A supremacia dos clubes portugueses nas contratações internacionais de jogadores profissionais em 2022, num total de 901 transações, já era expectável, na avaliação do presidente da Associação Nacional de Agentes de Futebol (ANAF), Artur Fernandes.
«Não foi [uma surpresa], devido à legislação existente em Portugal, à facilidade que os clubes têm de contratar atletas de várias nacionalidades e ao impacto e qualidade que o próprio país tem como grande vitrina que é. Muito mais numa época de Mundial, em que existia uma grande expectativa face a Portugal. Do ponto de vista estratégico, acaba por ser chamativo para os países menores em termos de projeção do futebol colocarem os seus jogadores nessa montra que é Portugal», reiterou à agência Lusa Artur Fernandes.
O relatório global de transferências publicado na quinta-feira pela FIFA informa que «os clubes portugueses fizeram pela primeira vez mais contratações do que qualquer outra associação», enquanto o Brasil foi o país que transferiu mais para fora, com 998 atletas.
O Brasil «enviou» 338 jogadores para Portugal, o maior fluxo de transferências entre dois países, bastante superior ao segundo mais volumoso (166), precisamente em sentido inverso, que ajudou a fazer dos clubes nacionais os quartos principais «exportadores» no mundo, com 677 jogadores, atrás de brasileiros (998), ingleses (836) e espanhóis (778).
«Temos reparado que os emblemas portugueses se têm transformado cada vez mais em SAD, que têm sido vendidas cada vez mais a novos investidores. Esta necessidade de contratar e de vender muito e bem já não é tão somente dos clubes, mas das SAD, que estão efetiva e culturalmente ligadas a cidades e têm a sua história, mas também estão conectadas a empresas que têm de fazer disto o seu negócio», indicou Artur Fernandes.
Essa quantidade de vendas não tem reflexo proporcional no encaixe financeiro, já que Portugal foi o quinto país que mais dinheiro recebeu, com 533,2 milhões de euros (ME), valor convertido de dólares ao câmbio atual, após França (680,9 ME), Alemanha (588 ME), Itália (568,2 ME) e Inglaterra (552,3 ME), e o nono que mais pagou, com 160,6 ME.
«Somos um ótimo país, porque somos bons no futebol e sabemos promover, trabalhar e vender, o que é algo muito bom. Estão de parabéns todos os intervenientes e, em causa própria, os agentes, que têm sido muito falados nas últimas semanas e merecem esta homenagem. Se há vendas, é porque também as promoveram», notou o líder da ANAF, ilustrando com a presença lusa em duas das dez movimentações mais valiosas de 2022.
A aquisição do uruguaio Darwin Nuñez pelo Liverpool valeu ao Benfica 75 ME, podendo atingir 100 ME, e só foi suplantada na transferência do francês Aurélien Tchouaméni do Mónaco para o Real Madrid (80 ME fixos e 20 ME em variáveis), ambas no último verão.
Já o nono negócio mais volumoso foi protagonizado em janeiro de 2022 pelo colombiano Luis Díaz, ao mudar-se do campeão nacional FC Porto para o Liverpool, por 45 ME, num negócio que pode ascender aos 60 ME, com Artur Fernandes a projetar casos similares.
«É uma tendência que continuará a existir nos próximos anos e ainda bem, porque é sinal de que não só vamos recebendo os jogadores, como também lhes conseguimos dar um encaminhamento, que, no fundo, é aquilo que o futebol luso precisa e que os clubes e os futebolistas querem. Eles não querem vir para ficar muito tempo em Portugal. Querem é servir os clubes nacionais dentro da norma, mas, logo que haja possibilidade, seguirem o seu caminho para outros campeonatos nos quais possam ter maior projeção», analisou.
O top-10 das transferências movimentou 12,5 por cento do montante global despendido no ano passado e seis delas foram realizadas por clubes localizados em Inglaterra, país que se destacou como o que mais investiu no reforço dos plantéis, ao desembolsar 2.022,8 ME.
«Existe de alguma forma uma maior preocupação em contratar bem, não só nas posições da frente, como era uma tendência antiga, mas no meio e maioritariamente atrás. Pode significar uma outra tendência da construção do jogo e da mentalidade em relação àquilo que será o futebol no futuro», estimou o presidente da ANAF, frisando o aumento de 22 por cento no número de clubes envolvidos em contratações no futebol feminino, de 410 para 500.
Depois de dois anos consecutivos de queda nos gastos com transferências, 4.770 clubes de 182 associações diferentes fizeram 20.209 negócios, que traduzem um acréscimo de 11,6 por cento face a 2021 e batem a fasquia de 2019, tendo movimentado quase 6.000 ME, mas ainda longe do recorde fixado no último ano antes da pandemia de covid-19 (6.761 ME).
«Retoma gradual do mercado? Penso que sim. Nem podia ser de outra forma, mas estou convencido de que existiu alguma retração por causa de um Mundial2022 fora da caixa. Acho que muitos clubes deixaram alguma coisa por fazer em agosto para atuarem agora. Não foi o mês de janeiro que estávamos a contar, mas ainda pode acontecer algo nestes dias que faltam até ao encerramento do mercado. De qualquer forma, acredito que essa tendência será sempre de aumento de cinco a 10 por cento por ano a todos os níveis», concluiu.