na vida da atleta chilena desde cedo. «Acho que comecei com cinco anos. Fazia patinagem artística e, quando saía do treino, o meu irmão entrava na pista para treinar hóquei e eu cheguei ao pé da minha mãe ou do meu pai e disse que queria treinar hóquei porque era um desporto mais divertido. Eles apoiaram-me, mas não acharam que eu fosse gostar. E agora olham para trás e veem que é claro que eu ia gostar», recorda Maca Ramos, a rir.

A prestação no Mundial de 2014 serviu para mostrar ao mundo o seu talento. «Fiz um Mundial bastante bom, ficámos em terceiro lugar, e comecei a receber propostas de Espanha. Tinha de tomar uma decisão em 2015. A última proposta que recebi foi do Benfica e eu decidi pelo Benfica porque… porque sim…»

«Pensei: ‘Se calhar consigo ir um par de anos para a Europa e ver no que dá, ter experiência…’ Mas, quando era pequena, nunca pensei que pudesse vir a fazer o que estou a fazer agora», garante, revelando: «Sempre quis ser como o meu pai, pensava em seguir medicina. Mas, apesar de eu gostar muito de estudar, não seria fácil estudar 11 anos sem saber onde vou estar no ano seguinte por causa do hóquei.»

No Chile ainda fez um semestre no curso de Engenharia e Biotecnologia e em Portugal mudou de área. «Fui para Educação Física e acho que é a minha cara. Eu tentava separar o desporto da minha vida do dia a dia para ver se quando chegasse a hora do treino estava mais motivada, mas agora tenho ainda mais motivação porque passo o dia a pensar em desporto», conta, revelando:

«Eu gosto de estudar. Sei que é um bocado estranho, mas gosto de chegar a casa, sentar-me, arrumar os cadernos para poder estudar melhor no dia seguinte. Sou uma pessoa um bocado nerd. Gosto de estudar, de aprender, de ler… divirto-me a estudar, na verdade.»

E não podíamos perder a oportunidade de perguntar a Maca Ramos como está o dente que perdeu num jogo com o Voltregà, e que lhe foi reimplantado no balneário pela companheira de equipa Margarida Brandão, que além de hoquista é médica dentista.

«Correu bem, ainda tenho o dente no sitio. O tratamento agora ficou a meio por causa da pandemia, mas está tudo bem encaminhado. Felizmente tenho todos os dentes, se não fosse a Margarida, ficaria aqui com um buraquinho na dentadura», garante.

«Nunca me passou pela cabeça que fosse perder um dente inteiro e o voltassem a colocar num jogo. Se não fosse a nossa colega, que é dentista, ia ser muito mais difícil», diz, agora a rir, mas na altura não havia disposição para gargalhadas.

«Eu estava só aos berros com dores. Só queria que ela acabasse rápido, não pensava se ela ia conseguir ou não. Aquilo doía imenso, ela fez tudo sem anestesia», explica.

Outro momento que a marcou, mas sem a perda de dentes desta vez, foi a final four da Liga Europeia em Lisboa. «Demonstra, não só a paixão pelo Benfica e pelo hóquei, mas a maneira como os portugueses vivem o desporto», conta.

«É bom. Não é muito comum que uma cidade, um clube, vivam o desporto daquela maneira, ainda para mais sendo hóquei feminino. Naquele dia ficou demonstrado que o Benfica é o Benfica, não é a equipa feminina ou masculina», aponta Maca Ramos, que diz que «o público português vai dando mais atenção ao hóquei feminino, tanto no Benfica como a nível nacional».