«Agora começamos a rezar». A frase é de Júlio Grondona, presidente da Associação Argentina de Futebol, quando viu Maradona ser levado por uma enfermeira, no final do jogo com a Nigéria, no Mundial de 94. No campo, nas bancadas, em todo o mundo temeu-se o pior. Antevia-se o fim do mito.

Dentro ou fora do relvado, Maradona vivia de excessos. Um pouco como os grandes artistas, também o astro argentino nunca se conseguiu livrar da polémica.

Em 1994, a imagem cândida da enfermeira Ingrid Maria a acompanhar «El Pibe» do relvado aos bastidores correu mundo. Por questões de segurança, a FIFA nunca deu a conhecer o seu apelido. A única declaração que se lhe conhece fala do estado de Maradona: «Diego estava tranquilo e de bom humor. Nunca mostrou desconforto nem nervosismo».

A Argentina tinha entrado no Mundial a todo o gás. Vencera a Grécia e a Nigéria, depois de um sofrível apuramento. Maradona acusou efedrina, substância proibida que o terá ajudado a perder peso. Foi suspenso 15 meses e desabafou: «Cortaram-me as pernas». A lenda tombou, e arrastou o país.

«Cometeu erros com a própria vida, nunca afectou ninguém»

Na sua autobiografia, Maradona confessou ter começado a usar drogas durante a passagem pelo Barcelona, no início da década de 80. Seriam precisos dez anos, até ser apanhado no primeiro controlo anti-doping, o que levantou muitas suspeitas sobre a protecção que lhe estava reservada no Nápoles.

Em Março de 1991 acusou cocaína. Valeu-lhe 15 meses de suspensão e precipitou a saída de Itália. O que lhe deu tempo para coleccionar mais um título: campeão argentino de... futebol de salão. Isso mesmo. Pouca gente sabe, mas Diego aproveitou a suspensão para se dedicar ao futebol de cinco.

Fê-lo no Club Parque, ao lado do amigo Ricardo Lombardi, com quem tinha jogado no Cebollitas em criança. «Fomos campeões. Na final ganhámos 5-1, com três golos meus e dois de Maradona», conta Lomardi ao Maisfutebol. «Fomos festejá-lo em grande e vivemos momentos muito bonitos juntos. Diego é especial.»

A incursão no futebol de salão marca o início do fim. Regressou em Sevilha, mas não se deu bem: queixava-se que os directores colocavam espiões para o seguir fora do campo. Regressou a casa, mas as polémicas acompanharam-no.

Hector Eenrique, ex-companheiro e adjunto no Mundial 2010, entende-o como poucos: «Sempre foi uma pessoa normal, que cometeu erros. Cometeu erros com a própria vida, não afectou ninguém fora da sua família. As pessoas dizem que ele devia ser um exemplo, mas exemplo têm de ser os pais das crianças e não culpar o Maradona quando um filho comete um erro.»

«Si yo fuera Maradona, viviria como El»

Com a carreira de futebolista a aproximar-se drasticamente do final, Maradona entrou num ciclo que o levou a várias clínicas de desintoxicação (em 92, 96, 90 e 2001). O excesso de peso trouxe-lhe problemas cardíacos e deixou-o às portas da morte em 2004. O país uniu-se para orar pelo ídolo. Fãs juntaram-se à porta do hospital. Sobreviveu e ganhou forças para voltar a lutar. Foi operado para perder peso e conseguiu regressar à sua «albi-celeste» para o Mundial 2010.

«Um dia disse a Maradona que nunca tomei drogas e ele deu-me os sinceros parabéns. Ele sabe que aquilo lhe trouxe muitos problemas, tem perfeita consciência disso. O que importa é que Diego jogou bem porque tinha um dom, não por causa das drogas», frisa Hector Enrique.

O músico Mano Chao é outro que compreende «El Pibe» como poucos. Nunca escondeu a admiração por ele. Dedicou-lhe várias músicas e cantou para ele «La vida tombola» em plena calçada. Se ele fosse Maradona, «viveria como ele».

Veja Mano Chao a cantar para Maradona: