Sara Moreira é no presente a portuguesa com o melhor tempo do ano na maratona encabeçando, assim, o trio das atletas que Portugal tem qualificadas para os Jogos Olímpicos Rio 2016. A marca pessoal não é suficiente para fazer previsões em prova tão difícil – e imprevisível, como a corredora nos explica. Nem o horizonte mais próximo é o Brasil. E, por isso, traçar objetivos olímpicos é ainda prematuro.

Mas os Jogos já estão nos horizontes, como também se impõe. Até porque esses horizontes, à velocidade a que se tornaram visíveis, não se tornaram alcançáveis há tanto tempo assim. Pelo contrário. «Eu vinha fazendo uma carreira progressiva, dos 800 aos 1.500 metros, depois os 3.000 em pista coberta, os 5.000 ao ar livre e fui progredindo até aos 10.000. E tudo apontava que fosse esta a distância», conta à MF Total Sara Moreira.

«Mas com um convite para a Maratona de Nova Iorque», em 2014, os horizontes alargaram-se nas distâncias: «Eu disse OK, vou tentar.» «Fiz treino específico, mas nunca pensei que fosse o que foi.» Sara Moreira terminou em terceiro lugar na sua maratona de estreia, com o tempo de 2:25:59 horas. «Foi uma passagem inesperada», conta sobre o que teve a forma de uma revelação: «Automaticamente, pensei que fosse uma aposta para o Rio.»



Sara Moreira correu até agora apenas três maratonas. Todas com bons resultados. Depois da excelente exibição vez em Nova Iorque, a atleta portuguesa foi convidada para a igualmente prestigiada Maratona de Londres, na Primavera deste ano. Mas uma lesão impediu-a de estar presente. «Mas ainda fui a tempo de Praga». Na República Checa, em maio passado, terminou em segundo lugar, com o recorde pessoal de 2:24:49 horas.

«Achei que as três maratonas não foram por acaso. Nova Iorque no ano passado e Praga neste ano foram o que me fez decidir.» A atleta voltou à prova nova-iorquina no mês que passou. Na sua terceira corrida na distância dos 42,195 quilómetros terminou em quarto lugar melhorando o tempo da estreia fazendo 2:25:53. E, por agora, chega. «No ano dos Jogos, não quero fazer maratonas na Primavera», assume.

«Tenho neste momento a melhor marca portuguesa» e como, segundo os critérios da Federação Portuguesa de Atletismo, os mínimos já contam a partir de Janeiro de 2015, o tempo é de pensar na época pelo clube que representa. «Agora tenho as provas do Sporting. Em maio já vou estar a preparar o Rio. Correr em abril, depois da época pelo Sporting e antes de maio, já não vou fazer», garante.



Como as provas pelo Sporting «terminam em março, depois é apostar a cem por cento nos Jogos, que são o objetivo principal da época». Em abril há Boston, ou Londres, «mas não há necessidade de sobrecarregar», porque, depois, é que será a altura de ter o horizonte no Rio de Janeiro.

«Ainda falta começar a preparação principal para a Maratona Olímpica, ainda é muito cedo para objetivos olímpicos, até porque vai depender da preparação», frisa Sara Moreira explicando que «a marca [pessoal] na maratona é importante, mas as condições adversas (no Rio vai haver calor, humidade...) e o percurso também são o que fazem o resultado final». «Na de Nova Iorque, neste ano, pela marca, não ficava no quarto lugar. Houve atletas mais rápidas do que eu que ficaram atrás de mim», exemplifica sobre uma prova que é sempre «muito aberta, muito longa e muito imprevisível»

30 kms diários e a vida familiar

Nesta altura, o horizonte ainda só está ao alcance da vista. «As coisas poderão correr bem se me adaptar e se me sentir bem...» Por isso, Sara Moreira tratará de encurtar distâncias quando for a altura: «Irei ao Rio, ver o percurso e as condições, em princípio em maio.» «Vou fazer preparação com um estágio em altitude, ainda não está definido onde, mas será no período inicial. Depois, descerei para o nível do mar e para um clima mais próximo [do que tem o Rio de Janeiro].» «Mas sem sair muito da minha rotina. Com um filho pequeno quero estar em Portugal», assegura.

«O que é importante para mim é o meu conforto e é por isso que também estou motivada, diz a mãe de família para quem «o atletismo, neste momento, é tudo». «Tenho vida pessoal, um filho que acaba por deixar o atletismo para segundo plano», mas, ao mesmo tempo, também o «atletismo está sempre presente». «Não me posso esquecer do treino, da recuperação. Faço treinos bi-diários todos os dias: uma hora, hora e meia de treino de manhã, despois a recuperação, os alongamentos; e, à tarde tudo outra vez», conta com um desbafo: «É o dia todo. Depois, é chegar a casa, tratar de tudo, deitar cedo. E está o dia todo feito. Eu vivo em função do atletismo.»

Sara Moreira corre 30 quilómetros por dia. «Ou 15 de manhã e 15 à tarde, ou 13 de manhã e 17 à tarde, ou ao contrário, mas sempre 30», diz antes de se voltar para a outra realidade com que convive, a vida familiar com o marido Pedro Ribeiro, seu treinador e também atleta, a quem é mais fácil compreender esta vida, mas também com Guilherme, o filho de 25 meses.

«Eu tento que o Guilherme não perceba a preocupação, entre aspas, da mãe: é o físico, é o psicológico... Porque fico mais chateada. É difícil gerir de forma a que uma criança de 2 anos não entenda», diz a mãe que faz «os possíveis para que não lhe falte nada». Mas, «quando a mãe vai para fora ele sente» e, neste ano, já não foi como no anterior: «Neste ano levei-o para Nova Iorque: uma criança desta idade deve ter a mãe com ele.» Mas, em 2014, foi mais difícil: «No primeiro aniversário dele não estive com ele. Ele fez um ano no sábado e eu corri no domingo.»



Entre as alegrias e tristezas que uma atleta tem, Sara Moreira também não foge à regra. O ano de 2011 foi muito difícil para a corredora portuguesa. Um «erro de inscrição da FPA» nos Europeus de Pista Coberta de Paris (foi inscrita nos 1.500 metros em vez de ser inscrita nos 3.000) e uma suspensão por doping fizeram de 2011 um ano negro: «Pagar por um erro que não é nosso é difícil. Nesse ano paguei por dois.»

A inscrição mal feita em Paris 2011 tirou-lhe a hipótese de defender ou melhorar a prata ganhar dois anos antes nos 3.000 de Turim 2009. O caso de doping valeu-lhe uma suspensão de seis meses. Sara Moreira mantém o que sempre disse: «Tive sempre a consciência tranquila.» E porquê? «Na minha opinião, doping é quando sabes o que estás a fazer. Eu tive um controlo positivo sem saber que estava» a tomar um suplemento desportivo com compostos proibidos.

«Senti-me a pagar por um erro que não era meu. Tive as conversas com as pessoas certas, que me disseram que era assim», recorda a atleta sublinhando em sua defesa que «podia ter tido até dois anos» de suspensão: «Tive seis meses.» A pena mínima reflete para Sara Moreira a inexistência da sua culpa que, lamenta, não foi refletida pela comunicação social. E reafirma que a sua «vantagem foi ter sempre a consciência tranquila». «Ter a consciência de que não tinha feito nada de errado deu-me grande força e vontade de voltar mais forte, querer mais e acreditar mais», garante.

«Os meus resultados são fruto do meu trabalho, foi o que me fez voltar», confessa Sara Moreira que, depois da tal prata nos Europeus de Pista Coberta em Turim 2009, ganhou ainda mais duas medalhas ao ar livre nos 5.000 metros (prata em Barcelona 2010 e bronze em Helsínquia 2012) até ganhar o ouro. Este chegou em 2013, nos 3.000 dos Europeus de Pista Coberta em Gotemburgo.

E esses foram os melhores momentos, os vários, da sua carreira, até agora. «O momento mais feliz foram todas as conquistas. Todas as medalhas são boas, tal como terceiro lugar em Nova Iorque ser o que é, a minha estreia», afirma a atleta assumindo especial carinho pela «medalha de Gotemburgo», ou não se estivesse a falar do lugar mais alto do pódio. Aos 30 anos, Sara Moreira não se fica pelo que já conseguiu e garante que «o momento mais feliz da carreira ainda pode estar por chegar, nunca se sabe». E, mesmo sem objetivos traçados para os horizontes mais ou menos próximos, reafirma o que é uma certeza: «O melhor momento ainda vai chegar.»